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Perda de entrevista de emprego por cancelamento de viagem gera indenização

A 1ª câmara de Direito Público do TJ/SC confirmou sentença da comarca de Blumenau que condenou a Empresa de Ônibus Nossa Senhora da Penha S.A. ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 10,5 mil a passageira que perdeu entrevista de emprego devido ao cancelamento da viagem.

14/9/2011


Danos morais

Perda de entrevista de emprego por cancelamento de viagem gera indenização

A 1ª câmara de Direito Público do TJ/SC confirmou sentença da comarca de Blumenau que condenou a Empresa de Ônibus Nossa Senhora da Penha S.A. ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 10,5 mil a passageira que perdeu entrevista de emprego devido ao cancelamento da viagem.

A autora da ação afirmou que havia comprado uma passagem da empresa para o dia 26/3/09, às 21h15min, com destino a Blumenau. Após esperar por cerca de uma hora e meia, perguntou a um motorista da empresa sobre o ônibus, momento em que foi avisada do cancelamento do horário, o que havia sido determinado naquele mesmo dia.

Ela alegou que só foi possível falar com um responsável pela empresa no dia seguinte, uma vez que o guichê da empresa fechou às 21h, e que só obteve uma nova passagem para o dia seguinte, ocasionando a perda de uma entrevista de emprego marcada para o dia 27. Além disso, afirmou também que sua mãe estava doente e a esperava para receber auxílio naquele momento.

O juízo de 1º grau condenou a empresa de ônibus, que apelou ao TJ sustentando que foi obrigada a cancelar a viagem pois o veículo apresentou problemas mecânicos e não havia outro para substituí-lo.

Para o desembargador Vanderlei Romer, relator da matéria, considerando a teoria da perda de uma chance, a falta na entrevista frustrou a expectativa da passageira. Além disso, o estado de saúde da mãe foi considerado, e o julgador concluiu que "muito embora, realmente, o atestado que indicou a necessidade de ela ficar em repouso absoluto por três dias tenha sido emitido em 25 de março de 2009, de sorte que no dia 28 já não haveria mais necessidade de permanecer acamada, não significa que ela já não estivesse mais enferma e não precisasse de outros cuidados. Não se pode deixar de ter em mente que C. provavelmente ansiava por ver sua mãe tão logo possível". A decisão da câmara foi unânime.

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Apelação Cível n. 2011.009406-3, de Blumenau

Relator: Des. Vanderlei Romer

RESPONSABILIDADE CIVIL. TRANSPORTE DE PASSAGEIROS. CANCELAMENTO DE VIAGEM SEM PRÉVIO AVISO À PASSAGEIRA. PERDA DE UM DIA DE VIAGEM E DE UMA ENTREVISTA DE TRABALHO. DANOS MORAIS CONFIGURADOS. PROCEDÊNCIA. RECURSO DA RÉ, RESTRITO AO QUANTUM INDENIZATÓRIO. MANUTENÇÃO QUE SE IMPÕE, CONTUDO.

Hipótese em que a empresa de ônibus procedeu ao cancelamento de viagem sem avisar os passageiros, não obstante a falha mecânica que danificou o veículo tenha sido constatada na parte da tarde - o ônibus deveria passar na cidade em que a requerente o aguardava por volta das 21h15min.

Desídia da ré agravada pelo fato de o seu preposto ter informado equivocadamente à postulante que o ônibus estava no horário.

Situação que, por certo, é altamente angustiante, em razão da perda de um dia de viagem e porque, em virtude do ocorrido, a vítima viu-se impossibilitada de comparecer a uma entrevista de emprego, afora o fato de que a sua mãe se encontrava enferma na ocasião e a aguardava em sua cidade.

Contexto delineado nos autos que autoriza a manutenção domontante indenizatório, porquanto em conformidade com os critérios normalmente observados para o seu arbitramento e, ainda, porque a negligência da empresa foi gritante.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 2011.009406-3, da comarca de Blumenau (1ª Vara Cível), em que são apelantes e apelados Empresa de Ônibus Nossa Senhora da Penha S.A. e C.L.C.:

A Primeira Câmara de Direito Público decidiu, por votação unânime, desprover o recurso. Custas legais.

O julgamento, realizado no dia 23 de agosto de 2011, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. Sérgio Roberto Baasch Luz, com voto, e dele participou o Exmo. Sr. Des. Subst. Paulo Henrique Moritz Martins da Silva.

Florianópolis, 26 de agosto de 2011.

Vanderlei Romer

RELATOR

RELATÓRIO

Trata-se de ação de indenização por danos morais ajuizada por C.L.C. contra a Empresa de Ônibus Nossa Senhora da Penha S.A.

Pretende a autora ser ressarcida dos prejuízos extrapatrimoniais que alegou ter sofrido em razão de falha na prestação de serviço de transporte rodoviário, consubstanciada no cancelamento de viagem sem prévio aviso.

Sustentou que a desídia da ré foi patente, porquanto, cerca de meia hora antes do embarque, que seria às 21h15min, um de seus prepostos confirmou o horário do ônibus e a orientou para que lho aguardasse. Contudo, o veículo de transporte não chegou no horário aprazado, muito menos depois, e que, somente às 22h45min, ao indagar a um motorista da empresa sobre o paradeiro do ônibus, é que foi cientificada do cancelamento, o que havia sido determinado ainda no período da tarde daquele dia - 26-2-2009. Ressaltou que só foi possível questionar um dos empregados sobre o ocorrido no dia seguinte, uma vez que o guichê da empresa cerrou as suas portas às 21h, e que só obteve uma nova passagem, para 27-6-2009, após apresentar a nota fiscal e o boletim de ocorrência que lavrou.

Disse que a impossibilidade de viajar na data marcada ocasionou a "perda de uma chance", já que impossibilitada de comparecer a uma entrevista de emprego marcada para o dia 27, o que lhe causou profunda angústia, uma vez que desempregada. Aduziu que o seu sofrimento foi agravado pelo fato de a sua mãe, que a aguardava no seu destino, qual seja, o município de Blumenau, estar enferma e necessitar de seus cuidados.

Propugnou, então, pela condenação da suplicada ao pagamento de uma indenização por danos morais em valor equivalente a cem salários mínimos ou em quantia a ser arbitrada em juízo.

Na contestação, a Empresa de Ônibus Nossa Senhora da Penha S.A. aduziu, inicialmente, que se viu obrigada a cancelar a viagem de ônibus citada na inicial, em razão da impossibilidade de substituir o veículo, que apresentou problemas mecânicos.

Ao depois, impugnou a alegação da autora de que um dos motivos de sua viagem era a necessidade de prestar cuidados a sua mãe, pois no atestado médico de fls. 27 constou que ela necessitava de três dias de repouso absoluto a partir do dia 25-3-2009. Nesse passo, no dia 27 de março, data em que a postulante chegaria à cidade, ela só teria mais um dia de repouso. Com relação à entrevista de emprego, argumentou que o documento trazido com a exordial a fim de comprovar o seu agendamento é de pouco ou nenhum valor probatório, visto que subscrito por indivíduo cuja qualificação não foi especificada, ou seja, não se sabe se ele tinha poderes para subscrever a declaração. Questionou, ainda, a apregoada impossibilidade de marcar nova data para a entrevista, mormente porque o dia 27 era uma sexta-feira de Carnaval e, por fim, assinalou in verbis, que, "ao que parece, os documentos acostados à inicial foram encomendados pela autora no afã de fazer transparecer a ocorrência de um suposto dano moral que, na verdade, não houve" (fl. 42).

Alternativamente, afirmou que, caso acolhida a ação, a indenização deve ser fixada em valor compatível com o dano efetivamente sofrido, sem propiciar o enriquecimento ilícito da suposta vítima.

Houve réplica.

Encerrada a instrução processual, o pedido foi julgado procedente com a condenação da ré ao pagamento da quantia de R$ 10.500,00 (dez mil e quinhentos reais).

Irresignada, apelou a vencida. Propugnou tão somente pela redução do quantum indenizatório, dizendo-o excessivo, com lastro na argumentação apresentada na defesa com relação ao discutível valor probatório da documentação anexada à peça pórtica.

Também a autora interpôs recurso, o qual, todavia, não foi conhecido, porque intempestivo (fl. 140).

Respondida a apelação, alçaram os autos.

A Quinta Câmara de Direito Civil deste Tribunal não conheceu do recurso e determinou sua redistribuição a uma das Câmaras de Direito Público, ao fundamento de que a matéria sub judice é afeta à competência de uma delas.

Procedeu-se, então, à redistribuição do processo a este colendo Colegiado.

VOTO

Não questiona a empresa recorrente, como sobressai do relatório, o acerto do decisum no tocante ao reconhecimento da falha na prestação de serviço, mesmo porque é incontroversa a sua ocorrência, tanto que ela própria o reconheceu na contestação, ainda que tenha tentado justificá-la dizendo que na época do fato - carnaval – o movimento é sabidamente intenso, o que tornou praticamente impossível a reposição do ônibus.

Entretanto, esse argumento, que poderia influenciar, em seu favor, na quantificação do dano, é insubsistente, porque, além de não contar com o necessário respaldo, não tem o condão de afastar a desídia da empresa no trato com os seus clientes.

Isso porque, conquanto realmente o feriado em questão seja marcado por um fluxo intenso de indivíduos em deslocamento, o cancelamento, em si, não foi o fator preponderante para a sua responsabilização, mas, sim, a circunstância de ter-se descurado no seu dever de comunicar aos passageiros, com a necessária antecedência, o cancelamento. Aliás, não é um absurdo dizer que nem sequer teve a cautela de avisar os seus prepostos, pois a autora, ao questionar o funcionário que estava no guichê, foi informada de que o ônibus estava no horário.

Ora, não só deveria ter cientificado os clientes assim que soube da impossibilidade de realizar a viagem, e, ao que consta, o sabia desde a tarde, como ter procedido de forma atenciosa e diligente e coberto espontaneamente as despesas efetuadas pela autora em decorrência do atraso em seu cronograma. Mas não só não o fez, como não se mostrou cortês e obsequiosa no tratamento ministrado à apelada.

No que concerne aos danos propriamente ditos, eles são evidentes.

Alegou a apelada, na inicial, que sofreu com a "perda de uma chance", por conta da impossibilidade de comparecer a uma entrevista de emprego marcada para o dia 27 de março, na cidade de Blumenau (fls. 16-17).

A teoria da perda de uma chance possui pressupostos, como bem explicado pela parte apelada na exordial. Um deles é a chance séria e real, como bem explica Cavalieri Filho:

A chance perdida reparável deverá caracterizar um prejuízo material ou imaterial resultante de fato consumado, não hipotético. Em outras palavras, é preciso verificar em cada caso se o resultado favorável seria razoável ou se não passaria de mera possibilidade aleatória

[...]

Não se deve olhar para a chance como perda de um resultado certo porque não se terá a certeza de que o evento se realizará. Deve-se olhar a chance como a perda da possibilidade de conseguir um resultado ou de se evitar um dano; devem-se valorar as possibilidades que o sujeito tinha de conseguir o resultado para ver se são ou não relevantes para o ordenamento (Programa de responsabilidade civil. São Paulo: Atlas, 2008. p. 75; apud NETO, Otacilio Cassiano do Nascimento. A responsabilidade civil decorrente da perda de uma chance. Jus Navigandi, Teresina, ano 16, n. 2821, 23 mar. 2011. Disponível em: <_https3a_ 18750="" texto="" revista="" jus.uol.com.br="">. Acesso em: 5 jun. 2011).

Parte da doutrina prefere adotar como sendo uma chance séria e real aquela que represente mais de 50% de probabilidade de ocorrer. Mas, na espécie, faltam elementos que permitam o cálculo da probabilidade, ainda que de forma superficial, de que a recorrida conseguiria o emprego. Não se sabe quantos eram os candidatos, quantas eram as vagas, se a vítima estava na primeira fase da seleção, na última delas, ou seja, seriam necessárias mais informações para que a chance pudesse ser considerada séria e real. Assim sendo, "a perda de uma chance", na espécie, não pode ser supervalorizada, mas é certo que a perda da entrevista, porque frustrada uma expectativa, deve ser considerada no arbitramento.

Por outro lado, não se pode deixar de sopesar o estado de saúde da mãe da postulante. Muito embora, realmente, o atestado que indicou a necessidade de ela ficar em repouso absoluto por três dias tenha sido emitido em 25 de março de 2009,de sorte que no dia 28 já não haveria mais necessidade de permanecer acamada, tal não significa que ela já não estivesse mais enferma e não precisasse de outros cuidados.

Não se pode deixar de ter em mente que a autora provavelmente ansiava por ver sua mãe tão logo possível.

Veja-se que o atestado médico não foi impugnado a contento.

Em suma, os aborrecimentos resultantes do evento são incontestes.

Resta saber se foram quantificados corretamente, à luz do que já ficou exposto, do fim visado pela indenização por danos morais, sabidamente punitivo-compensatório, e dos critérios comumente utilizados para tal mister.

É sabido que as condições econômicas e sociais tanto da vítima como do ofensor são primordiais para o arbitramento da indenização, que não deve ser tão alta a ponto de prejudicá-lo economicamente ou fomentar a ganância da vítima, tampouco pode ser irrisório, porque, assim sendo, corre-se o risco de que ela não cumpra a função de punição e desestímulo à reiteração do ilícito.

Pelo contexto delineado nos autos, é indiscutível que a empresa merece severa reprimenda, diante do seu manifesto descaso. Prosseguindo, tem-se que a cliente da transportadora teve de manter-se, de alguma forma, durante o atraso ocasionado pela empresa, seja causando transtorno a parentes e amigos, seja com gastos com hospedagem e alimentação, ainda que não estejam comprovado nos autos. Outrossim, a vítima foi tratada de forma descortês por funcionários da empresa, já que só conseguiu efetuar a troca da passagem após ter apresentado a nota fiscal e o boletim de ocorrência, o que não foi impugnado pela parte adversa e, finalmente, a empresa apelante não procedeu da forma que se espera de uma relação de consumo, contrária ao Código do Consumidor e com a quebra dos deveres de conduta relativos à sua obrigação principal; a par disso, a vítima viu-se obrigada a recorrer ao Poder Judiciário para ver resguardados seus direitos.

A Empresa de Ônibus Nossa Senhora da Penha tem atuação considerável, participa de um grupo formado por seis empresas com atuação em três Estados e conta com uma frota de cerca de 170 ônibus, segundo informações do website da empresa.

A situação econômica desfavorável da cliente, de outro vértice, é inconteste, tendo em vista documento de fl. 18, que exibe proventos de pouco mais de duzentos reais em nome de sua mãe. Mas não se pode perder de vista, insista-se, a desídia da empresa, o que permite a manutenção do quantum.

O voto é, logo, pelo desprovimento do recurso, mantidos os critérios de atualização monetária e de incidência de juros previstos na sententia, porque em conformidade com a jurisprudência desta Casa de Justiça e do Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que também os juros passam a fluir do arbitramento da indenização. Para ambos os fins, deve ser utilizada a taxa selic, que engloba juros e correção monetária.

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