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STJ - Multa prevista em regulamento do Ecad não se aplica a uso de obras artísticas sem autorização

O uso não autorizado de obra artística não gera vínculo contratual entre o usuário e o autor, portanto os valores de multas, juros e outros encargos decorrentes desse uso irregular são determinados pela legislação civil e não pelo Regulamento de Arrecadação do Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (Ecad). Esse foi o entendimento da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao julgar recurso em ação movida pelo Ecad contra o Clube Vidalonga Programa de Condicionamento Físico Ltda.

26/7/2011


Direitos autorais

STJ - Multa prevista em regulamento do Ecad não se aplica a uso de obras artísticas sem autorização

O uso não autorizado de obra artística não gera vínculo contratual entre o usuário e o autor, portanto os valores de multas, juros e outros encargos decorrentes desse uso irregular são determinados pela legislação civil e não pelo Regulamento do Ecad. Esse foi o entendimento da 3ª turma do STJ, ao julgar recurso em ação movida pelo Ecad contra o Clube Vidalonga Programa de Condicionamento Físico Ltda.

A empresa teria se utilizado publicamente de músicas na sua atividade comercial sem autorização dos autores e demais titulares de direitos autorais. O clube foi condenado ao pagamento dos direitos devidos, mais juros moratórios de 6% ao ano, até a vigência do novo CC (clique aqui), e 12% após a vigência deste. Houve recurso das duas partes, mas o TJ/RJ deu apenas parcial provimento ao recurso do Ecad.

No recurso ao STJ, o Ecad alegou que não houve prestação jurisdicional adequada, pois o TJ/RJ não teria considerado o direito de o autor fixar o preço pela utilização de sua obra por terceiros. Também afirmou que os valores fixados no seu Regulamento de Arrecadação para as multas e juros vinculam os terceiros que se utilizam dos trabalhos intelectuais de seus filiados.

O ministro Massami Uyeda, relator do recurso, entendeu que a decisão do tribunal carioca foi adequadamente fundamentada. "A questão referente à aplicabilidade do Regulamento de Arrecadação do recorrente perante terceiros foi apreciada de forma clara e coerente", apontou.

Quanto à questão dos valores, o ministro reconheceu que os titulares do direito autoral têm a prerrogativa de fixar o valor pela utilização de seus trabalhos. Entretanto, a lei 9.610/98 (clique aqui), que regula os direitos autorais, não determina expressamente esses valores quando do uso ilícito. Por isso, deve ser usada a legislação civil e não o Regulamento de Arrecadação.

O magistrado disse que o uso não autorizado de obras artísticas passa ao largo das relações contratuais e não cria vínculos entre autor e usuário. Com essa fundamentação, o ministro negou o recurso do Ecad, no que foi acompanhado por todos os integrantes da 3ª turma.

Confira abaixo a íntegra do acórdão.

___________

Superior Tribunal de Justiça

RECURSO ESPECIAL Nº 1.094.279 - RJ (2008/0223145-8)
RELATOR : MINISTRO MASSAMI UYEDA
RECORRENTE : ESCRITÓRIO CENTRAL DE ARRECADAÇÃO E DISTRIBUIÇÃO ECAD
ADVOGADOS : KARINA HELENA CALLAI
ANDRÉ LUIZ VIVIANI DE ABREU E OUTRO(S)
RECORRIDO : CLUBE VIDALONGA PROGRAMA DE CONDICIONAMENTO FÍSICO LTDA – MICROEMPRESA
ADVOGADO : MILTON MORAES MARTINS

EMENTA

RECURSO ESPECIAL - OFENSA AO ART. 535 DO CPC – INEXISTÊNCIA – VIOLAÇÃO AO DIREITO AUTORAL - MULTA E JUROS DE MORA - RELAÇÃO EXTRACONTRATUAL - INCIDÊNCIA DAS DIRETRIZES DO CÓDIGO CIVIL EM DETRIMENTO DO REGULAMENTO DE ARRECADAÇÃO DO ECAD - RECURSO IMPROVIDO.

1 - Os embargos de declaração consubstanciam-se no instrumento processual destinado à eliminação, do julgado embargado, de contradição, obscuridade ou omissão sobre tema cujo pronunciamento se impunha pelo Tribunal, não se prestando para promover a reapreciação do julgado.

2 - No que toca às consequências afetas às ilicitudes praticadas contra o direito autoral, na falta de previsão expressa na Lei n. 9.610/98, é de ser respeitado o estatuído na Legislação Civil, em detrimento do Regulamento de Arrecadação do ECAD.

3 - Recurso improvido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da TERCEIRA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, a Turma, por unanimidade, negar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a) Relator(a). Os Srs. Ministros Sidnei Beneti e Ricardo Villas Bôas Cueva votaram com o Sr. Ministro Relator. Ausentes, justificadamente, os Srs. Ministros Nancy Andrighi e Paulo de Tarso Sanseverino.

Brasília, 16 de junho de 2011(data do julgamento)

MINISTRO MASSAMI UYEDA

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO MASSAMI UYEDA (Relator):

Cuida-se de recurso especial interposto pelo ESCRITÓRIO CENTRAL DE ARRECADAÇÃO E DISTRIBUIÇÃO - ECAD, fundamentado no artigo 105, inciso III, alíneas "a" e "c", da Constituição Federal, em que se alega violação dos artigos 28, 29 e 68 da Lei n. 9.610/98; 458, inciso II, e 535 do Código de Processo Civil e divergência jurisprudencial.

Os elementos existentes nos autos dão conta de que o ESCRITÓRIO CENTRAL DE ARRECADAÇÃO E DISTRIBUIÇÃO - ECAD moveu ação ordinária em desfavor do CLUBE VIDALONGA PROGRAMA DE CONDICIONAMENTO FÍSICO LTDA. - MICROEMPRESA, sob o argumento de que o réu utiliza publicamente obras musicais, lítero-musicais e fonogramas na sua atividade comercial, sem, contudo, ter autorização dos seus autores e demais titulares de direitos autorais (fls. 01/11 e-STJ).

O pedido foi julgado parcialmente procedente, para condenar o réu ao pagamento dos direitos autorais devidos, acrecidos de juros moratórios de 6% (seis por cento) ao ano, até a entrada em vigor do Novo Código Civil, e 12% (doze por cento) ao ano, a partir deste (fls. 454/461 e-STJ). Ambas as partes apelaram, tendo o egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro negado provimento ao recurso da ré e dado parcial provimento ao apelo do autor, em acórdão assim ementado:

"APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE PROCEDIMENTO ORDINÁRIO DE COBRANÇA DE DIREITOS AUTORAIS. ECAD. ACADEMIA . EXECUÇÃO PÚBLICA DE OBRAS MUSICAIS, SEM PRÉVIA AUTORIZAÇÃO AUTORAL E RECOLHIMENTO DOS VALORES DEVIDOS. VIOLAÇÃO AO ARTIGO 68 DA LEI N. 9.610/98. SÚMULA 63 DO STJ. DESISTÊNCIA DO PEDIDO DA MULTA. CONDENAÇÃO AO PAGAMENTO DAS PARCELAS VENCIDAS NO DECORRER DA LIDE. CONDENAÇÃO DA RÉ AO PAGAMENTO DAS VERBAS DA SUCUMBÊNCIA, POR TER A AUTORA SUCUMBIDO EM MENOR PARTE. PRECEDENTES DO STJ E DESTE TRIBUNAL. PROVIMENTO PARCIAL DO RECURSO DO AUTOR E DESPROVIMENTO DO RECURSO DA RÉ." (fl. 499 e-STJ)

Os embargos de declaração opostos foram rejeitados (fls. 512/514 e-STJ).

Sustenta o recorrente, em síntese, negativa de prestação jurisdicional, ante a omissão do julgado quanto ao direito do autor da obra artística fixar preço para a sua utilização por terceiro. Aduz, também, que os valores fixados em seu Regulamento a título de multa e juros de mora vinculam os terceiros que utilizam as obras de seus filiados (fls. 519/544 e-STJ).

É o relatório.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO MASSAMI UYEDA (Relator):

O recurso não merece prosperar.

Com efeito.

Verifica-se das razões recursais que toda a argumentação do recorrente ECAD cinge-se à oponibilidade do seu regulamento perante os utilizadores de obras musicais, lítero-musicais e fonogramas, sem autorização, especificamente no que se refere à multa e aos juros moratórios.

Inicialmente, é cediço que os embargos de declaração consubstanciam-se no instrumento processual destinado à eliminação, do julgado embargado, de contradição, obscuridade ou omissão sobre tema cujo pronunciamento se impunha pelo Tribunal, não se prestando para promover a reapreciação do julgado (ut REsp 726.408/DF, Rel. Min. Sidnei Beneti, Terceira Turma, DJe 18/12/2009; REsp 900.534/RS, Rel. Min. João Otávio de Noronha, Quarta Turma, DJe 14/12/2009 e REsp 1.042.946/SP, Relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, DJe 18/12/2009).

Outrossim, cumpre consignar que, mesmo para fins de prequestionamento, é imprescindível que existam os vícios elencados no art. 535 do Código de Processo Civil, pois os embargos declaratórios não são a via adequada para forçar o Tribunal a se pronunciar sobre a questão sob a ótica que o embargante entende correta.

In casu, não se verifica a alegada violação dos artigos 458, inciso II, e 535, ambos do Código de Processo Civil, porquanto a questão referente à aplicabilidade do Regulamento de Arrecadação do recorrente perante terceiros, foi apreciada, de forma clara e coerente, naquilo que pareceu relevante pelo Tribunal de origem.

Assim, resultado diferente do pretendido pela parte não implica, necessariamente, em ofensa ao artigo 535 do Código de Processo Civil. No que se refere à aplicabilidade da multa e dos juros moratórios previstos no Regulamento de Arrecadação aos usuários que desrespeitam os direitos autorias, não merece prosperar a pretensão recursal.

Isso porque, em que pese reconheça-se aos titulares do direito autoral a prerrogativa de fixar os valores referentes à utilização das suas obras artísticas, em face da natureza privada dos seus direitos (ut AgRg no REsp 998.928/RN, Rel. Min. Vasco Della Giustina, Terceira Turma, DJe 23/03/2011 e AgRg no Ag 780.560/PR, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, Quarta Turma, DJ 26/02/2007 e REsp 528.297/RS, Rel. Min. Barros Monteiro, Quarta Turma, DJ 16/02/2004), no que toca às consequências afetas às ilicitudes praticadas contra as obras de espírito, na falta de previsão expressa na Lei n. 9.610/98, é de ser respeitado o estatuído na Legislação Civil, em detrimento do Regulamento de Arrecadação do ECAD.

A utilização desautorizada de obras musicais, lítero-musicais e fonogramas passa ao largo das relações contratuais, haja vista não haver qualquer acordo de vontades entre o artista e a pessoa que utiliza a sua obra. A Lei n. 9.610/98 tem por finalidade tão-somente a proteção dos direitos autorais, sem criar qualquer vínculo entre os seus titulares e os usuários.

Assim, as consequências operadas pela violação ao direito autoral devem seguir o regramento entabulado no Código Civil, em detrimento do Regulamento de Arrecadação do Escritório de Central de Arrecadação e Distribuição - ECAD.

Escorreito, portanto o entendimento prolatado no acórdão recorrido de que "quanto à condenação ao pagamento de multa de 10% e de juros de mora de 1% ao mês, o mesmo não merece acolhida, eis que previstos no regulamento do autor, e não pode ser aplicada à ré, que não possui relação convencional ou associativa com o autor." (fl. 501 e-STJ).

Nega-se, portanto, provimento ao recurso especial.

É o voto.

MINISTRO MASSAMI UYEDA

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