Ontem, o editorial deste nosso vibrante matutino - sabendo que tubarões estavam na rede da Lava Jato - previa o óbvio : uma crise política. Ela está posta. Vamos enfrentá-la, migalheiros, com os dissabores a ela inerentes.
A lista de Janot
Como já sabe o leitor, o procurador-Geral da República solicitou ao STF a abertura de 28 inquéritos, envolvendo a participação de 54 pessoas na roubalheira da Petrobras. Os informes garantem que entre eles estão Renan Calheiros e Eduardo Cunha.
Ação...
O presidente do Senado devolveu ao governo a MP 669/15 que trata da desoneração da folha de pagamento das empresas. Ao tomar a decisão, Renan se baseou no artigo 48 do regimento interno da Casa, que estabelece que cabe a ele "impugnar as proposições que lhe pareçam contrárias à Constituição, às leis, ou ao próprio regimento". Para Renan Calheiros, a MP é inconstitucional. "Não recebo a medida provisória e determino a sua devolução à Presidência da República", declarou o improvável constitucionalista Renan. De súbito, passou a receber encômios da oposição, que se revezava ao microfone tecendo panegíricos. Como se não soubessem o que estava por trás daquele gesto... Ora, ora, convenhamos.
...reação
Após o anúncio da devolução, Dilma assinou PL com urgência constitucional nos mesmos termos da MP. Ou seja, não quis passar recibo.
Lobos e cordeiros
Diz a Folha de S.Paulo que Renan Calheiros ameaça promover, na sabatina, a rejeição do nome do novo ministro do STF caso não seja consultado para a indicação. Se for fato que o presidente do Senado está no inglório rol da Lava Jato, seria, literalmente, o réu a escolher o juiz, uma vez que o novo ministro vai para a turma competente para julgar o caso.
Caminho mais fácil
Sendo verdade a especulação da nota anterior, e Dilma não cedendo (que é o que se espera), crescem as chances de que o indicado seja oriundo do STJ. Afinal de contas, senador nenhum vai se meter a besta com um ministro togado.
Pagando para ver
Ainda acerca das notas anteriores, também custa crer que, sendo qual for o indicado, a CCJ (que ainda não foi nem sequer instalada) rejeite o nome. Isso não acontece. Pelo menos não acontecia.
Efeitos
Nessa difícil quadra da história política brasileira, o ideal é ficar atento aos sinais. Quem nos ajuda nessa missão é o jornalista Gaudêncio Torquato. Veja as Porandubas Políticas.
História migalheira
Desde que foi criado, este informativo critica a edição das MPs, as quais na grande maioria dos casos não possuem nem traço de relevância e muito menos ponto de urgência. Migalhas, que tem na raiz os ensinamentos do mestre Goffredo da Silva Telles, não se esquece de ouvi-lo dizer "que as medidas provisórias são providências rigorosamente excepcionais. Nos termos da Constituição, elas só podem versar matérias de grande monta ("de relevância"), e só se justificam em casos que exigem solução inadiável (casos de "urgência"), isto é, em prazo inferior ao tempo que seria necessário para elaborar, em regime de urgência, a lei correspondente. Quando a matéria não é verdadeiramente relevante e urgente – isto é, quando a matéria, sendo relevante, pode aguardar alguns dias, e ser solucionada por lei –, a medida provisória, em lugar da lei, é expediente impróprio, descabido, irregular. É inconstitucional". Mas o fato é que o próprio Congresso passou a gostar desse artifício, porque negocia (na ampla acepção do termo) com o governo mais rapidamente, e nem tem o trabalho de elaborar leis (coisa mais antiquada, devem achar). Nesse ambiente, e sabendo as reais intenções da devolução renaniana, não podemos aplaudir.
Migalhas dos leitores - Lava Jato
"Com todo respeito pelo procurador-Geral, que deve ter suas razões para isso, a adoção da mesma providência, com relação a acusados em situação distinta, não tem fundamento no princípio da isonomia (clique aqui). Desde Aristóteles já se sabe que a verdadeira igualdade consiste em tratar desigualmente os desiguais, na medida de sua desigualdade, ou conforme a conhecidíssima e precisa lição de Rui Barbosa: 'A regra da igualdade não consiste senão em aquinhoar desigualmente aos desiguais, na medida em que se desigualam. Nesta desigualdade social, proporcionada à desigualdade natural, é que se acha a verdadeira lei da igualdade. Tratar com desigualdade a iguais, ou a desiguais com igualdade, seria desigualdade flagrante, e não igualdade real'. Por exemplo, não conflita com o princípio da igualdade o tratamento diferenciado destinado à redução das desigualdades sociais e regionais, determinada pelo art. 3º, III, da CF." Adilson Dallari - professor titular de Direito Administrativo da PUC/SP
"As paredes têm ouvidos"
Citando o caso de interceptação de conversas telefônicas de acusados na Lava Jato com seus advogados, Roberto Podval (Podval, Antun, Indalecio, Raffaini, Beraldo e Advogados) e Maíra Zapater defendem a imposição de limite às ações que visem combater a corrupção. "Se houve ilegalidade - na Petrobras, no Congresso, em qualquer partido político ou empresa privada - que se cumpra a lei. Mas é imprescindível lembrar que a lei tem limites, em todos os sentidos."