Crise Econômica, poder Judiciário e recuperação de empresas
Ruy Coppola Junior*
Apesar de merecedora de diversas críticas, seja por sua complexidade (razão pela qual, dizem alguns, seria viável somente para as grandes empresas), seja por sua nítida proteção aos créditos garantidos (em esmagadora maioria, bancários), pela primeira vez a recuperação de empresas é efetivamente posta à prova. Esse fato é comprovado pelo incrível aumento, na procura pelo judiciário, de empresários com pedidos de recuperação no primeiro mês de 2009, que quadruplicou em comparação ao mesmo período de 2008.
No entanto, para que os pedidos não se tornem "esqueletos no armário", é preciso que o Judiciário aja de forma a preencher eventuais lacunas, bem como a corrigir eventuais equívocos cometidos pelo texto da lei 11.101/05 (Lei de Recuperação de Empresas e Falência - LREF - clique aqui).
Tomemos duas situações como exemplo:
1) A Lei REF exige que o empresário, para ter seu pedido de recuperação judicial concedido pelo juiz, tenha de, após ver seu plano de recuperação aprovado pelos credores, apresentar certidões negativas;
2) A LREF prevê que a empresa em recuperação obtenha parcelamento especial de seus débitos tributários, mas referido parcelamento depende de regulamentação por legislação específica, que ainda não foi editada.
São apenas dois exemplos, dentre tantos outros possíveis, nos quais o Judiciário tem a difícil missão de ver-se diante de obstáculo que pode inviabilizar a recuperação, indo contra, inclusive, ao disposto na própria LREF, que prega em seu artigo 47:
"A recuperação judicial tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo assim a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica."
E os magistrados pátrios, sejam eles de primeira, segunda, ou mesmo das instâncias extraordinárias, parecem ter assimilado a necessidade de interpretar adequadamente as exigências legais, atendendo ao disposto no referido art. 47, de forma a viabilizar a recuperação de empresas.
Diversas já são as decisões judiciais dispensando o empresário de apresentar as certidões negativas para concessão da recuperação. Apenas no TJ/SP, todas as decisões que trataram do tema foram favoráveis à exclusão da exigência de certidões negativas. E nem poderia ser diferente, tamanho o absurdo da exigência legal. Afinal, até um leigo sabe que, diante de dificuldades econômicas, entre pagar um funcionário e pagar tributos em dia, os empresários optam pelo primeiro, de forma a continuar produzindo.
Ao que parece, o Judiciário também caminha, corretamente, no sentido de, mesmo na ausência da lei específica regulamentadora, permitir aos empresários em recuperação a obtenção de parcelamento especial de seus débitos tributários, mediante acordos com as Procuradorias das Fazendas envolvidas, o que, ante a inércia legislativa, acaba por prestigiar a própria função da LREF: viabilizar a recuperação das empresas, relevante agente econômico, gerador de empregos e fonte de tributos.
São exemplos, louváveis, de como o Judiciário, de forma responsável, pode contribuir, em muito, para minimizar os efeitos da crise econômica sobre as empresas.
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*Professor dos cursos de graduação e pós-graduação em direito da Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo
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