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A razoável duração do processo administrativo de repetição de pagamento indevido à Receita Federal e os meios de reivindicá-la judicialmente

Não são raras as vezes em que os processos administrativos vocacionados a devolver ao administrado valores indevidamente vertidos aos cofres da União atrasam de modo desarrazoado. A demora em apreciar o pedido de ressarcimento ou restituição formulado, já à primeira vista, ofende ao princípio da eficiência, preconizado no caput do art. 37, da CF/88.

27/5/2009


A razoável duração do processo administrativo de repetição de pagamento indevido à Receita Federal e os meios de reivindicá-la judicialmente

Renato L. de Toledo Lima*

Não são raras as vezes em que os processos administrativos vocacionados a devolver ao administrado valores indevidamente vertidos aos cofres da União atrasam de modo desarrazoado. A demora em apreciar o pedido de ressarcimento ou restituição formulado, já à primeira vista, ofende ao princípio da eficiência, preconizado no caput do art. 37, da CF/88 (clique aqui):

"Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípio da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência"

Por este postulado, as autoridades administrativas hão de ser eficientes para com os administrados, vedando-se-lhes condutas das quais decorram atrasos desnecessários ou alheios à razoabilidade, nos assuntos colocados sob o seu escrutínio.

O atraso, sob esse entendimento, convola-se em aceitável violação ao direito de o contribuinte beneficiário obter a solução de seus pedidos dentro de prazo razoável.

Os contribuintes, em atendimento aos comandos da Carta Política, deverão estar sempre resguardados da ineficiência de órgãos administrativos que, sem razão, atrasam ou inviabilizam o exercício de direitos cristalinos como no caso vertente. Portanto, repita-se que a necessidade de a administração manifestar-se em prazo razoável é inarredável, sob pena de violentar a eficiência administrativa, princípio basilar da Administração Pública, explicitado no art. 37, caput da CF/88 desde a EC 19 (clique aqui), portadora da ansiada reforma administrativa. A esse propósito, note-se o que assenta a 1ª Seção do Colendo STJ:

"Administrativo. Mandado de segurança. Ato Omissivo. Autorização. execução de serviços de radiodifusão comunitária. 1. O exercício da atividade administrativa está submetido ao princípio da eficiência, nos termos do art. 37, caput, CF/88. 2. Configura-se ofensiva ao princípio da eficiência a conduta omissiva da autoridade competente, que deixa transcorrer longo lapso temporal sem processar pedido de autorização de funcionamento de rádio comunitária. 3. Ordem parcialmente concedida" (STJ 1ª S., MS nº 7.765-DF, Rel. Min. Paulo Medina, v.u., J. 26/6/02, DJ 14/10/02.).

As seguintes decisões das Cortes Regionais Federais retratam idêntica acepção do cânone constitucional:

"Administrativo. Mandado de segurança. Produção E comercialização de substâncias entorpecentes e psicotrópicas. Autorização. Omissão da administração. Portaria 28/86 da Secretaria Nacional de Vigilância Sanitária. Requisitos Prova. Ausência. [...] 3. É de se lamentar, entretanto, a postura da Administração, pois, à dista do princípio da eficiência, hoje inscrito no art. 37, caput, da CF, não pode o administrador deixar de se manifestar, positiva ou negativamente, em prazo razoável, sobre pedidos feitos pelo administrado. A espera sem fim, desnecessária, é motivo de angústia e sofrimento e não pode mais ser tolerado no âmbito de convivência entre Administração e administrados." (TRF 1ª R., 1ª T., AMS 1997.01.00.017724-3, Rel. Juiz Luciano Tolentino Amaral, v.u., J. 9/11/00, DJ 27/11/00).

"Processual Civil e Administrativo. Imóvel Funcional. Aquisição. Inépcia da Inicial. Inexistência. Ato Omissivo da Autoridade Coatora. Cabimento do Mandamus. 1. Se do texto da inicial pode-se depreender a prestação jurisdicional pretendida, não há que se entender inepta a exordial, por não ser expressar dentro da melhor técnica jurídica. 2. Não é vedado ao Judiciário, ante a omissão da autoridade administrativa em proferir decisão com referência ao pleito de aquisição de imóvel funcional, manifestar-se no sentido de compeli-la a praticar, em prazo razoável, o ato de sua competência, só não podendo assegurar, desde logo, o direito à aquisição do imóvel, antes que a Administração verifique o preenchimento, pelo seu ocupante, de todos os demais requisitos exigidos pela lei, limitando-se o provimento judicial a afastar a alegação de inalienabilidade do funcional ou, conforme o caso, a alegação de irregularidade de sua ocupação, e determinar o processamento do pedido, em prazo razoável, nos termos da legislação pertinente. 3. Apelo do impetrante provido" (TRF 1ª R., 5ª T., AMS 1999.34.00.034.440-9, Rel. Juiz Antonio Ezequiel, v.u., J. 28/9/01, DJ 21/1/02).

"Administrativo. Agente Público. Ato Omissivo ou Comissivo. Princípio da eficiência. Administração. Responsabilidade. A Administração é responsável pelos prejuízos decorrentes de atos omissivos ou comissivos de seus agentes em decorrência do Princípio da Eficiência que é ínsito ao desempenho de suas atividades, o qual encontrava-se albergado pelo direito administrativo pátrio antes mesmo de sua constitucionalização pela Neo Emenda da reforma administrativa" (TRF 5ª R., EI-AC 130.152/AL, Rel. Juiz Alexandre Costa de Luna Freire, v.u., J. 26/4/00, DJ 11/8/00).

Os atos omissivos praticados por autoridades administrativas, consistentes na não-apreciação em prazo razoável dos pedidos formulados por contribuintes, também desmerecem o princípio da razoável duração do processo e celeridade de sua tramitação previsto no art. 5.º, inciso LXXVIII, da CF, elevado ao texto constitucional pela EC 45/04 (clique aqui), assim redigido:

"Art. 5º

[...]

LXXVIII - a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação".

A duração do processo administrativo deixa de ser razoável quando o pedido formulado remanesce inapreciado desde o seu protocolo na repartição fiscal competente, há mais de seis meses, sem notícia de avanços na tramitação.

A propósito, o TRF da 3ª região já decidiu:

Processual Civil - Agravo de Instrumento - Mandado de Segurança - Decisão que deferiu a liminar pleiteada - Processo Administrativo de Restituição - Prazo para análise e conclusão - Agravo Improvido.

1. A CF/88, em seu art. 5º, LXXVIII, assegura a razoável duração do processo administrativo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.

2. No caso concreto, o processo administrativo foi instaurado em 24/10/06 (fl. 39), sem que, até 31/12/07, data da distribuição do mandado de segurança, nenhuma decisão houvesse sido proferida, justificando-se, por isso, a intervenção do Poder Judiciário, para assegurar ao administrado o direito de obter resposta, em conformidade com o direito garantido pelo art. 5º, LXXVIII, da CF/88.

3. Agravo improvido. (AG - Agravo de Instrumento - 323389 Processo: 2008.03.00.001131-6, Rel. Desembargadora Federal Ramza Tartuce – DJF3 8/10/08 – destacou-se)

É evidente que, diante de um quadro de injustificado retardamento, o administrado há que se valer do socorro judiciário para assegurar seu líquido e certo direito à razoável duração do processo administrativo.

Decerto que a impetração de mandado de segurança emerge como a mais célere via processual capaz de corrigir o defeito no processo administrativo.

Importa, porém, anotar algumas peculiaridades da ação mandamental para tutela do direito em comento.

O pedido judicial de chamada do feito administrativo à ordem não guarda relação com qualquer prestação pecuniária. No mandado de segurança com tal propósito não se discutem valores, mas tão-somente o processamento do pedido administrativo. Isso merece ponderação porque não existe, ao cabo do writ, o ressarcimento de custas processuais à parte vencedora, o que faz do recolhimento de custas iniciais um caminho sem volta, e o valor da taxa judiciária tem como base de cálculo o valor da causa.

Frise-se: não se está dizendo que as ações mandamentais hão que ser gratuitas. Não é isso. O que se afirma é que o direito ao trâmite célere do processo administrativo, não tendo em si conteúdo econômico, igualmente não encerra pretensão quantificável ou benefício econômico potencial, de sorte que o valor atribuído será simbólico, em consonância com o art. 259 da Lei Adjetiva Civil.

O TRF da 3ª região referenda tal entendimento, como se lê da ementa abaixo transcrita:

Processual Civil - Ação Ordinária - Empréstimo Compulsório - Impugnação ao valor da causa - Existência de elementos concretos - 1. É certo que a toda causa deve ser atribuído um valor e este deve guardar consonância com o valor do pedido, desde que este tenha conteúdo econômico imediato. 2. A impugnada deixou de manifestar-se de forma expressa sobre o cálculo ofertado pela impugnante, cingindo-se a recusar o valor apontado, sob a alegação de necessidade de perícia contábil, não trazendo aos autos qualquer documento ou fundamentação capazes de infirmar o valor indicado pelo agravante. 3. Embora a ação não possua conteúdo econômico preciso, verifica-se que o valor da causa foi atribuído de forma aleatória e, que os parâmetros informados pelo impugnante, se afiguram como elementos concretos o bastante para fundamentar a alteração do valor dado à causa. 4. Impositiva a fixação do valor da causa no montante pleiteado pela impugnante, ora agravante, no valor de R$ 1.426.431, 46 (hum milhão, quatrocentos e vinte e seis mil, quatrocentos e trinta e um reais e quarenta e seis centavos). 5. Agravo de instrumento provido. (TRF 3ª R. - AG 2003.03.00.077251-2 - (195201) - 4ª T. - Rel. Juiz Conv. Manoel Alvares - DJU 27/10/04 - p. 421 – destacou-se)

Não há como concluir de maneira diferente, porque significaria consentir que, a cada atraso administrativo desproporcional, deveria ser desembolsado valor equivalente ao que seria devido na discussão judicial de mérito sobre o montante reclamado ao Poder Executivo, o que extrapola, a toda evidência, os limites do senso de justiça, porque desencoraja sobremaneira o administrado a exigir o respeito a seu direito garantido constitucionalmente.

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*Advogado sócio do escritório Fernando Corrêa da Silva e Advogados Associados

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