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Colheita de ideais: safra em queda

Tudo começou em 1997, quando concluí o ensino médio, destacando-me assim entre 52 milhões de cidadãos "residentes e domiciliados" nos Estados deste famigerado "país de analfabetos".

13/4/2009


Colheita de ideais: safra em queda

Ana Laura Teixeira de Almeida Neves*

Tudo começou em 1997, quando concluí o ensino médio, destacando-me assim entre 52 milhões de cidadãos "residentes e domiciliados" nos Estados deste famigerado "país de analfabetos".

Pois bem, em 1999, após estágio natural de rebeldia, resolvi ouvir o que meus pais, professores e até mesmo aquele conhecido teste de aptidão me dizia: 'curse Direito'.

Graduei-me pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, em seguida, fui habilitada nos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil. Atualmente, faço especialização em Direito Penal (área de minha militância), pela mesma instituição de ensino de minha graduação. E não pretendo parar! Fiz algumas disciplinas isoladas no Mestrado que darei continuidade, após, terminar a pós graduação.

Aprendemos, tanto na graduação, quanto na vida e na educação que recebemos de nossos pais que, existem regras que nos remetem ao dito popular: "pau que bate em Chico, bate em Francisco". Será?

Lindo Codex Penal, virtuosa Legislação Processual, magnânima LEP e utópica CR/88. Aprendemos a segui-las, a respeitá-las, a utilizá-las como instrumento de nossa lida, mas, não aprendemos que elas podem ter contexto e objetivos dissociados daqueles princípios balizadores do Direito que todo professor de Direito insiste em dizer: "Não se esqueça que a base principiológica torna a interpretação do Direito mais fácil e mais lógica!"

Depois de apenas dois anos de militância na área criminal, vejo que me faltaram, ao menos, duas ou três cadeiras na faculdade: Artes Circenses, Artes Cômicas e Cênicas, ou seriam, Cínicas? Para que Sociologia ou Filosofia? Para que estudar Ética? Aprender que não existe hierarquia entre advogados, juízes e promotores? Matéria e legados inócuos para o operador do direito que, cada dia que passa, se realmente comprometido ao juramento que fez, desestimula e cobre de terra, enterra vivo, o brilho do profissional realmente vocacionado.

Um dia, numa audiência, ouvi de um magistrado (certamente bem intencionado - e sei que o é): "Doutora, não se apaixone tanto por uma causa..." Pensei no conselho durante meses e agora entendo que, não só pela conduta dos clientes, mas, também em razão da conduta de profissionais jurisdicionados, as dores pela paixão não correspondida podem ser dilacerantes.

Faz-se tudo certo, busca-se na Lei o que o legislador quis dizer, mas, interesses estranhos ao Direito, incompatíveis com a norma são sobrepostos de forma desavergonhada. E, ai de você, mero advogado, questionar de forma mais enérgica e apaixonada as injustiças que presencia. Nunca mais poderá contar com a 'imparcialidade' tão sonhada sob o prisma de Estado Democrático de Direito.

Longe de mim fazer dessa afirmação regra! Conheço vários Juízes e Promotores de Justiça que exercem o múnus com decoro e graça inerentes àqueles que 'nasceram para isso' e não em razão da estabilidade financeira, status, ou outro motivo (seja ele torpe ou fútil) escuso à profissão.

Presenciei cidadão sendo preso pela Polícia Federal, retirado do seio de seu lar como se bandido fosse, em alto e bom tom, porque sua voz era semelhante à de um investigado, enquanto o pedido de desculpa se fez em sussurros.

Presenciei pessoas que erraram, num momento de raiva, se tornarem bandidos de verdade após sentenças injustas e decisões endereçadas à imprensa, sem nenhuma obediência aos já citados princípios balizadores do Direito.

Condenação baseada em 'acho' (claro que expresso de forma mais polida – 'entendo'), mandados de prisão expedidos em observância à manutenção da ordem pública, fundamentação esta que, provavelmente, por si só, embasaria decreto prisional em meu desfavor, só por escrever este texto, se ainda estivéssemos sob as armas daquela ditadura escancarada.

Outro dia, quando em audiência, assisti um advogado (que me abstenho de dizer seu nome em observância à ordem pública), quase sair preso por dizer que seu cliente estava sendo prejudicado, em razão de tendenciosismo, por parte de um magistrado. Se não há hierarquia e o advogado tem 'licença poética' quando nas atribuições de sua função, qual a legalidade de tal arbitrariedade?

Todos os dias enquanto dirijo até o escritório penso comigo: "Será que vale a pena? Tantos estudos, dedicação, trabalho, sofrimento que assistimos e, por sermos humanos, acabarmos por sentir em parte, tanto investimento em títulos e livros... Será que vale a pena?"

Nos deparamos com situações tão perversas, tão frustrantes que nos levam a pensar em abandonar a paixão pela profissão, e nos tornarmos escravos unicamente da contraprestação pecuniária, de vender peças sem almejar resultado algum, até porque, esses desfechos, nada mais são, do que sorteados como bingo e, dependendo de qual juiz será o 'cantador da pedra', será possível adiantar até o resultado: "Sua cartela não é premiada, mas, há chance de que saia, ao menos, linha!"

Triste a realidade que me torna não advogada, mas, sujeito de direito (direto ou indireto) com predicado mais que prejudicado e futura comerciante. Comerciante sim! Pois, se as coisas assim continuarem, nada mais restará, a não ser abrir uma quitanda e esperar que as safras sejam mais justas e as abóboras mais inteligentes.

E viva a liberdade de expressão, salvo o anonimato.

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*Advogada sócia do escritório Almeida Neves, Brandão e Sporck





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