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A crise internacional e as alternativas jurídicas trabalhistas no Brasil

A BBC Brasil noticiou que “A crise econômica global pode gerar até 50,5 milhões de novos desempregados em 2009”. Essa informação tem como base o relatório “Tendências Mundiais de Emprego 2009”, divulgado pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), que aponta: “o agravamento da crise econômica pode fazer com que a taxa global de desemprego atinja 7,1% neste ano, comparado com 6% em 2008 (dados preliminares) e 5,7% em 2007”.

26/3/2009


A crise internacional e as alternativas jurídicas trabalhistas no Brasil

Fabio Medeiros*

Patricia Martin*

1. A BBC Brasil noticiou que "A crise econômica global pode gerar até 50,5 milhões de novos desempregados em 2009”. Essa informação tem como base o relatório "Tendências Mundiais de Emprego 2009", divulgado pela Organização Internacional do Trabalho - OIT, que aponta: "o agravamento da crise econômica pode fazer com que a taxa global de desemprego atinja 7,1% neste ano, comparado com 6% em 2008 (dados preliminares) e 5,7% em 2007".1

2. No Brasil, embora a legislação trabalhista necessite de importantes e profundas reformas para acompanhar a modernização das relações de emprego, os empregadores dispõem de algumas alternativas jurídicas às demissões, ainda que a solução seja temporária. Assim, os impactos negativos da crise mundial sobre os contratos de trabalho, podem, de certa maneira, ser suavizados com instrumentos já garantidos em Lei, mas que muitas vezes deixam de ser utilizados por simples desconhecimento.

3. Com efeito, por meio de alguns recursos jurídicos, os empregadores brasileiros podem tentar evitar o aumento do desemprego, retendo talentos a serem plenamente aproveitados em momento de reaquecimento da economia. Entre essas possibilidades, que podem ser utilizadas de forma combinada ou separadamente, podemos citar:

(a) concessão de férias – é o empregador quem tem o direito de escolher, conforme a sua conveniência, a data de concessão das férias do empregado, exceto no caso do empregado menor de 18 anos, que tem direito de fazê-las coincidir com suas férias escolares. Embora a concessão de férias não envolva, diretamente, a redução de custos, ela é uma boa estratégia para as empresas que sofreram redução em suas atividades, podendo ajudar na manutenção de empregos e no afastamento dos altos encargos da demissão sem justa causa. O empregador também pode conceder férias coletivas a toda empresa ou a determinados estabelecimentos ou setores, desde que observadas certas normas, como notificar o Ministério do Trabalho e Emprego - MTE com 15 dias de antecedência do início das férias coletivas. Segundo o noticiário, grandes empresas já optaram por esta alternativa;

(b) suspensão do contrato de trabalho – de acordo com a Consolidação das Leis do Trabalho (clique aqui), o contrato de trabalho do empregado poderá ser suspenso por um período de 2 a 5 meses, desde que, entre outros requisitos,

(i) o empregador ofereça um curso ou programa de qualificação profissional ao empregado com duração equivalente à suspensão,

(ii) haja previsão em convenção ou acordo coletivo de trabalho permitindo a suspensão e

(iii) o empregado formalmente aceite o procedimento.

A suspensão do contrato de trabalho não poderá ocorrer mais de uma vez no prazo de 16 meses e, caso o empregado seja demitido durante a suspensão ou nos 3 meses subsequentes ao seu retorno ao trabalho, o empregador pagará a ele indenização adicional a ser estabelecida em convenção ou acordo coletivo de, no mínimo, 100% sobre o valor da última remuneração mensal. Durante o período da suspensão o empregado (i) terá direito aos benefícios concedidos voluntariamente pelo empregador e (ii) não receberá remuneração, sendo facultado ao empregador pagar ajuda compensatória mensal ao empregado, sem natureza salarial, conforme previsão na convenção ou acordo coletivo de trabalho2. Como forma de garantir empregos, o sindicato dos metalúrgicos em Sorocaba/SP, por exemplo, firmou acordo coletivo de trabalho autorizando a suspensão em tela com 2 empresas. Nesses casos, serão suspensos os contratos de trabalho de parte dos empregados, que receberão bolsa de qualificação profissional a ser paga pelo Fundo de Amparo ao Trabalhador - FAT, com complemento salarial pago pela empresa. Também tivemos conhecimento de 4 empresas com sede no Paraná/PR que formalizaram esse tipo de acordo;

(c) negociações coletivas de trabalho – a Medida Provisória 2.074-73 (clique aqui), que instituiu o "Plano Real", determina que os "salários e as demais condições referentes ao trabalho continuam a ser fixados e revistos, na respectiva data-base anual, por intermédio da livre negociação coletiva" (art. 10). Não é raro, porém, que o empregador sujeite-se às decisões definidas em convenções coletivas de trabalho (contrato resultante da negociação entre sindicatos de empresas e de empregados), deixando de realizar negociações diretas com o sindicato dos empregados, quando poderia expor sua própria realidade. Em prol da diminuição de custos e da manutenção de postos de trabalho, os acordos coletivos de trabalho podem, transitoriamente, fixar reajustes salariais menores ou deixar de aplicá-los, além de suprimir a concessão de benefícios adicionais aos salários (assistência médica e odontológica, auxílios diversos, cesta básica, seguro de vida etc.). É recomendável, porém, que a empresa ofereça alguma contrapartida aos empregados, como por exemplo, a garantia provisória de emprego, como forma de preservar o equilíbrio das relações. Segundo o noticiário, o sindicato dos metalúrgicos de São Paulo/SP já teria sido procurado por 120 empresas para consolidar acordos de flexibilização, sendo que 99% delas atuariam no setor de autopeças;

(d) redução da jornada de trabalho em razão de conjuntura econômica – outra alternativa a ser estudada pelo empregador em dificuldades financeiras é a redução da jornada de trabalho dos empregados, com correspondente redução salarial. Segundo a Lei 4.923/1965 (clique aqui), "a empresa que, em face de conjuntura econômica, devidamente comprovada, se encontrar em condições que recomendem, transitoriamente, a redução da jornada normal ou do número de dias do trabalho, poderá fazê-lo, mediante prévio acordo com a entidade sindical representativa dos seus empregados, homologado pela Delegacia Regional do Trabalho, por prazo certo, não excedente de 3 (três) meses, prorrogável, nas mesmas condições, se ainda indispensável, e sempre de modo que a redução do salário mensal resultante não seja superior a 25% (vinte e cinco por cento) do salário contratual, respeitado o salário-mínimo regional e reduzidas proporcionalmente a remuneração e as gratificações de gerentes e diretores" (sic). Destaque-se ser obrigatória a participação do sindicato dos empregados para que a empresa possa reduzir a jornada de trabalho e o salário dos seus empregados. Em regra os sindicatos exigem uma contrapartida da empresa para essa alternativa, como a garantia provisória de emprego mencionada no item anterior. Essa foi a alternativa encontrada, por exemplo, pelo sindicato dos metalúrgicos em Diadema/SP, que teria concordado que uma empresa reduzisse a jornada de trabalho e os salários dos seus empregados por um período de 2 meses, em troca de garantia de emprego até 30 de junho deste ano. O sindicato dos metalúrgicos em São Paulo/SP também teria firmado acordos dessa natureza. Conforme noticiou a Agência do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar, já passa de 11 mil o número de trabalhadores submetidos à redução de jornada de trabalho com corte de salários em todo o Brasil3, medida que "sinaliza um revés para as centrais sindicais, que historicamente sempre defenderam a diminuição de jornada sem redução salarial e rechaçavam a possibilidade de flexibilização mesmo diante dos efeitos da crise";

(e) redução da jornada de trabalho por força maior ou prejuízos comprovados4 – o art. 503 da CLT também trata da redução da jornada de trabalho dos empregados, com correspondente redução salarial, ao determinar que "É lícita, em caso de força maior ou prejuízos devidamente comprovados, a redução geral dos salários dos empregados da empresa, proporcionalmente aos salários de cada um, não podendo, entretanto, ser superior a 25% (vinte e cinco por cento), respeitado, em qualquer caso, o salário mínimo da região". Essa alternativa não poderá ser adotada se a ocorrência do motivo de força maior não afetar substancialmente a situação econômica e financeira da empresa. Após a cessação dos efeitos decorrentes do motivo de força maior, os salários reduzidos devem ser restabelecidos, não havendo prazo máximo para duração dessa situação. É recomendável que o sindicato dos empregados participe do processo e a empresa ofereça alguma contrapartida aos empregados, como já mencionado nos itens anteriores;

(f) redução salarial sem redução de jornada – a Constituição da República garante aos empregados a irredutibilidade salarial; entretanto, em casos extremos e na tentativa de manter postos de trabalhos, evitando demissões e/ou falência de empresas, ela permite a redução salarial, sem mencionar redução de jornada de trabalho, desde que por meio de convenção ou acordo coletivo de trabalho. Para alguns, as regras da Lei 4.923/1965, citada na alternativa "d", devem ser seguidas pelo empregador em conjunto com a norma constitucional, evitando o risco de que a negociação coletiva seja declarada nula pela Justiça do Trabalho. Neste caso, recomenda-se uma contrapartida aos empregados, como já mencionado. Na prática, apesar da crise que abate a economia mundial, os sindicatos dos empregados somente têm concordado com a redução salarial contra correspondente redução da jornada e garantia provisória de emprego;

(g) programa de demissão voluntária (PDV) – nos casos em que demissões são inevitáveis para a continuidade segura da saúde financeira da empresa, uma alternativa pode ser a estruturação de programa de incentivo à demissão voluntária, por meio do qual o empregador expressamente informa aos empregados que pagará uma espécie de indenização aos que decidirem pedir demissão. Os PDV têm como vantagens evitar encargos sociais específicos da demissão sem justa causa pelo empregador, como a multa do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - FGTS, que atinge 50% do saldo depositado na conta-vinculada do empregado, e o aviso prévio (trabalhado ou indenizado). Outra vantagem dos PDV é que as indenizações relacionadas pagas pelo empregador são isentas de contribuições sociais, além de não integrarem a base de cálculo do Imposto de Renda. Normalmente as empresas concedem benefícios aos empregados que aderem ao PDV, como, por exemplo, indenização correspondente a 1 salário por ano trabalhado pelo empregado e o fornecimento de plano de saúde temporariamente após o término do contrato de trabalho. Embora não existam regras específicas para implementação do PDV, é recomendável que o sindicato dos trabalhadores seja comunicado, garantindo maior transparência ao processo. Na atual crise, essa alternativa tem sido adotada por empresas no Brasil e no exterior.

4. Enfim, existem alguns remédios jurídicos trabalhistas no Brasil contra os efeitos da crise financeira internacional, cabendo a cada empresa a escolha da alternativa que mais se adapte a sua realidade econômica. Para todas, entretanto, a recomendação sempre é pelo envolvimento dos sindicatos dos trabalhadores, ainda que a legislação não seja expressamente clara neste sentido (alternativas mencionadas nos itens "e" e "g"), procurando garantir ao empregador a segurança de que as eventuais decisões tomadas na tentativa de preservação dos contratos de trabalho vigentes, não sejam questionadas pela fiscalização ou na Justiça do Trabalho.

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1 Extraído de (clique aqui), em 31/1/2009, às 19h.

2 Nesses casos, o empregado poderá receber bolsa de qualificação profissional, a ser custeada pelo Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), sendo que as parcelas da mencionada bolsa serão descontadas das parcelas do benefício do Seguro-Desemprego a que fizer jus o empregado.

3 Extraído de (clique aqui), em 20/2/2008, às 16:12 h.

4 "Entende-se como força maior todo acontecimento inevitável, em relação à vontade do empregador, e para realização do qual este não concorreu, direta ou indiretamente.

§1º A imprevidência do empregador exclui a razão de força maior." (art. 501 da CLT)

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* Advogados do escritório Machado Associados Advogados e Consultores









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