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O aviso prévio indenizado, sua natureza e sua não inclusão na base de cálculo das contribuições previdenciárias

Recentemente, o Executivo Federal baixou um decreto que penaliza o trabalhador. As razões políticas que levaram o governo a agir desta forma não estão claras. Possivelmente, visando estancar uma tendência das empresas de reduzir o número de empregados, criou uma nova incidência para a contribuição previdenciária, não autorizada pela lei em vigor e pelos princípios e regras constitucionais que regem a matéria. Isto porque pretende fazer incidir uma contribuição sobre uma receita de natureza indenizatória.

25/3/2009


O aviso prévio indenizado, sua natureza e sua não inclusão na base de cálculo das contribuições previdenciárias

Américo Masset Lacombe*

Recentemente, o Executivo Federal baixou um decreto que penaliza o trabalhador. As razões políticas que levaram o governo a agir desta forma não estão claras. Possivelmente, visando estancar uma tendência das empresas de reduzir o número de empregados, criou uma nova incidência para a contribuição previdenciária, não autorizada pela lei em vigor e pelos princípios e regras constitucionais que regem a matéria. Isto porque pretende fazer incidir uma contribuição sobre uma receita de natureza indenizatória.

Apesar de já haver publicações de artigos bem fundamentados a respeito, não me deparei, até agora, com enfoques constitucionais.

Vejamos também este aspecto.

A indenização, qualquer que seja ela, tem por finalidade compensar ou reparar uma perda patrimonial – material ou moral – ocorrida anteriormente. Tem sempre a mesma natureza qualquer que seja o ramo do direito que a discipline. Seja ela disciplinada pelo direito público (constitucional ou administrativo) seja pelo direito privado (civil ou do trabalho), é sempre requisito para legitimação de um direito, qual seja, o de expropriar, no caso do Estado, ou o de despedir, no caso do empregador.

Não há, por conseguinte, na indenização nenhum acréscimo patrimonial, nem aumento da capacidade contributiva. Não poderá incidir sobre a indenização, qualquer tributo, e não apenas imposto.

Também não poderá ser incluída na base de cálculo de qualquer tributo.

No que concerne ao imposto de renda, a jurisprudência dos nossos tribunais é farta no sentido da não incidência sobre as indenizações.

Mas, no que tange às contribuições, temos que atentar para alguns princípios básicos: 1) elas estão, como tudo, sujeitas ao princípio da isonomia; 2) em conclusão, estão sujeitas ao princípio da capacidade contributiva, decorrência lógica da isonomia. Pouco importa que o § 1º, do art. 145, da Constituição (clique aqui), que consagra, desnecessariamente, o princípio da capacidade contributiva, fale em impostos e não em tributos, pois tal princípio nada mais é do que uma explicitação da isonomia. Assim sendo, a palavra impostos, colocada no dispositivo acima, deve ser compreendida como tributos não vinculados. Com isso, temos de admitir que o princípio da capacidade contributiva só não se aplica às taxas, porquanto estas são cobradas ou em razão de serviços prestados pelo poder público, ou em decorrência do exercício do poder de polícia. Em suma, em razão de uma atividade do sujeito ativo da obrigação tributária.

Mas não é só. A capacidade contributiva está expressamente consagrada no § 9º, do art. 195, da Constituição, quando afirma:

"§ 9º As contribuições sociais previstas no inciso I do caput deste artigo poderão ter alíquotas ou bases de cálculo diferenciadas, em razão da atividade econômica, da utilização intensiva de mão-de-obra, do porte da empresa, ou da condição estrutural do mercado de trabalho".

Enfim, tal disposição permite a progressividade da contribuição, e a progressividade é um fator de mensuração da capacidade contributiva. Base de cálculo e alíquota variáveis são elementos que consagram a possibilidade de progressividade, e com isso, o respeito ao princípio da capacidade contributiva, visto que a progressividade é a técnica mais apropriada para onerar o contribuinte pela aplicação do princípio da capacidade contributiva.

Note-se ainda que ao definir a base de cálculo da contribuição do empregador, o art. 195, I, a, da Constituição só incluiu "a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título..." Assim, o empregador não tem a sua contribuição calculada com base em qualquer parcela que não corresponda a rendimento do trabalho. Se assim é – pois o STF já decidiu que tanto a contribuição do empregador como a do empregado tem a mesma natureza jurídica – o empregado não pode ser onerado com base em recebimentos que não correspondam a rendimentos do trabalho.

Em resumo: o aviso prévio indenizado não pode ser incluído na base de cálculo da contribuição do empregador por não constituir rendimento do trabalho; não pode ser tributado como rendimento do empregado nem como contribuição previdenciária pois não é rendimento do trabalho, nem como rendimento sujeito ao imposto de renda pois não configura acréscimo patrimonial.

Feitas estas considerações genéricas, vejamos a questão do aviso prévio indenizado, enfocando a legislação ordinária. Todo contrato de trabalho por prazo indeterminado tem o aviso prévio como garantia (do empregado e do empregador), o qual, em face do art. 7º, item XXI, da Constituição, tem o prazo mínimo de 30 dias.

A Lei nº 8.212, de 24/7/91 (clique aqui), que no seu art. 28 dispôs sobre o salário de contribuição, excluiu expressamente o aviso prévio indenizado da incidência. Estava assim redigido:

"Art. 28 ...........................................................................

...............................................................................

§ 9º - Não integram o salário da contribuição:

...............................................................................

a) a importância recebida a título de aviso prévio indenizado, férias indenizadas, indenização por tempo de serviço e indenização a que se refere o art.9º da Lei nº 7.238, de 29 de outubro de 1984........................................."

Além disso, só incluiu no rol das parcelas tributáveis aquelas de natureza salarial, vale dizer, parcelas remuneratórias do trabalho realizado ou serviço prestado.

Foi a Lei nº 9.528/97 (clique aqui) que excluiu a menção do aviso prévio indenizado do rol das verbas percebidas a título de indenização, mas, apesar disso, determinou que a contribuição previdenciária só poderá incidir sobre parcelas destinadas a retribuir o trabalho (art. 28, item I). Está assim redigido:

"Art. 28. Endende-se por salário-de-contribuição:

I - para o empregado e trabalhador avulso: a remuneração auferida em uma ou mais empresas, assim entendida a totalidade dos rendimentos pagos, devidos ou creditados a qualquer título, durante o mês, destinados a retribuir o trabalho, qualquer que seja a sua forma, inclusive as gorjetas, os ganhos habituais sob a forma de utilidades e os adiantamentos decorrentes de reajuste salarial quer pelos serviços efetivamente prestados, quer pelo tempo à disposição do empregador ou tomador de serviços nos termos da lei ou do contrato ou, ainda, de convenção ou acordo coletivo de trabalho ou sentença normativa;"

A Lei foi clara, e não poderia ser diferente, pois esbarraria, como vimos, em princípios constitucionais.

Assim sendo, a conclusão é que tendo natureza indenizatória, o aviso prévio indenizado não pode ser incluído na base de cálculo de nenhum tributo não-vinculado. Ele é uma indenização reparadora pela despedida imotivada.

No entanto, apesar da clareza dos princípios constitucionais e das disposições legais acima mencionados, foi baixado o decreto 6.727/09 (clique aqui) que autorizou a cobrança da contribuição previdenciária sobre o pagamento do aviso prévio indenizado. O que o decreto fez foi tentar revogar uma disposição de lei – verdadeiro despautério jurídico – disposição esta que nem precisaria existir, porquanto a Constituição já dispôs com suficiente clareza sobre o assunto.

Com isso, o próprio governo possibilitou impetrações de mandados de segurança preventivo – o que já tem ocorrido. Em vários deles, liminares já foram deferidas.

Não há como imaginar que tais ações mandamentais não sejam confirmadas pelas instâncias ordinárias e extraordinárias, pois o decreto do executivo contraria frontalmente disposições legais e constitucionais, sendo que estas últimas poderão não ser invocadas, tal a clareza das leis.

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*Mestre e Doutor em Direito pela Puc/SP. Desembargador Federal aposentado. Advogado do escritório Lacombe, Silveira e Peña Advogados Associados






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