O perigo do projeto de lei dos "bancos de dados positivos de consumidores"
Nayron Divino Toledo Malheiros*
Tal cadastro tem o escopo de criar uma lista de bons pagadores, assim, toda vez que o consumidor cumprir com uma obrigação, quitando um financiamento, por exemplo, terá seu nome incluso em tal cadastro, o qual estará a disposição de qualquer empresa integrada ao sistema de consulta, da mesma forma que hoje é acessada as informações sobre inadimplentes.
Os defensores deste projeto alegam que com a implantação de tal cadastro, haverá um aumento na oferta de crédito no mercado, além da diminuição dos juros referentes àquelas operações, haja vista que o fornecedor poderá avaliar melhor o risco de firmar certo contrato com determinada pessoa.
Porém devemos alertar para os perigos da implantação de tal cadastro em nosso ordenamento jurídico, pois o tipo de informações ali manuseadas possui caráter extremamente íntimo, e serão facilmente acessadas por qualquer pessoa, podendo esta efetuar uma devassa nos dados de qualquer cidadão no país inteiro.
Tal acesso poderá ser equiparado ao controle que a Receita Federal possui sobre os rendimentos dos contribuintes que declaram Imposto de Renda, porém neste caso tais informações serão acessadas por particulares, além da possibilidade que tais informações sejam cruzadas posteriormente pela própria Receita Federal.
No projeto original do Senado era possível saber o perfil de consumo da pessoa, ou seja, o cadastro especificaria exatamente o que foi adquirido, aonde ocorreu àquela transação e ainda qual foi a forma de pagamento utilizada. Tal ponto foi retirado do projeto pela Câmara dos Deputados, por considerar extremamente invasiva a intimidade.
Outro ponto que foi modificado era a desnecessidade de notificação do consumidor quando seu nome fosse incluído no cadastro positivo. A Câmara dos Deputados novamente alterou o projeto e primou pela obrigatoriedade de tal notificação ao consumidor, seguindo a regra utilizada pelos bancos de dados negativos.
Em um contexto prático teremos um cenário aonde os fornecedores portarão cada vez mais de informações sobre os consumidores, e estes se tornarão reféns dos parâmetros estabelecidos pelas empresas.
O cadastro positivo cria um novo estágio que o consumidor terá que percorrer para demonstrar que está apto a receber crédito no mercado, ofendendo desta forma o próprio Código de Defesa do Consumidor e a Constituição Federal (clique aqui) no que tange a Isonomia.
A partir da aprovação desta lei poderá existir o absurdo da negativa de concessão de crédito ao consumidor com o nome "limpo na praça", pelo simples fato de que este não possua seu nome no cadastro positivo por não ser adepto a utilização de cartões de crédito, nem nenhum outro tipo de financiamento, por exemplo.
Cria-se assim o conceito de que todos consumidores não são dignos de crédito, devendo estes demonstrar que além de possuírem nenhuma dívida em aberto, que ainda possuem um histórico de consumo que se adéque aos interesses do comerciante.
A proteção ao crédito é muito importante, ainda mais em tempos de crise, mas não podemos deixar que a voracidade do mercado financeiro venha impor seus interesses sobre aqueles que reconhecidamente são os mais vulneráveis na relação comercial. Ficamos na expectativa pelo bom senso de nossos legisladores e de nosso Presidente no que se refere à aprovação ou veto de tal projeto de lei, que em nada favorece aos consumidores.
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*Advogado, sócio do escritório Toledo, Duarte & Siqueira advogados S/S, ex-conciliador do Procon-Goiânia,