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Plano verão. Obrigação de ressarcimento

Cerca de 15 anos atrás consolidou-se jurisprudência no STJ e no STF, condenando os bancos a ressarcirem aos demandantes, seus clientes, o expurgo do Plano Verão, no caso de contratos financeiros celebrados pré-plano, na modalidade de juros pós-fixados.

5/3/2009


Plano verão. Obrigação de ressarcimento

Romualdo Wilson Cançado*

Orlei Claro de Lima**

Cerca de 15 anos atrás consolidou-se jurisprudência no STJ e no STF, condenando os bancos a ressarcirem aos demandantes, seus clientes, o expurgo do Plano Verão, no caso de contratos financeiros celebrados pré-plano, na modalidade de juros pós-fixados.

Todos sabiam quem ganhou e quem perdeu com o Plano. A Revista "Veja", em sua edição de 7/2/90, noticiou:

"O céu foi o limite",

E, em sub-título:

"Os Bancos tiveram lucros fantásticos em 1989, mas estão preocupados com o que virá e se preparam para novos negócios."

O jornal "Folha de S.Paulo" mostrou uma das repercussões do Plano:

"Perda de NCZ$ 300 mi,"

dando a palavra ao então Diretor de Fiscalização do BACEN, José Tupy Caldas de Moura, que explicou:

"Para uma corretora ou distribuidora que tinha em sua carteira o limite legal máximo de CDBs no dia 15 de janeiro, o prejuízo do fim da correção monetária é equivalente a 45% do patrimônio líquido."

O jornal "Estado de Minas" afirmou:

"Bancos lucraram US$ 2 bilhões com fim da correção para CDBs."

No corpo do artigo, o então Presidente da Bolsa de Valores de Minas Gerais, Fernando Rezende, declarou:

"... estima-se que o sistema bancário tenha obtido ganho de cerca de 36% nos papéis vencíveis em 60 dias e em torno de 27% nos de 45 dias, amealhando aproximadamente dois bilhões de dólares, pelo menos, sem o emprego de um centavo de recurso próprio."

Isto foi o que aconteceu. Não obstante, agora, às vésperas da prescrição, talvez com receio de que muitos mais reivindiquem o mesmo direito, os bancos resolveram partir para a reação. Capitaneados pela FEBRABAN e CONSIF, pretendem obter do STF a "constitucionalização" do expurgo, ou, no mínimo, a suspensão das ações em curso ou a serem propostas, por via de liminar (decisão solitária do Relator), até o julgamento final da ação.

Na falta de argumentos jurídicos – esgotados, ao fim de 15 anos de derrotas sucessivas - os bancos partem para considerações de natureza econômica, com ampla utilização da mídia. O carro-chefe de sua argumentação é a de que a restituição de valores não pagos, aos investidores, levará à bancarrota o sistema financeiro. Este, então, teria que ser ajudado pelo Governo, transformando-o no último e único prejudicado final.

Desta vez, contudo, os investidores estão reagindo, e mostrando a verdadeira realidade dos fatos, através do IDEC, de outras associações de defesa do consumidor, e de advogados particulares. O CORECON, no dia 25/11/08, submeteu a uma Coletiva de Imprensa estudo do Prof. Roberto Luiz Troster, que, entre outras funções, foi economista chefe da FEBRABAN. Ele mostrou que as perdas dos bancos, caso viessem a ressarcir todo o universo de seus clientes aplicadores, seria da ordem de R$ 29 bilhões, enquanto os recursos retidos, pelo mesmo tempo, lhe teria rendido cerca de R$ 228 BILHÕES, na pior das hipóteses (aplicação em DIs).

Sobre o mesmo tema, o jornalista Elio Gaspari, em sua coluna de 14 de dezembro último, menciona o risco de uma “liminar tóxica”, que estaria no caminho do Ministro Gilmar Mendes, em comentário sob o título "A banca e sua janela de oportunidade no STF". Ele assinala que, no raciocínio da banca, "... só há um jeito de não devolver o dinheiro. Trata-se de sacar uma ADPF, com um pedido de liminar. Concedida, ela sustaria todos os processos e todas as devoluções."

Hoje, parece ser difícil encontrar algum paladino, no STF, para encampar este argumento insólito. Afinal, a questão é de natureza jurídica, e não econômica. O Prof. Miguel Reale Júnior, versando os expurgos do Plano Real (mas cujos fundamentos e conclusão se aplicam ao Plano Verão), abordou o tema com muita felicidade.

Refutando o surrado argumento de que a mudança de padrão monetário implicaria a permissão para que se faça "... a conversão das relações contratuais, sem resíduos inflacionários que, por definição, não existem na nova moeda", o ilustre jurista expõe a antinomia entre "ciência econômica" e "ciência jurídica", dizendo:

"A ciência econômica poderá conhecer o conceito de "resíduos inflacionários” e, até, ver avançada a noção de, "por definição”, não vir a existir tais resíduos em uma "nova moeda”. Dificilmente a ciência jurídica. Nessa, a inflação é intransitiva; e, portanto, está, ou não, no mundo dos fatos, que o Direito colhe para sua esfera normativa".

Acentua que, no caso brasileiro, os efeitos inflacionários são legalmente compensáveis via correção monetária, concluindo que não pode haver inflação zerada por decreto, ponderando:

"Demais, como considerar o Direito fatos que "por definição” não existem? Ou há fatos colhidos para a esfera do Direito, ou há fatos que remanescem fora da esfera do Direito, ou não há fatos. Mas não haver fatos "por definição” ou por decreto da autoridade e, portanto, pretendê-los insuscetíveis de apreensão pela ordenação jurídica, quando esta o entender devido, é pretensão estranha à ciência do Direito. Esta pode negar efeitos jurídicos a fatos reais, limitá-los, enformá-los em seus termos. Mas negar a existência a fato real para preveni-lo do regramento jurídico afigura-nos uma visão inteiramente equivocada e improcedente do legislador.1"

Os grandes prejudicados - poupadores e investidores - conscientes de que há Ministros em Brasília, pedem, apenas, "Que Deus os ilumine", se a ação dos bancos vier a ser ajuizada, especialmente no exame de eventual pedido de concessão de liminar, tantas são as decisões transitadas em julgado, impassíveis de alteração, a esta altura dos acontecimentos.

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1 MIGUEL REALE JUNIOR, Parecer destinado a um Grupo de Investidores, em face do Plano Real, abril de 1.994, págs. 23/24.
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*Advogado e administrador de empresas

**Economista e professor de matemática financeira





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