Os direitos autorais no âmbito da atividade publicitária1
Patrícia Luciane de Carvalho*
I - Aspectos gerais dos direitos autorais
Além da esfera econômica vincula-se também à importância social, já que os direitos do autor equiparam-se, concomitantemente, a direitos humanos.
Pode-se afirmar que no mundo atual verifica uma valorização cada vez maior, tanto no âmbito econômico quanto social, dos chamados bens de propriedade intelectual. Não é difícil se deparar com situações empresariais em que um bem imaterial chega a atingir um valor muito maior do que bens móveis e imóveis, o que era inconcebível até pouco tempo.
Neste contexto, pode-se notar que o direito autoral tem sofrido inúmeros impactos da evolução tecnológica, uma vez que, ao mesmo tempo em que a tecnologia abre novos caminhos, introduzindo novos meios de divulgação da obra intelectual (internet, correio eletrônico, mp3, etc.), ela acaba por aumentar a complexidade do tema da proteção jurídica dos direitos autorais. Sem dúvida os direitos de autor vêm ganhando importância econômica e social, com destaque para a complexidade que envolve nas relações empresariais. Se antigamente, eles tinham como único objeto a proteção de autores e artistas no domínio das artes, o que atribuía a ele uma característica de direito marginal, hoje, com as inovações tecnológicas, que acarretou o alargamento do campo de atuação dos direitos do autor, houve também um acréscimo na sua importância e complexidade.
O desenvolvimento de novas tecnologias de comunicação só fez por aumentar as maneiras de exploração das obras, sendo que a questão da exploração das obras intelectuais é hoje um dos pilares da economia dos países desenvolvidos e em desenvolvimento, ainda que estes não tenham se apercebido desta contextualização.
Posição na taxinomia jurídica. O direito de autor tutela essencialmente as criações do espírito humano, ou obras intelectuais, ou seja, um setor diferenciado das relações entre os particulares, situando-se, portanto, na esfera do Direito Privado, e mais especificamente no âmbito do Direito Civil. Estuda-se o direito de autor, em toda a sua complexidade, como um dos ramos do Direito Civil, ainda que autônomo em relação aos demais ramos, como o direito de família ou direito das sucessões.
Propriedade Industrial. Há um ramo muito próximo do direito autoral, que é o direito da propriedade industrial. De acordo com o art. 1º, n. 2, da Convenção de Paris, "a proteção da propriedade industrial tem por objeto as patentes de invenção, os modelos de utilidade, os desenhos ou modelos industriais, as marcas de fábrica ou de comércio, as marcas de serviço, o nome comercial e as indicações de proveniência ou denominações de origem, bem como a repressão à concorrência desleal."
Nestes termos, é importante não confundir propriedade industrial com direito autoral. Tradicionalmente, em que pese o fundamento dessa disciplina no direito internacional da propriedade intelectual, a propriedade industrial é um capítulo do Direito Comercial, regulado por uma lei específica, que é a Lei de Propriedade Industrial (Lei n. 9.279/96 - clique aqui). Já o direito autoral é um capítulo do Direito Civil, regulado por outra lei específica, que é a Lei n. 9.610/98 (clique aqui). Diferencia-se o direito autoral da propriedade industrial, uma vez que essa é o ramo da propriedade intelectual que regula as relações jurídicas envolvendo criações intelectuais que tenham alguma relevância como utilidade industrial, ou seja, correspondam a uma invenção, inovadora e com aplicação mercadológica.
Propriedade intelectual. Em virtude da construção internacional, com destaque aos trabalhos das organizações internacionais, albergam-se os direitos de autorais e o da propriedade industrial sob o manto dos direitos da propriedade intelectual.
Dentre as organizações, destacam-se os trabalhos da Organização Mundial de Propriedade Intelectual - OMPI e da Organização Mundial do Comércio - OMC. A primeira analisa os direitos da propriedade intelectual mais sob o enfoque humano e na tentativa de harmonização dos interesses dos países desenvolvidos, em desenvolvimento e de menor desenvolvimento relativo. A segunda organização, em que pese a análise dessa esfera de direitos sob o enfoque comercial, estabelece que o atendimento as necessidades sociais equivale à exceção as suas regras comerciais.
II – Proteção legal dos direitos autorais
Fontes internacionais. Inicialmente, é importante destacar que vários subsídios para a matéria de direito autoral advém de fontes do direito internacional, nomeadamente a Convenção de Berna, de 1886, revista em Paris em 1971, ratificada pelo Brasil com o Decreto Presidencial n. 75.699/75 (clique aqui) e o Acordo sobre Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual relacionados ao Comércio, conhecido como TRIPs, assinado no âmbito da Rodada Uruguai do GATT, ratificada pelo Brasil nos termos do Decreto n. 1.135, de 30 de dezembro de 1994 (clique aqui).
A Constituição Federal. Tal é a relevância que a ordem jurídica brasileira empresta ao direito autoral que a Constituição de 1988 (clique aqui) os tutela no âmbito dos direitos e garantias fundamentais do cidadão, no seu artigo 5º, incisos XXVI e XXVII.
O Novo Código Civil. Como o direito autoral é um capítulo do direito civil, é necessário levar em consideração algumas disposições do novo Código Civil (Lei n. 10.406/02 - clique aqui) que se referem à propriedade intelectual, ainda que indiretamente. Estas disposições estão inseridas no capítulo do Código Civil denominado "Dos Direitos da Personalidade".
Segundo o professor Renan Lotufo (Código civil comentado. Vol. 1. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 72). "o caráter dos direitos de personalidade não inibe o seu titular de poder fazer uso com fins econômicos de projeções desses direitos, como os de ceder o uso temporário da imagem, ou do nome."
II.1) A lei de direitos autorais
No Brasil, a Lei n. 9.610, de 19 de fevereiro de 1998, "altera, atualiza e consolida a legislação sobre direitos autorais e dá outras providências".
O conceito de obra intelectual. Como o direito de autor pressupõe uma obra, é prudente que a análise se inicie pelo art. 7º da Lei de Direitos Autorais - LDA, que trata das obras intelectuais protegidas.
O que é uma obra? Aurélio Buarque de Holanda conceitua obra como efeito do trabalho ou da ação. Na lição de Bruno Jorge Hammes2, "protegidas pelo Direito do Autor são as obras resultantes do trabalho (da atividade) intelectual, pessoal, de uma pessoa, que se exteriorizam de alguma forma."
A compreensão do conceito de "obra intelectual" é fundamental para a proteção e gestão dos direitos autorais, pois sem obra intelectual não existe direito autoral a ser tutelado. Destaca-se o fato do conceito legal de "obra intelectual" ser bastante amplo, na medida em que abrange "as criações do espírito", sendo a enumeração do art. 7º meramente exemplificativa. Neste sentido, pode-se considerar, por exemplo, que um filme publicitário é uma obra intelectual, mais especificamente uma obra audiovisual, referida no inciso VI do art. 7º.
Requisitos. Podem-se inferir alguns requisitos necessários para que a obra seja protegida pelo direito autoral. A obra, para ser protegida, deve ser original e exteriorizada, expressa em certa forma ou fixada em qualquer suporte, tangível ou não, conhecido ou que se invente no futuro. Neste sentido, é importante compreender que a idéia, em si, não é passível de proteção jurídica, enquanto não for expressa de alguma forma. Conforme ensina André Lipp Pinto Basto Lupi (Proteção jurídica do software: eficácia e adequação. Porto Alegre: Síntese, 1998, p. 44) "o que se protege através da propriedade intelectual não é o corpo em que a idéia é vinculada (corpus mechanicum), mas sim a exteriorização da idéia, o corpus mythicum, que é um bem intangível."
O requisito da originalidade se relaciona ao fato de que a obra deve ser criada por seu autor. É importante não se confundir com o requisito da novidade para patentes de invenção, por exemplo. No caso da patente, a novidade exige que a obra não exista no estado da técnica no momento de sua criação pelo inventor. No Direito Autoral, basta um critério subjetivo, qual seja, a obra seja produzida pela criação do autor. É importante destacar também que a lei não distingue entre a qualidade das obras intelectuais, gozando da mesma proteção legal tanto um livro de Henry Kissinger como um pífio trabalho acadêmico.
Autor. Quando diante de questões de propriedade intelectual e direitos autorais, deve-se sempre procurar determinar, corretamente, quem é o autor da obra intelectual. Na lição do professor José De Oliveira Ascenção3, "o princípio deve ser fixado com toda a clareza: autor é o criador intelectual da obra. A obra literária ou artística exige uma criação, no plano do espírito: autor é quem realiza esta criação." Neste sentido é a disposição do art. 11 da LDA.
Direitos patrimoniais e direitos morais do autor. A propriedade decorrente do direito autoral desdobra-se em dois principais aspectos. O primeiro deles, denominados de "direitos morais" do autor, se relaciona através da exteriorização da personalidade do autor. Há um caráter de moralidade e o autor se expõe quando exterioriza uma idéia. No caso dos "direitos patrimoniais", a obra do autor é considerada como um bem, e como tal pode ser explorada economicamente. Esta distinção é expressamente acatada em nosso ordenamento jurídico pelo art. 22 da LDA: "pertencem ao autor os direitos morais e patrimoniais sobre a obra que criou".
Sobre os direitos morais do autor, Hammes (Op. Cit., p. 60), explica: "o direito moral é o que protege o autor nas suas relações pessoais e ideais (de espírito) com a obra (...) o direito moral seria a ligação (vínculo) do direito de autor em seu todo a uma determinada obra." Em tendo esta característica semelhante ao de um direito pessoal, o art. 27 da LDA estipula que "os direitos morais do autor são inalienáveis e irrenunciáveis".
Além dos direitos morais, existem os direitos patrimoniais do autor, eis que consistem, basicamente, no controle que o autor tem sobre a exploração econômica de sua obra. Na lição de Hammes (Op. Cit., p. 61): "de maneira genérica, a obra pertence ao autor. É dele. Conseqüentemente, tem todos os direitos decorrentes de um direito de propriedade. Pode utilizá-la com exclusividade, pode permitir ou não permitir que outros a utilizem. A sua vontade determina o que acontece com a obra, quem e como a utilizará. Qualquer utilização depende de sua autorização. As formas de utilização são numerosas. A técnica moderna traz, cada dia, novas formas de utilização de obra." O art. 28 da LDA é bastante claro ao estipular que "cabe ao autor o direito exclusivo de utilizar, fruir e dispor da obra literária, artística ou científica."
Sem dúvida, o conceito que mais interessa se refere à necessidade de autorização prévia e expressa do autor nos casos de utilização de sua obra.
Direitos Conexos. É também muito importante a compreensão dos chamados direitos autorais conexos. Existem os direitos autorais denominados "principais" e os direitos autorais denominados "conexos" ou "vizinhos". "Os direitos conexos [...] são aqueles incidentes sobre todas as interpretações ou execuções artísticas e as eventuais transmissões ou retransmissões destas interpretações, resultantes de sua comunicação ao público para além do espectro do autor. São sujeitos titulares de direitos conexos no mercado musical brasileiro os artistas intérpretes e executantes, os músicos, os cantores, os produtores musicais, as empresas de radioteledifusão e todos os produtores de fonogramas ou videofonogramas. Os direitos conexos, embora possuam a mesma estruturação jurídica e prazo de proteção dos direitos de autor (estendido para 70 anos após a publicação da nova Lei de Direitos Autorais), não têm qualquer relação com a criação ou elaboração da obra intelectual, mas, sim, com a sua interpretação, com a roupagem conferida à obra pelo intérprete ou executante, através de sua efetiva comunicação em locais de freqüência coletiva." (GUEIROS, Nehemias Jr. O direito autoral no show business. Rio de Janeiro: Gryphus, 1999, p. 51).
A questão dos direitos conexos é tratada nos artigos 89 a 96 da LDA, e também devem ser objeto de atenção no sentido de que seu pagamento esteja assegurado contratualmente.
Registro. Seguindo princípio assente na Convenção de Berna, ratificada pelo Brasil, a LDA estipula que os direitos autorais independem de registro para sua proteção legal. Portanto, é com a exteriorização da criação que se inicia a proteção autoral. Uma vez exteriorizada a obra começa sua proteção legal, independentemente de qualquer registro, considerado, no âmbito do direito de autor, como uma formalidade dispensável. Desta forma, presume-se o autor como o seu legítimo titular.
Entretanto, por medida de cautela, com destaque para a questão probatória e quando se trata de outras formas que não as obras literárias, é recomendável que os interessados registrem os direitos autorais sobre suas obras intelectuais, para servir como prova segura da autoria. O registro é feito conforme a natureza da obra.
Duração da Proteção. Nos termos da legislação, o direito que o autor tem de controlar a utilização econômica de sua obra não é eterno, pois se entende que a expressão de um autor não deixa de ser a expressão de sua época, de sua cultura, de sua sociedade; assim, a obra transforma-se em um legado para a humanidade, permitindo o acesso à cultura, à informação e à educação.
A proteção legal do direito do autor tem, portanto, caráter provisório, ainda que seja de longa duração. Cessando a proteção de utilização econômica da obra, ela cai em domínio público, sendo dispensável qualquer autorização do autor para o exercício de qualquer direito relativo a ela.
Neste sentido, assim dispõe o artigo 41 da LDA:
"Art. 41. Os direitos patrimoniais do autor perduram por setenta anos contados de 1° de janeiro do ano subseqüente ao de seu falecimento, obedecida a ordem sucessória da lei civil.
Parágrafo Único. Aplica-se às obras póstumas o prazo de proteção a que alude o caput deste artigo."
Transferência dos Direitos de Autor. É possível a transferência de direitos autorais, mas somente dos direitos patrimoniais, de sua utilização econômica, pois os direitos morais são inalienáveis e irrenunciáveis, de acordo com o art. 27 da LDA, uma vez que se trata de direito personalíssimo.
Para a finalidade de transferência dos direitos de autor, é muito importante considerar o texto do art. 4º da LDA:
"Art. 4° Interpretam-se restritivamente os negócios jurídicos sobre os direitos autorais."
Ou seja, importante ter o máximo cuidado na formalização legal de todo e qualquer ato jurídico que diga respeito ao uso e à transferência dos direitos autorais, pois tais negócios jurídicos são, por força de lei, interpretados restritivamente e em benefício do legítimo titular.
Existem alguns requisitos legais para a cessão de direitos autorais. É de suma importância que se tenha pleno domínio e conhecimento desta matéria, pois o atendimento destes requisitos e a gestão de seu cumprimento viabilizará a boa gestão dos direitos autorais.
A cessão deve ter forma escrita, presume-se onerosa, e deverão constar do instrumento de cessão como seus elementos essenciais seu objeto e as condições de exercício do direito quanto a tempo, lugar e preço.
Cabe também comentar que as "modalidades de utilização" da obra intelectual, referidas no art. 49, V e VI da LDA deverão estar claramente delineadas em cada negócio jurídico de direito autoral. Como orientação geral, é recomendável que as modalidades de utilização contratadas sejam as mais amplas possíveis (por exemplo, o contrato prever a utilização da obra intelectual em mídia escrita, impressa, radiofônica, televisiva, internet).
Diferença entre transferência definitiva e autorização para uso. Os direitos autorais, que, por sua própria natureza, tutelam as criações do espírito humano, podem ser objeto de ampla gama de negócios jurídicos. O objetivo desta análise não é esgotar os negócios jurídicos existentes em matéria de direitos autorais, e tal não seria possível, em função da grande variação de negócios jurídicos que podem ser entabulados tendo por objeto esta matéria. Entretanto, uma distinção básica pode ser feita desde logo. É muito importante que se compreenda corretamente a distinção entre os negócios jurídicos que visam a transferência dos direitos autorais e os negócios jurídicos que têm por objeto a autorização de seu uso. A princípio, em sede de direitos autorais, o termo "cessão", isoladamente, compreende a transferência definitiva da titularidade dos direitos autorais, ou seja, de sua propriedade. Já nas figuras da licença de uso ou cessão de uso, o autor autoriza o uso do direito autoral por terceiro sem, entretanto, lhe transferir a propriedade intelectual. Os termos deste uso (condições de exercício do direito quanto a tempo, lugar, preço e modalidade de utilização) serão determinados em cada contrato de acordo com a autonomia privada das partes. Ressalvamos que estes termos são aqui citados em caráter genérico, podendo ter seu significado alterado em função de cada negócio jurídico específico.
Deve ter esta distinção sempre clara: existem negócios jurídicos que têm por objeto transferir a propriedade sobre direitos autorais, e existem outros negócios jurídicos que têm por objeto autorizar o uso de direitos autorais, nos termos de condições específicas contratadas pelas partes, conservando a propriedade com o autor.
Defesa dos Direitos de Autor – Sanções. É muito importante a ampla compreensão sobre as sanções legais previstas para a utilização indevida de direitos autorais, que compreendem sanções de âmbito civil e penal. A extensão destas sanções legais confere a exata medida do risco empresarial pela utilização indevida destes direitos. A extensão deste risco, como se verá, é bastante ampla, e pode vir a ocasionar severas responsabilidades legais para as hipóteses de utilização indevida de direitos autorais. Por este motivo, é recomendável que os interessados atuem preventivamente na gestão da correta utilização dos direitos autorais de seu interesse, criando uma política preventiva para evitar eventuais responsabilizações legais pelo uso indevido destes bens de propriedade intelectual.
Quanto às sanções propriamente ditas, é importante inicialmente analisar os artigos 101 a 103 da LDA:
"Art. 101. As sanções civis de que trata este Capítulo aplicam-se sem prejuízo das penas cabíveis."
"Art. 102. O titular cuja obra seja fraudulentamente reproduzida, divulgada ou de qualquer forma utilizada, poderá requerer a apreensão dos exemplares reproduzidos ou a suspensão da divulgação, sem prejuízo da indenização cabível."
"Art. 103. Quem editar obra literária, artística ou científica, sem autorização do titular, perderá para este os exemplares que se apreenderem e pagar-lhe-á o preço dos que tiver vendido.
Parágrafo Único. Não se conhecendo o número de exemplares que constituem a edição fraudulenta, pagará o transgressor o valor de três mil exemplares, além dos apreendidos."
Esta disposição do parágrafo único do art. 103 oferece um parâmetro para que o juiz estabeleça um valor de indenização para casos de violação de direitos autorais quando "não se conhece o número de exemplares" que constituem a edição fraudulenta, que é o valor de 3.000 (três mil exemplares), além dos apreendidos. A utilização indevida de direitos autorais é designada, geralmente, como "contrafação". O valor desta indenização é apenas um parâmetro para que cada juiz aplique no caso concreto, mas sem dúvida o valor de 3.000 exemplares supostamente contrafeitos representa um risco patrimonial significativo.
III - Direitos autorais e publicidade
A Posição das Obras Publicitárias no Direito Autoral. A publicidade, nos dias atuais, como ensina Carlos Alberto Bittar em sua obra "O Direito de Autor nos Meios Modernos de Comunicação"4, vem se posicionando como uma "atividade complexa e de enorme importância datada de organização especial – em que se mesclam conotações de arte, ciência e de meio de comunicação. Sobressai-se, neste contexto, o aspecto estético, acionado pelo acirramento da concorrência, a sofisticação dos mercados e outros fatores que tem imposto o aprimoramento das criações publicitárias, em que se utilizam, regularmente, artistas, escritores, cientistas, e, enfim, intelectuais inseridos dentre as expressões maiores da cultura em geral, em que se distingue como manifestação de índole própria e bem definida, gerando inclusive, obras de grande valor e exposição e mostras de caráter especial".
O ramo da publicidade está, portanto, intimamente ligado à gestão dos direitos autorais, haja vista que as criações intelectuais passíveis de proteção estão presentes na publicidade nas suas mais diversas formas de manifestação. Isto pode ser verificado nos anúncios, jingles, filmlets, fotos, spots, slogans, desenhos, logotipos, cromos, catálogos, prospectos, entres outros, que acabam assumindo a forma de obras protegidas pela lei de direitos autorais. Muitas vezes, estas obras adquirem um caráter complexo, devido ao grande número de agentes que participam de sua elaboração e as formas diversas de exteriorização.
A obra publicitária é, portanto, protegida pelo direito de autor, assim como as relações secundárias nela envolvidas, sempre objetivando chegar a um resultado final comum. Desta forma, em seu aspecto global, pode ser vista como uma obra de caráter coletivo.
Isto ocorre pelo fato de, numa campanha publicitária, existir uma pluralidade de agentes e contratos envolvidos, dentre os quais, pode-se citar o anunciante, a agência de publicidade (que é quem realmente executa a campanha), os criadores (que são as pessoas que idealizam e que dão materialidade à campanha) e as empresas difusoras (responsáveis pela veiculação da campanha). No núcleo de toda essa atividade está a agência de publicidade, "em cujo seio são concebidas, criadas e produzidas diferentes obras intelectuais (anúncios, telas, filmes, spots e outros) destinadas a exaltar ou a apontar bens, produtos ou serviços que os anunciantes (principalmente, empresas produtores, comerciais, ou de serviços) têm a oferecer ao público consumidor em geral"5.
É no âmbito da agência de publicidade, portanto, que serão concebidas e concretizadas as mais diferentes obras publicitárias, as quais serão, posteriormente, levadas aos meios de comunicação para a divulgação ao público. Entretanto, de todos esses agentes envolvidos numa campanha publicitária, consideram-se detentores de direitos autorais a agência de publicidade e os criadores. Todavia, não é apenas a obra final que deve ser protegida, existem inúmeros outros aspectos importantes que devem ser levados em consideração. Por isso, não se pode deixar de mencionar, que a LDA, em seus artigos 79 e seguintes, protege as fotografias, os fonogramas e as obras audiovisuais, utilizados na campanha publicitária, de forma individualizada.
O fotógrafo terá, assim, seu direito protegido de qualquer forma, mesmo que a sua obra seja parte de um conjunto maior que é a campanha publicitária. A LDA, no seu artigo 79, §1º, determina que a fotografia, quando utilizada por terceiros que não o seu próprio autor, deverá ser identificada com o nome deste. O mesmo tratamento é dispensado tanto para os autores de fonogramas, como para as obras audiovisuais.
Observe-se, portanto, que no âmbito de uma obra coletiva, como a obra publicitária, podem haver inúmeras criações individuais. Nestes casos, haverá a proteção da obra em si, tomada individualmente, todavia, sem qualquer prejuízo dos direitos do titular da obra coletiva.
Os contratos e os direitos conexos. Tão importantes quanto as obras supracitadas, protegidas pelo direito do autor, são os chamados direitos conexos, aos quais a Lei de Direitos Autorais dispensa tratamento especial.
De acordo com Carlos Alberto Bittar, em sua obra "Direito de Autor"6, tem-se como direitos conexos aqueles “reconhecidos, no plano dos de autor, a determinadas categorias que auxiliam na criação ou na produção ou, ainda, na difusão da obra intelectual. São os denominados direitos 'análogos' aos de autor, 'afins', 'vizinhos', ou, ainda, 'araautorais', também consagrados universalmente".
Trata-se, portanto, dos direitos conferidos àqueles que não têm uma relação direta com a criação ou a elaboração da obra publicitária, mas que de alguma forma dela participam, seja na sua interpretação, produção ou difusão. Os direitos conexos abrangem, portanto, os direitos conferidos aos artistas, intérpretes ou executantes, aos produtores fonográficos e às empresas de radiodifusão, presentes nos artigos 89 e seguintes da Lei de Direitos Autorais. A observância destes direitos é de extrema importância na execução de uma campanha publicitária, para que se evitem problemas futuros.
A produtora, que pode ser de fonogramas, por exemplo, é também titular de direitos autorais, relativamente ao que ela produziu. Ela é detentora de direitos relativamente ao produto final ou ao programa -no caso de uma empresa de radiodifusão - por ela produzida. De acordo com Carlos Alberto Bittar, em sua obra "Direito de Autor"7, "a proteção é conferida, pois, às irradiações, às sonorizações, às emissões, às fixações de imagens e de sons, às transmissões e às re-transmissões (arts. 96 a 99)".
O mesmo tratamento deve ser observado com relação às empresas de radiodifusão.
Dos Contratos com as Agências de Publicidade. Ao firmar um contrato com uma agência de publicidade, para a execução de determinada campanha, deve-se observar a quem irão pertencer os direitos autorais relativos à campanha. Caso pretenda-se utilizar livremente estes direitos autorais, será necessária uma previsão contratual específica neste sentido. Também recomendamos que, no contrato com agências de publicidade, haja cláusula contratual específica pela qual a agência de publicidade assuma integral responsabilidade pela legalidade na contratação de terceiros (artistas, intérpretes, fotógrafos, cineastas, "designers"), isentando totalmente a empresa de toda e qualquer responsabilidade neste sentido.
Dos Contratos com os Artistas. Muitas vezes as campanhas publicitárias se utilizam de artistas e intérpretes para a sua execução, os quais podem participar da elaboração desde outdoors e "folders", até mesmo de filmes publicitários.
Ao firmar um contrato com um artista, diretamente ou através de uma agência de publicidade, é imprescindível que a empresa ou a agência, conforme o caso, supervisione este contrato, atentado para que certas cláusulas estejam presentes, tais como:
a) preço (valor da remuneração a ser paga ao artista para a execução da campanha);
b) modalidade de utilização (como as imagens, a voz, e as demais criações serão utilizadas na campanha, ou seja, em anúncios de "outdoors", filmes publicitários, internet, rádio, televisão, etc. Esta deve ser a mais abrangente possível, para evitar qualquer tipo de utilização indevida e que possa gerar problemas à empresa posteriormente);
c) território geográfico (neste caso, procura-se determinar o território da forma mais abrangente possível, por isso, normalmente, determina-se o território como sendo Brasil, simplesmente. Nada impede, porém, que este seja restringido);
d) período de utilização (é importante que seja determinado no contrato o período de tempo pelo qual a campanha será veiculada).
É importante que estejam os empresários atentos a estes aspectos no momento da assinatura do contrato, pois a transgressão destas cláusulas poderá gerar inúmeros transtornos, inclusive eventual ação judicial pleiteando indenização por uso indevido de direitos autorais decorrentes da atuação publicitária.
IV – Conclusões
Visão geral de como funciona a questão dos direitos autorais. Este foi o objetivo central do presente artigo, principalmente a necessidade de alertar para a importância de se elaborar e executar uma política preventiva de gestão e controle dos direitos autorais de seu interesse;
Termos e condições a serem contratados com as agências de propaganda, para que estas garantam os direitos de uso irrestrito de todo material produzido pela agência ou por profissionais por ela contratados. Considerando que estas garantias devem constar em um contrato que regulamente as relações jurídicas entre a empresa e uma agência de publicidade, recomenda-se o texto de cláusulas contratuais neste sentido; entretanto ressalvamos que estas cláusulas devem estar em consonância com o restante do contrato.
Cláusulas e condições que deverão constar nos contratos e/ou cessões de uso de imagem, voz, etc., quando a contratação for realizada diretamente pela empresa. A primeira e mais importante constatação é a de que deve existir um contrato específico para cada situação. As cláusulas e condições genéricas são aquelas constantes do art. 50 da LDA, principalmente a clara definição dos elementos essenciais seu objeto e as condições de exercício do direito quanto ao tempo, lugar, preço e modalidade de utilização. Em face da ampla gama de negócios jurídicos sujeitos ao regime jurídico dos direitos autorais, poderemos fazer uma análise mais detalhada em função de cada caso concreto de interesse.
Formas de se garantir para que possamos realizar o registro de marcas, patentes, desenhos industriais, etc. A princípio, o registro de marcas, patentes e desenhos industriais é matéria mais afeita à propriedade industrial do que propriamente ao direito autoral. Estes registros (marcas, patentes de invenção e desenhos industriais) devem ser efetuados junto ao INPI (Instituto Nacional de Propriedade Industrial). Para a finalidade de efetuar estes registros, pode se valer dos serviços de um agente de propriedade industrial.
Como garantir, no caso de criações realizadas por funcionários, principalmente no que diz respeito a seus herdeiros. Esta questão é de alta controvérsia jurídica, na medida em que a atual lei de direitos autorais silenciou sobre esta matéria. Como subsídio, por analogia, existe uma disposição específica na atual lei de proteção dos programas de computador (software), que também é considerado uma criação intelectual tutelada por direitos autorais.
V – Referências
ASCENSÃO, José de Oliveira. Direito Autoral. Rio de Janeiro: Renovar, 1997, 2ª Edição.
BITTAR, Carlos Alberto. O direito de autor nos meios modernos de comunicação. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1989.
COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. Vol. 1. São Paulo: Saraiva, 1988.
GUEIROS, Nehemias Jr. O direito autoral no show businnes. Rio de Janeiro: Gryphus, 1999.
HAMMES, Bruno Jorge. O direito da propriedade intelectual - subsídios para o ensino. São Leopoldo: Ed. Unisinos, 1998.
LOTUFO, Renan. Código Civil Comentado. Vol. 1. São Paulo: Saraiva, 2003.
LUPI, André Lippi Pinto Basto. Proteção Jurídica do Software: eficácia e adequação. Porto Alegre: Síntese, 1998.
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1 O presente corresponde ao resumo do trabalho desenvolvido na obra “Propriedade Intelectual – Estudos em Homenagem à Professora Maristela Basso”, da Editora Juruá e sob a coordenação da mesma autora.
2 O direito da propriedade intelectual - subsídios para o ensino. São Leopoldo: Ed. Unisinos, 1998, p. 45.
3 Op. Cit., p. 70.
4 São Paulo: Revista dos Tribunais, 1989, p. 38.
5 BITTAR, Carlos Alberto. O direito de autor nos meios modernos de comunicação. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1989, p. 42-43
6 Rio de Janeiro: 2ª ed., Forense Universitária, 1994, p. 153.
7 Rio de Janeiro: 2ª. ed., Forense Universitária, 1994, p. 160.
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*Assessora Jurídica da Agência USP de Inovação. Professora de direito internacional e de propriedade intelectual da Universidade Anhembi/Morumbi
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