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As instituições financeiras e a responsabilidade social e ambiental: o papel do regulador

A preocupação com a chamada responsabilidade social e ambiental das empresas no Brasil é resultado de uma moderna cultura corporativa, que vem ganhando força e progressiva projeção nos últimos anos.

30/8/2004


As instituições financeiras e a responsabilidade social e ambiental: o papel do regulador

Fernando R. de Almeida Prado*

A preocupação com a chamada responsabilidade social e ambiental das empresas no Brasil é resultado de uma moderna cultura corporativa, que vem ganhando força e progressiva projeção nos últimos anos. Essa nova ordem demonstra que as empresas podem ser capazes de imprimir à comunidade e ao ambiente que as rodeiam valores importantes na construção de uma nova sociedade, quer através de ações efetivas para mitigar efeitos colaterais que resultam da própria atividade empresarial, quer fomentando a construção de uma nova mentalidade pautada por princípios éticos, sociais e ambientais.

O setor financeiro também se insere nesse novo contexto e, como conseqüência natural, algumas instituições financeiras já adotam, na condução de seus negócios, políticas condizentes com elevados princípios de responsabilidade social e ambiental. Por exemplo, certos bancos passaram a oferecer crédito com prazos e condições mais favoráveis e a administrar e gerir fundos de investimento que beneficiam apenas empresas que preencham determinados requisitos de ética e de responsabilidade social e ambiental.

A adoção dessa nova postura por parte dos bancos privados também é fruto da ação de organismos de crédito públicos, tanto no mercado doméstico como no internacional. No cenário interno, o BNDES, por exemplo, observa princípios ético-ambientais na execução de sua política de crédito há décadas.

No cenário internacional, merece destaque a atuação do IFC, que em outubro de 2002 convocou vários bancos para discutir questões ambientais e sociais, o que resultou na elaboração dos chamados “Princípios do Equador”1. Trata-se de um conjunto de critérios de responsabilidade social e ambiental que deverão ser observados pelos bancos na avaliação e aprovação da concessão de financiamentos a projetos de infra-estrutura.

Existem também diversas iniciativas concretas para que sejam adotados mecanismos contábeis de aferição do chamado passivo ambiental, a fim de que este se torne visível aos órgãos reguladores, investidores, funcionários e permita aos bancos uma melhor avaliação da viabilidade da concessão de empréstimos e financiamentos.

Como se vê, são várias as ações e movimentos tanto da iniciativa privada como da pública convergindo para a edificação do conceito de responsabilidade social e ambiental. Entretanto, verifica-se que a ação dos órgãos reguladores dos mercados financeiro e de capitais para fomentar e incentivar essas iniciativas ainda é tímida. Muito embora já existam algumas normas isoladas2 que podem incentivar o financiamento a projetos e empresas que contribuam para a melhoria do meio ambiente, não há notícia de que o Conselho Monetário Nacional esteja estudando a adoção de um conjunto de medidas concretas que possam incentivar as instituições financeiras brasileiras a concederem financiamentos a projetos que contribuam para o desenvolvimento responsável, e que atentem para a preservação de valores sociais e do meio ambiente.

O Conselho, através do Banco Central do Brasil poderia, por exemplo, adotar medidas de redução da taxa dos recolhimentos compulsórios e encaixes obrigatórios para as instituições bancárias que concedessem empréstimos e financiamentos que atendessem a determinados critérios éticos, sociais e ambientais.

Tal medida, ora apresentada a título meramente exemplificativo, certamente daria impulso ao já existente movimento de que fazem parte algumas instituições financeiras brasileiras, que acabam por forçar seus clientes a terem uma atuação responsável nas áreas social e ambiental e, com isso, poderem acessar crédito com maior facilidade.

Os princípios de responsabilidade social afirmam-se paulatinamente como uma tendência no meio corporativo mundial, especialmente nos paises mais desenvolvidos. Os reflexos dessa realidade já alcançam o Brasil, e as autoridades monetárias devem estar atentas a esta nova tendência internacional.
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1 Informações precisas e detalhadas acerca dos princípios do Equador podem ser obtidas no site https://www.equator-principles.com/.


2
Vide as operações de crédito para a execução de ações de saneamento ambiental a que se refere a Resolução 2827, de 30/3/2001.
De acordo com os termos de referido normativo, a contratação de operações de crédito para a execução específica de ações de saneamento ambiental encontra-se sujeita a limites e condições diferenciados, mais flexíveis que aqueles aplicáveis às demais operações de crédito envolvendo entidades do setor público

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* Advogado do escritório Pinheiro Neto Advogados

* Este artigo foi redigido meramente para fins de informação e debate, não devendo ser considerado uma opinião legal para qualquer operação ou negócio específico.

© 2004. Direitos Autorais reservados a PINHEIRO NETO ADVOGADOS











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