Perversos e difíceis
Edson Vidigal*
Quando espocou uma dessas operações da Policia Federal, um ilustre jornalista de grande influência nacional me telefonou perguntando sobre uma ilustre autoridade.
Mas o que me deixou mesmo intrigado foi que, dias depois, me encontrando com outra grande autoridade de poder decisório maior ainda na República, a pergunta que me foi feita, a respeito daquela mesma ilustre autoridade, foi a mesma.
Que eu saiba, não. E olha que na idade em que estou já era para eu saber muita coisa. Mas sobre esse aí, que eu saiba, não.
Achando que essa negativa sucinta assim não bastava, agreguei outros argumentos de defesa. Nunca ouvi falar. Não acredito. É intriga da oposição.
Por que seria que em meio a tantas acusações objetivas, algumas até tipificáveis como crime, de repente esse interesse por uma eventual suposta fraqueza daquela pessoa, aliás tão injustamente atirada no corredor da morte moral, onde já não são poucos os que se amontoam, inocentes ou culpados?
Alguns filmes antigos, daqueles que mostram rabiscos ligeiros na tela de tão gastos, foram passando em rotações aceleradas pela minha cabeça.
Um deles, até muito conhecido pela moral da história, conclui dizendo que se o inimigo não tem defeito, providencia-se logo um defeito.
O outro filme, talvez menos conhecido, trata da extraterritorialidade da fraqueza, digamos, da preferência, para manter a salvo a reputação.
Num parlamento municipal, o alvo dos ataques era o alcaide e quando o líder da oposição não tinha mais o que dizer juntou ao palavreado a emoção descontrolada de um ademais.
Ademais, senhor Presidente, ainda tem as ofensas aos nossos brios, às nossas tradições, o mau exemplo para a nossa juventude, o vexame para as nossas famílias.
E aí o líder do governo, cabeleira rala mas cuidadosamente tingida em tom caju, voz empostada de candidato a camelô de almanaque de bristol, ergue o dedo ameaçador bradando alto lá, alto lá, é tudo mentira.
E depois de uma pausa solene e um rápido gargarejo, arrematou – e se tais supostas fraquezas acontecem, não é no nosso território, é do outro lado, em outro município.
Isso tudo poderia ser encarado como mero preconceito, nunca homofobia, até porque vivemos hoje num patamar civilizatório em que cada um tem o pleno direito de dar o que bem entender de seu, de tudo seu, contanto que a ninguém e nem à república dê prejuízo.
É assunto sério, muito sério, quando os perversos e suas vicissitudes se entranham nas organizações do Estado, no poder de nomear, de demitir, ou no poder de polícia, e no limite cruel da terrível dúvida do ser ou não, tupi ou não tupi, se danam em suas danações, as mais danadas, incluindo assédio moral.
Quando percebeu que a concorrência se alastrava entre os camisas pardas da sua tropa de choque, pau para toda obra, e vice-versa, que lhe dava sustentação na escalada do poder, o chefe maior nazista não quis nem saber quem era de direita ou de esquerda, claro eram todos de direita.
Pegando a todos de surpresa num piquenique, mandou que a sua guarda pessoal mandasse bala, abatendo um por um. Nem o chefe geral da corporação, ele também um perverso e difícil, escapou.
Nessa galeria, tem muita gente. De Nero a Hitler, de Idi Amin Dada a Robert Mugabe, de Papadoc a Babydoc, de Sukarno a Sadam Houssein.
Todos começaram com pregações bonitas e esperançosas em favor dos humildes, condenando as injustiças, prometendo um futuro bonito com muita terra, muito pão e liberdade, ah sim, muita liberdade.
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*Ex-Presidente do STJ e Professor de Direito na UFMA
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