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Recuperação empresarial: perspectivas legais

Há pouco tempo, as empresas brasileiras passaram por algumas mudanças normativas. Em 2002, com a sanção do “novo” Código Civil, adotou-se a Teoria da Empresa, seguida por países europeus desde meados do século XX, em detrimento da antiga e já descabida Teoria dos Atos de Comércio.

26/7/2004

Recuperação empresarial: perspectivas legais


Rodrigo Guimarães Colares*

Há pouco tempo, as empresas brasileiras passaram por algumas mudanças normativas. Em 2002, com a sanção do “novo” Código Civil, adotou-se a Teoria da Empresa, seguida por países europeus desde meados do século XX, em detrimento da antiga e já descabida Teoria dos Atos de Comércio.

Contudo, os empresários continuaram com sérias dificuldades decorrentes da persistente defasagem legislativa que vige no Brasil. Uma delas diz respeito às possibilidades de recuperação empresarial e decretação da falência.

Pela atual legislação nacional (Decreto-lei n.º 7.661 de 1945, conhecido como “Lei de Falências”), o empresário que busca convocar seus credores, na tentativa de encontrar melhores formas de adimplemento de seus débitos e obrigações, e lhes propõe dilação, remissão de créditos ou cessão de bens, corre o risco de ter decretado estado de falência ao seu negócio.

A decretação de falência é algo que não interessa a ninguém. É ruim para o empresário, que tem seu negócio impedido, para os trabalhadores, que perdem o já escasso emprego, e finalmente para o Estado, que tem sua arrecadação tributária diminuída. É maléfica, pois, a toda sociedade.

Na incessante procura de adaptação empresarial diante da presente lei, tem se tentado estabelecer ajustes informais com os credores, chamados de acordos pré-concursais, em que se regem as formas pelas quais deverão ser adimplidos os créditos, sem qualquer intervenção judicial.

O diploma legal de 1945 reflete outras épocas, outros valores, e despreza a boa fé que norteia as relações econômicas. Por isso, brevemente deverá ter sua sepultura selada, dando vez a uma nova lei, que melhor condiz com as relações empresariais modernas e que deverá trazer inúmeros benefícios sociais.

Tramita no Congresso Nacional o Projeto de Lei n.º 4.376-E, de 1993. Segundo o Projeto, em sua redação aprovada pelo Senado Federal em 06 de julho de 2004 (PL n.º 71/03), a convocação, pelo empresário devedor, de credores ou de classes de credores para apresentação de proposta de plano de recuperação extrajudicial, não caracterizará ato que enseja o pedido de falência.

Dessa forma, ao oposto da atual legislação, abrir-se-á salutar oportunidade para a livre negociação entre os empresários e seus credores, por meio do instituto denominado recuperação extrajudicial. As exceções são os créditos trabalhistas e tributários, que apresentam restrições não susceptíveis de transação por natureza.

Uma vez ultrapassada a fase de entendimento entre as partes, a celebração do acordo extrajudicial poderá ser formalizada em instrumento próprio, ou resultar de deliberação de assembléia geral de credores. Sem necessidade de maiores empecilhos burocráticos ou judiciais que poderiam dificultar amargamente o acordo. Mesmo assim, é facultada a possibilidade de se requerer a homologação por um juiz competente.

Ainda pelo referido PL, será extinto o instituto que atualmente chamamos de concordata. Em seu lugar, deverá aparecer a recuperação judicial.

Diferente da concordata1, que é adotada quando a empresa se encontra em dificuldades econômico-financeiras, a recuperação judicial poderá ser concedida também à empresa que estiver passando por dificuldades temporárias no seu negócio, quando houver iliquidez, insolvência ou quando se encontrar em situação patrimonial a merecer readequação planejada da sua atividade. Viabiliza, dessa maneira, a realização da função social da empresa.

As possibilidades de recuperação empresarial, pelos meios judicial e extrajudicial, são alguns dos principais méritos da lei vindoura, atualmente aguardando aprovação pela Câmara dos Deputados e já conhecida como futura “Lei de Recuperação Empresarial”. Estampa os novos ares de soerguimento empresarial que estão por chegar.

Diante do novo regramento, aos empresários caberá atenção à saúde de seu negócio. Aos advogados, por sua vez, incumbirá encontrar as melhores formas jurídicas de remediar empresas eventualmente atingidas pelas sucessivas crises econômicas que constantemente abalam o Brasil. A boa adoção dessas medidas inequivocamente refletirá os interesses sociais da nação, trilhando um caminho mais seguro ao almejado crescimento econômico.
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1 ASSUMPÇÃO ALVES, Alexandre Ferreira de. Direito Falimentar e Recuperação de Empresas. MBA Direito Empresarial, Fundação Getulio Vargas, 2004.
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* Advogado do escritório Martorelli Advogados









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