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Incidência do IRPF nas aplicações financeiras mantidas no exterior

A incidência do imposto de renda sobre os rendimentos e ganhos de capital auferidos pelas pessoas físicas em razão de aplicações financeiras mantidas no exterior gera algumas questões que, de forma sucinta, buscaremos esclarecer neste artigo.

12/7/2004


Incidência do IRPF - Imposto de Renda Pessoa Física - nas aplicações financeiras mantidas no exterior


Olavo Marchetti Torrano*

A incidência do imposto de renda sobre os rendimentos e ganhos de capital auferidos pelas pessoas físicas em razão de aplicações financeiras mantidas no exterior gera algumas questões que, de forma sucinta, buscaremos esclarecer neste artigo.

I – tributação da renda (rendimento ou ganho de capital)

Para efeitos de Imposto sobre a Renda, no direito brasileiro, a palavra renda é considerada gênero, sendo os rendimentos e os ganhos de capital considerados suas espécies. Assim, a tributação sobre a renda abrange tanto os rendimentos quanto os ganhos de capital. A diferenciação entre rendimentos e ganhos de capital é de extrema importância, vez que o Imposto de Renda Pessoa Física incide de forma diversa sobre os rendimentos e os ganhos de capital.

Assim, para efeitos da tributação pelo Imposto de Renda no direito brasileiro, podemos dizer que se considera rendimento qualquer remuneração do capital investido pela pessoa física em aplicações de natureza financeira, tais como a aquisição de um certificado de depósito ou de quotas de um fundo de investimento no exterior.

De outro turno, considera-se ganho de capital a diferença positiva entre o valor do resgate da aplicação financeira e o seu valor original.

Como veremos mais adiante, para efeitos de cálculo do ganho de capital, existe uma diferença substancial entre os bens ou direitos adquiridos originariamente em reais e os bens ou direitos adquiridos originariamente em moeda estrangeira.

II – tributação do ganho de capital (resgate das quotas de um fundo de investimento)

Como mencionamos acima, há, no direito brasileiro, uma diferença no tratamento tributário da renda decorrente dos rendimentos auferidos pela pessoa física em decorrência de uma aplicação financeira mantida no exterior e da renda decorrente do ganho de capital verificado no momento do resgate dessa mesma aplicação financeira.

Primeiramente, analisaremos a tributação do ganho de capital nas aplicações em fundos de investimento no exterior, diferenciando os casos em que o investimento é realizado com rendimentos auferidos originariamente em reais e os casos em que o investimento é realizado com rendimentos auferidos originariamente em moeda estrangeira.

Para melhor demonstrarmos a forma como se dá a tributação utilizaremos, como exemplo, a seguinte situação: uma pessoa física, residente e domiciliada no Brasil, envia para aplicação financeira no exterior a importância de R$100.000,00, que corresponde, na data da aplicação, a US$50,000.00. Com esse valor, a pessoa física adquire 50 quotas de um fundo de investimento no exterior, sendo que cada quota tem o valor de US$1,000.00. Assim, a pessoa física passa a ter 50 quotas de um fundo de investimento no exterior, no valor total de US$50,000.00, tendo utilizado para essa aplicação a importância de R$100.000,00.

a) tributação do ganho de capital no resgate de investimentos realizados com recursos originariamente em reais

De acordo com o disposto no artigo 2º da Instrução Normativa 118, de 27 de dezembro de 2000, o ganho de capital em moeda estrangeira, obtido em decorrência de aplicação de recursos originariamente em reais, ocorrerá no momento do resgate da aplicação financeira e será calculado sobre a variação positiva, em reais, entre o valor resgatado e o valor originalmente aplicado. Portanto, a verificação da existência ou não do ganho de capital e do imposto de renda a ser pago somente ocorrerá no momento do resgate do fundo de investimento, e será correspondente à diferença positiva, em reais, entre o valor resgatado e o valor original da aplicação financeira.

Para a verificação do ganho de capital é necessário o seguinte:

i) se o valor aplicado no exterior for em qualquer outra moeda que não o dólar norte-americano, deve haver a conversão da moeda estrangeira para o dólar pela cotação utilizada pela autoridade emissora da moeda, para a data do pagamento, na aquisição, e para a data do recebimento, no resgate (art. 10, da Instrução Normativa 118, de 20 de dezembro de 2000);

ii) após a obtenção do valor em dólares norte-americanos, deve-se verificar o valor em reais para o cálculo do valor original da aplicação financeira e o valor de seu resgate. De acordo com os parágrafos 1º e 2º, do artigo 2º, da Instrução Normativa 118, de 20 de dezembro de 2000, para a verificação do valor original da aplicação financeira deve haver a conversão dos dólares para reais pela cotação do dólar fixada, para venda, pelo Banco Central do Brasil, para a data do pagamento. Já para a verificação do valor do resgate, deve haver a conversão de dólares para reais pela cotação do dólar fixada, para compra, pelo Banco Central do Brasil, para a data do recebimento da aplicação.

Assim, tendo em vista o exemplo inicial, a pessoa física possui 50 quotas de um fundo de investimento no exterior, no valor de US$1,000.00 cada, adquiridas pelo valor de R$ 100.000,00. É esse o valor originariamente aplicado e o patrimônio mantido pela pessoa física no exterior.

Quando do resgate da aplicação financeira, deve-se verificar qual o valor em dólares das 50 quotas e, após, converter o valor em dólares para reais pela cotação do dólar fixada, para venda, pelo Banco Central, no dia do resgate. Vamos supor que cada uma das quotas do fundo de investimento estrangeiro tenha, na data do resgate, o valor de US$1,100.00. O investidor, ao resgatar as 50 quotas do fundo de investimento, receberá a importância de US$55,000.00. Esse valor em dólares deve ser convertido para reais pela cotação de R$3,00 para cada US$1,00. Portanto, o investidor receberá, em reais, a importância de R$165.000,00, no resgate da aplicação.

O ganho de capital, no nosso exemplo, será de R$65.000,00 e sobre esse valor incidirá a alíquota de 15%, como tributação definitiva, e o imposto devido deverá ser recolhido até o último dia do mês subseqüente ao do resgate da aplicação financeira.

De se observar, no exemplo acima, que a alíquota de 15% relativa ao ganho de capital incidiu tanto sobre a valorização das quotas em dólar, de US$1,000 para US$1,100, como também sobre a variação cambial entre o momento inicial da aplicação, quando US$1.00 valia R$2,00, e o momento do resgate, quando US$1.00 valia R$3,00.

b) tributação do ganho de capital no resgate de investimentos realizados com recursos originariamente em moeda estrangeira

O investimento feito pela pessoa física no exterior poderá gerar rendimentos (dividendos), os quais podem ser imediatamente resgatados pelo investidor ou, o que é mais comum, ser utilizado para aquisição de novas quotas no mesmo fundo de investimento no exterior (analisaremos a tributação dos rendimentos no item III abaixo). Ou seja, os rendimentos ou dividendos são automaticamente aplicados no mesmo fundo de investimento, com a aquisição de novas quotas. Tais aplicações, feitas com o rendimento em moeda estrangeira do fundo de investimento mantido no exterior, mesmo que a aplicação inicial que gerou esses rendimentos tenha sido feita em reais, são consideradas realizadas com recursos originariamente em moeda estrangeira (art. 4º, parágrafo único, da Instrução Normativa 118, de 20 de dezembro de 2000).

Para as quotas adquiridas posteriormente, com recursos provenientes do rendimento em moeda estrangeira gerado pelas quotas do fundo de investimento, o ganho de capital corresponderá à diferença positiva, em dólares norte-americanos, entre o valor resgatado e o valor original da aplicação financeira, convertida para reais pela cotação do dólar fixada, para compra, pelo Banco Central do Brasil, para a data do recebimento (artigo 4º da Instrução Normativa nº 118, de 27 de dezembro de 2000).

A sistemática é a mesma do investimento realizado com recursos originariamente em reais. Assim, a verificação da existência ou não do ganho de capital e do imposto de renda a ser pago somente ocorrerá no momento do resgate do fundo de investimento, e será correspondente à diferença positiva, em dólares, entre o valor resgatado e o valor original da aplicação financeira. Da mesma forma, se o valor aplicado no exterior for em qualquer outra moeda que não o dólar norte-americano, deve haver a conversão da moeda estrangeira para o dólar pela cotação utilizada pela autoridade emissora da moeda, para a data do pagamento, na aquisição, e para a data do recebimento, no resgate (art. 10, da Instrução Normativa 118, de 20 de dezembro de 2000).

A diferença, em dólares, entre o valor original da aplicação e o valor resgatado, convertida para reais pela cotação do dólar fixada, para compra, pelo Banco Central do Brasil, na data do resgate da aplicação, é que será a base de cálculo para a incidência do imposto de renda sobre o ganho de capital à alíquota de 15%.

Assim, novamente tomando como base o exemplo acima, vamos supor que a aplicação original de US$50,000.00, correspondente a 50 quotas do fundo de investimento, gerou um rendimento/dividendo de US$10,000.00, que foi reinvestido/utilizado na aquisição de mais 10 quotas do mesmo fundo de investimento, ainda ao preço de US$1,000.00 cada quota. O valor original do investimento realizado originariamente em moeda estrangeira é, portanto, de US$10,000.00, utilizados para a aquisição de 10 novas quotas do fundo de investimento, no valor de US$1,000.00 cada uma. Vamos supor que, no momento do resgate, essas 10 quotas do fundo de investimento estejam valendo US$1,100.00 cada uma, ou seja, o resgate será de US$11,000.00; nessa situação, o ganho de capital será de US$1,000.00, que deverá ser convertido para reais pela cotação do dólar fixada, para compra, pelo Banco Central do Brasil, na data do resgate da aplicação. Supondo que a cotação seja de R$3,00 para cada US$1,00, o ganho de capital será de R$3.000,00 e sobre esse valor incidirá a alíquota de 15% do Imposto de Renda. Essa tributação é definitiva.

De se observar que para as quotas adquiridas com rendimentos originariamente em moeda estrangeira, como nesse exemplo (lembrando que essas 10 quotas foram adquiridas com os dividendos em dólar gerados pelas 50 quotas originais), o ganho de capital incidiu apenas sobre a valorização em dólar das quotas.

III – tributação dos rendimentos recebidos pelas pessoas físicas em aplicações realizadas em fundos de investimento no exterior

A tributação dos rendimentos (como assim são classificados os dividendos pagos pelos fundos de investimentos) recebidos pelas pessoas físicas decorrentes de aplicações financeiras mantidas no exterior, assim considerada a remuneração em moeda estrangeira do capital investido no exterior, se dá pelo pagamento mensal do carnê-leão. Essa tributação dos rendimentos/dividendos independe de eles serem imediatamente reinvestidos ou reaplicados na aquisição de novas quotas do mesmo ou de outro fundo de investimento.

O investidor deverá, portanto, recolher o carnê-leão, até o último dia útil do mês seguinte ao do recebimento (ou crédito) do rendimento/dividendo, utilizando-se, para o cálculo do imposto, da tabela progressiva mensal vigente no mês do recebimento do rendimento. Para o cálculo do imposto a ser pago, o rendimento em dólares deverá ser convertido para reais pela cotação do dólar fixada, para compra, pelo Banco Central do Brasil para o último dia útil da primeira quinzena do mês anterior ao do recebimento do rendimento (artigo 16 da Instrução Normativa nº 208, de 1º de outubro de 2002). O recolhimento do imposto deverá ocorrer até o último dia do mês subseqüente ao dos rendimentos. A Secretaria da Receita Federal publica mensalmente Atos Declaratórios Cosit com a cotação do dólar que deverá ser utilizada pelo contribuinte para a conversão dos rendimentos recebidos para reais.

Caso o investimento seja feito em outra moeda que não o dólar norte-americano, os rendimentos provenientes de tal fundo, para fins de cálculo do carnê-leão a ser pago, deverão ser convertidos, primeiramente, em dólares norte-americanos pelo seu valor fixado pela autoridade monetária do país de origem dos rendimentos, na data do recebimento, e, em seguida, em reais, mediante utilização do valor do dólar fixado para a compra pelo Banco Central do Brasil para o último dia útil da primeira quinzena do mês anterior ao do recebimento do rendimento.

Apenas para exemplificarmos, vamos supor que uma aplicação em um fundo de investimento no exterior gere rendimentos/dividendos de US$1,000.00 por mês. Esse valor deverá ser convertido para reais pelo valor do dólar fixado, para compra, pelo Banco Central do Brasil para o último dia útil da primeira quinzena do mês anterior ao do rendimento. Suponhamos que a cotação do dólar seja de R$3,00 para cada dólar. Assim, o rendimento da pessoa física será de R$3.000,00. Sobre esse valor deverá incidir o imposto de renda, aplicando-se a tabela vigente no momento do recebimento do rendimento. Nesse caso hipotético, a alíquota seria de 27,5% sobre o valor do rendimento (R$3.000,00).

Essa tributação não é definitiva e deverá ser declarada pela pessoa física na Declaração de Ajuste Anual, juntamente com outros valores por ela recebidos, tais como aluguéis de imóveis.

IV – tributação da variação cambial

Diante das explicações acima, podemos concluir que a variação cambial tem impacto apenas no cálculo do ganho de capital proveniente do resgate das quotas de fundo de investimento no exterior adquiridas com valores originariamente em reais. Assim, para os casos de ganho de capital em decorrência de diferença positiva entre o valor original, em reais, utilizado para a aquisição de quotas do fundo de investimento e o valor, em reais, obtido com a venda das mesmas quotas, deve haver o pagamento do imposto de renda sobre o ganho de capital, que também englobará a variação cambial.

Para os casos de ganho de capital em aplicações feitas com recursos originariamente em moeda estrangeira, assim considerados os rendimentos/dividendos obtidos em moeda estrangeira, mesmo que a aplicação original tenha sido feita em reais, a variação cambial não terá qualquer efeito, vez que o ganho de capital no resgate das quotas do fundo de investimento apenas ocorrerá se houver variação positiva entre o valor das quotas, em dólares norte-americanos, no momento de sua aquisição e no momento de seu resgate.

Em conclusão, caso o investimento seja feito em fundo de investimento do exterior que não pague qualquer espécie de rendimento/dividendo, a tributação se resumirá ao ganho de capital decorrente da diferença positiva entre o valor em reais inicialmente investido e o valor em reais obtido com o resgate das quotas, tributação essa que incidirá também automaticamente sobre toda a variação cambial desse período, conforme item II, letra a, acima. Por outro lado, caso o investimento seja feito em um fundo de investimento do exterior que pague ao quotista qualquer espécie de rendimento/dividendo, independentemente de esses dividendos serem reinvestidos ou gastos pelo investidor, a tributação se dará da seguinte forma: a) quanto aos dividendos, deverá o investidor, obrigatoriamente, nos meses do recebimento, calcular o imposto devido (carnê-leão) e efetuar recolhimento do imposto de renda dentro do prazo legal, conforme explicitado no item III acima; b) quanto às quotas adquiridas com os reais originariamente enviados ao exterior, haverá incidência do imposto de renda sobre o ganho de capital decorrente da diferença positiva entre o valor em reais originalmente investido e o valor em reais obtido com o resgate das quotas, conforme item II, letra a, acima; c) quanto às quotas adquiridas com os dividendos em dólar pagos pelo fundo, haverá incidência do imposto de renda sobre o ganho de capital decorrente da variação positiva, no momento do resgate, do valor das quotas em dólar, conforme item II, letra b, acima.
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* Advogado do escritório Boccuzzi Advogados Associados









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