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Brasil e o troféu mundial da violência e corrupção: alguns indicadores “preocupantes”

Temos enfatizado que o Brasil é um forte candidato à conquista do troféu de país mais violento e corrupto do mundo. Desde o ano 1500 muita energia vem sendo gasta nesse sentido.

20/2/2008


Brasil e o troféu mundial da violência e corrupção: alguns indicadores "preocupantes"

Luiz Flávio Gomes*

Temos enfatizado que o Brasil é um forte candidato à conquista do troféu de país mais violento e corrupto do mundo. Desde o ano 1500 muita energia vem sendo gasta nesse sentido. O ano 2007, entretanto, do ponto de vista macroeconômico, revelou alguns indicadores "perturbadores". Vão atrapalhar (um pouco) a corrida brasileira ao citado troféu, mas, de qualquer modo, não chegam a nos tirar (inteiramente) do páreo, porque nossos "fundamentos pró-desordem e não-progresso" (seculares) são muito "sólidos".

Vejamos, em primeiro lugar, os números "perturbadores": nosso PIB cresceu cerca de 5,2% em 2007 (a previsão era de 4,7%). A Bovespa subiu 43,65% - 44 recordes no ano, com presença massiva de investidores estrangeiros. O desemprego está no menor nível desde 2002 (8,2%): muitos setores não estão encontrando mão-de-obra qualificada. Os indicadores de crédito estão estourando, o que significa crença na estabilidade econômica. No item petróleo a notícia não poderia ser mais "estarrecedora": o megacampo Tupi - bacia de Santos pode levar o Brasil a fazer parte da Opep, aumentando suas reservas para mais de 22 bilhões de barris. O etanol virou uma coqueluche mundial (19,5 bilhões de litros de álcool produzidos em 2007), porque o mundo todo (finalmente) está tomando consciência da necessidade do equilíbrio ambiental (ou seja: da sustentabilidade do planeta).

As notícias latino-americanas, por seu turno, não poderiam ser mais "exóticas". Três documentos publicados recentemente (última edição do Latinobarômetro, balanço da CEPAL - Comissão Econômica para a América Latina - assim como seu Panorama Social da América Latina) e analisados por José Juan Ruiz (El País de 23/12/07, Negocios, p. 2) dão conta do seguinte: a democracia está se consolidando na nossa região, houve crescimento com estabilidade econômica e a pobreza foi reduzida.

Um total de 72% dos latino-americanos afirmam que a democracia é a melhor forma de governo (a vitória do "não" na Venezuela no dia 3/12/07 pode ser um sinal seguro dessa pesquisa). O crescimento econômico da região (constante nos últimos quatro anos) não se via desde 1970 (em 2007 foi de 5,6%). Entre 2002 e 2007 o percentual de pobres caiu 8,9%: 31 milhões de pessoas saíram do estágio de miséria absoluta.

No Estado de São Paulo o número de assassinatos reduziu em 69% (de 36 passamos para 11, para cada 100.000 habitantes). Rio de Janeiro continua da faixa dos 39 e a média brasileira gira em torno de 22 mortes para cada 100.000 pessoas. Latrocínios caíram de 670 (em 1999) para 166 (em 2007). Roubos de 219.654 para 165 mil. Roubo de veículos: de 104 mil para 50 mil. O mais inacreditável: no dia 7 de dezembro de 2007 não teria ocorrido nenhum homicídio na cidade de São Paulo. É difícil acreditar na veracidade deste dado, de qualquer modo isso não se via desde 1950 (Veja de 19/12/07, p. 114).

Apesar desses indicadores, o item segurança pública, por exemplo, por tudo que fazemos de "correto" na área, reabilita a "candidatura" do Brasil em qualquer momento. Resumidamente, há dois grandes modelos de segurança pública: um policial militarista e outro social. O primeiro é repressivo e acredita em mais policiais, mais prisões, mais condenações etc. O segundo é preventivo e joga suas forças na reforma social, inclusão dos excluídos, ressocialização do preso etc. (prevenção primária, secundária e terciária).

O mundo especializado sabe que o melhor caminho consiste em conciliar os dois, desenvolvendo-se uma política integrada de segurança, com respeito ao Estado constitucional de Direito. Mas praticamente o planeta inteiro (incluindo o Brasil, portanto) vem fazendo clara opção pelo modelo militarizado de segurança (cf. Brandariz García, J. Ángel, Política criminal de la exclusión, Estúdios de Derecho penal y Criminologia, dir. de C. M. Romeo Casabona, Granada: Comares, 2007).

O declínio do Estado de Bem-Estar social, frente ao neoliberalismo, é mais do que notório. Entrou em crise, conseqüentemente, a ideologia da ressocialização. De uma sociedade disciplinar (desenhada por Foucault) passamos a respirar uma sociedade de controle que, partindo da premissa da impossibilidade de se reduzir a criminalidade, só se preocupa em gerenciar os inimigos do sistema (terroristas, imigrantes, excluídos sociais etc.), visando a transmitir uma boa sensação de segurança.

Os recursos são escassos, logo, devem ser dirigidos contra os inimigos mais perturbadores, que são os eleitos para encher as prisões cada vez mais superlotadas. E tudo se desenvolve sob um regime político-jurídico de exceção, que significa mais liberdade de atuação para a polícia e para o Executivo, em detrimento da fiscalização e censura judicial (que está brilhando, neste século XXI, pela sua ausência). Esse é o quadro político-criminal vigente no mundo atual. O Brasil dele faz parte. Não estão em pauta as raízes do problema da violência. Isso já foi amplamente diagnosticado, mas nenhuma política nacional integrada ainda foi posta em prática (no nosso país).

De todo exposto emerge o seguinte: o Brasil é um grande paradoxo. Macroeconomicamente está indo bem. Microssocialmente anda muito mal. Em outras palavras: o Brasil vai bem, os brasileiros nem tanto. De cada 10 cartas enviadas pelas crianças recifenses aos Correios no natal de 2007, seis pediam comida no lugar de brinquedos. Foram 10.000 cartas enviadas: 6.000 diziam que elas freqüentemente não têm o que comer, o que deixa seus pais muito tristes ! (El País de 26/12/07, p. 7).

O Brasil está crescendo, mas menos que outras nações emergentes (Índia, China, Rússia etc.). Menos também que muitos países sulamericanos (Panamá 9,5%, Argentina 8,6%, Venezuela 8,5%, Peru 8,2% etc.). Com uma camada dirigente colonialista, estamental, tendencialmente corrupta, escravagista e senzaleira, a distribuição de renda continua demasiadamente injusta. São sete milhões de crianças sem escolarização e socialização. No item educação ele ocupa um dos últimos lugares do mundo. Na questão saúde são milhões de pessoas que não conseguem ser atendidas pelo SUS. O tráfico de drogas nunca foi controlado, o processo de favelização é intenso (carecemos de oito milhões de moradias), a carga tributária gira ao redor de 36% do PIB e a corrupção é estrondosa, como vêm revelando as perturbadoras operações da Polícia Federal. Mas continua impune (nosso Congresso Nacional que o diga).

Conclusão: "apesar" de todos os macro-indicadores descritos, talvez seja muito precipitado supor que o Brasil já esteja "desclassificado" na sua corrida rumo à conquista do troféu de país mais violento e corrupto do mundo. Seus seculares "fundamentos" (pró-desordem e não-progresso) nas áreas da educação, saúde, infra-estrutura, Justiça etc. continuam muito "sólidos". Avante Brasil ! Você chega lá !

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Fundador e Coordenador Geral da Rede de Ensino Luiz Flávio Gomes







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