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Proteção do emprego contra despedida

A Convenção 158 da OIT assinada em Genebra em 22.6.82, que disciplina o término do contrato de trabalho por iniciativa do empregador, vigorou no Brasil por força do Decreto n°. 1855, de 10.4.96, que a ratificou. Já no ano seguinte, deixou de vigorar por força do Decreto nº. 2100, de 20.12.97 que a denunciou.

12/12/2007


Proteção do emprego contra despedida: promessa inoportuna de Lula para Janeiro de 2008

Marco Antonio Aparecido de Lima*

A Convenção 158 da OIT assinada em Genebra em 22.6.82, que disciplina o término do contrato de trabalho por iniciativa do empregador, vigorou no Brasil por força do Decreto n°. 1.855 (clique aqui), de 10.4.96, que a ratificou. Já no ano seguinte, deixou de vigorar por força do Decreto nº. 2.100 (clique aqui), de 20.12.96 que a denunciou.

A denúncia da Convenção 158 pelo Decreto n°. 2.100/96 ocorreu depois de acirrado debate, tendo a Confederação Nacional da Indústria, naquela oportunidade, ingressado junto ao Supremo Tribunal Federal com Ação Direta de Inconstitucionalidade. A ação veio a ser extinta pelo Ministro Relator do processo, antes de julgado o mérito, considerando a denúncia da Convenção pelo Governo brasileiro.

Pois agora o tema volta fortemente ao debate, considerando a promessa do Presidente Lula aos representantes das centrais sindicais de que em janeiro de 2008 deverá ratificar a Convenção 158 da OIT, editando novo decreto que determine a execução da convenção no país, mandando ao Congresso projeto de lei que proteja o trabalhador da despedida arbitrária ou sem justo motivo.

Vamos recordar o principal conteúdo da Convenção 158 da OIT:

a) Estabelece a convenção que se deverá dar efeito às suas disposições através da legislação nacional, que podem ser aplicadas, também, por instrumentos ou sentenças normativas de caráter coletivo, e que não se dará término à relação de trabalho de um trabalhador, "a menos que exista para isso uma causa justificada relacionada com sua capacidade ou seu comportamento ou baseada nas necessidades de funcionamento da empresa, estabelecimento ou serviço";

b) A mesma convenção prevê que antes da rescisão do contrato por justo motivo deve o empregador oportunizar ao empregado a possibilidade de se defender das acusações lançadas contra ele, com direito a recorrer da decisão patronal perante um organismo neutro, como um tribunal, junta de arbitragem ou um árbitro. Caracterizada a demissão imotivada, o empregado deverá ser readmitido, ou receber indenização na hipótese de impossibilidade da readmissão;

c) Até mesmo na hipótese de o empregador pretender rescindir contratos de trabalho por motivos admitidos pela Convenção 158, quais sejam, econômicos, tecnológicos, estruturais ou análogos, deverá ser oportunizada às entidades sindicais representativas dos empregados e às autoridades administrativas, a informação sobre os motivos determinantes das rescisões e o período durante o qual seriam efetuadas. Admitida a possibilidade de demissão do trabalhador pela ocorrência dos motivos acima referidos, garantir-se-á a consulta aos interessados sobre as medidas que poderão ser adotadas para evitar ou limitar as rescisões contratuais, bem como para atenuar as conseqüências, como, por exemplo, através de recolocação dos demitidos.

O argumento social que o movimento sindical vem utilizando, já há algum tempo, inclusive nas negociações salariais em 2007, e nas últimas "marchas a Brasília" é de que as empresas, com alegada facilidade em demitir, vêm auferindo ganhos com a substituição de trabalhadores mais antigos por mais novos, que acabam recebendo salários bem inferiores, reduzindo a chamada "massa salarial".

Registre-se que essa afirmação do movimento sindical não tem base científica segura, pois calcada em levantamentos genéricos que não acompanham a história salarial de cada trabalhador admitido e sua evolução dentro da empresa. Além disso, o princípio da isonomia que rege os contratos de trabalho não permite esse procedimento que, se fosse levado a efeito conforme essa tese simplista das centrais sindicais, esbarraria nas equiparações salariais.

Ora, acrescer novos entraves à rescisão de contratos de trabalho no momento em que o país precisa apresentar níveis ao menos razoáveis de competitividade, não nos parece uma boa solução. Além disso, não há hoje na esfera administrativa ou judicial a necessária sensibilidade jurídico-social para considerar não somente a preservação de contratos de trabalho, mas também a preservação da própria empresa, sua competitividade e a justa retribuição ao investimento, como elementos essenciais para a geração de novos empregos, riqueza e arrecadação de impostos.

O empregador não demite para fazer uma tola e inexpressiva economia em mão-de-obra; seria uma insensatez admitir trabalhadores de menor salário, para demitir empregados experientes, nos quais a empresa investiu em formação e aperfeiçoamento. A empresa demite apenas quando é necessário para manter o necessário equilíbrio financeiro ou produtivo ou disciplinar, que por suas várias facetas não permite um regramento inibidor. Tirar da empresa essa dinâmica, com intervenção direta do Estado e dos órgãos de representação de trabalhadores, sem que estes tenham motivação para considerar o outro lado da questão, certamente não trará benefícios ao país, e contribuirá para o crescimento da informalidade e da terceirização.

Do ponto de vista jurídico, vamos recordar que a Constituição Federal (clique aqui) prevê a proteção contra a despedida arbitrária na forma da lei, conforme estabelece o artigo 7º, inciso I, que garante "relação de emprego protegida contra a despedida arbitrária ou sem justa causa, nos termos de lei complementar, que preverá indenização compensatória, dentre outros direitos".

Embora não editada a mencionada lei complementar pelo Congresso Nacional, a legislação nacional mantém como garantia provisória contra a demissão imotivada a multa de 40% incidente sobre o montante do FGTS do trabalhador, conforme artigo n°. 10, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. Além disso, garante aviso prévio, seguro-desemprego, garantia de emprego à gestante, dirigentes sindicais, integrantes das CIPAs, empregado acidentado, bem como outras situações especiais previstas em inúmeros instrumentos normativos, razão pela qual não estão os trabalhadores desprotegidos como alegam as centrais sindicais.

De qualquer forma, a legislação nacional não se compatibiliza, formalmente, com uma pretensa auto-aplicabilidade da Convenção 158 da OIT, como destacado na ADIN ajuizada pela Confederação Nacional da Indústria, considerando que a Constituição Federal já prevê a edição de lei complementar para disciplinar o tema. Ademais, além dessa inconstitucionalidade formal, haveria insanável inconstitucionalidade material, como apontou a CNI naquela ação, porque a Convenção confere ao juiz a competência para decretar a nulidade do término da relação de emprego, enquanto a Constituição Federal assegura apenas a indenização compensatória, não excluindo do empregador o direito de demitir o empregado.

Espera-se que não se repita o quadro judicial desolador de 1996/1997 quando, com o advento do Decreto n°. 1.855/96, que ratificara a Convenção 158 da OIT, milhares de reclamações trabalhistas foram afoitamente propostas, buscando a decretação de nulidade de demissões de trabalhadores, sob alegação de a Convenção ser auto-aplicável, gerando decisões favoráveis equivocadas, algumas de cunho fortemente político, impondo uma avalanche de mandados de segurança por parte dos empregadores.

Não é disso que o Brasil necessita agora, até porque não é nenhuma heresia o País não estar alinhado com a Convenção 158 da OIT, já que a maioria dos países também não a ratificou.

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*Advogado do escritório Lima Advogados Associados - Assessoria e Consultoria Jurídica










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