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Reforma Sindical: negociação coletiva priorizada

Vigora no país um debate importante que pode ter profundas implicações no nível de emprego e na distribuição de renda entre os brasileiros.

31/5/2004

 

Reforma Sindical: negociação coletiva priorizada

 

Antônio Carlos Magalhães Leite*

 

Vigora no país um debate importante que pode ter profundas implicações no nível de emprego e na distribuição de renda entre os brasileiros.

 

Grandes especialistas em relações do trabalho como Paulo Pereira da Silva - Presidente da Força Sindical, Ricardo Berzoini - Ministro do Trabalho e Empregado, Artur Santos - Secretário de Organização da CUT, Nildo Masini - Vice-Presidente da Fiesp e José Pastore - Professor da USP, discutem sobre reforma sindical com temas relativos a reforma trabalhista.

 

No final do mês de março, um evento reuniu os nomes citados e, discutiu-se muito a respeito do novo papel da Justiça do Trabalho na solução de conflitos coletivos, bem como, da representatividade sindical.

 

Ao final do encontro saiu uma proposta que, em breve, será encaminhada ao Congresso Nacional, através de um Projeto de Lei, apresentando uma nova forma de composição em que a negociação coletiva é prioritária e o julgamento pela Justiça do Trabalho desaparece, podendo permanecer a presença da arbitragem pública.

 

A reforma sindical busca garantir um sindicalismo representativo, uma negociação coletiva real, efetiva e um sistema de composição de conflitos que sejam adequados a uma sociedade democrática. Na verdade, o que está sendo proposto na reforma sindical, é que deixa de existir a figura do poder normativo como temos hoje, em que o Tribunal pode fixar normas, passando a haver uma arbitragem pública, quando necessário. Isso devolve à Justiça do Trabalho a sua competência precípua que é garantir uma boa prestação jurisdicional em relação aos conflitos de natureza individual.

 

Fica claro que os trabalhadores, através de seus representantes, buscam na reforma sindical preponderante o fortalecimento, para depois discutir a tão necessária reforma trabalhista. De outra parte, a classe empresarial contrapõe pretendendo discutir a reforma sindical em conjunto, por entender que a mesma é um capítulo inserido na reforma trabalhista.

 

Na opinião do professor José Pastore, da USP, o que se pretende realmente com a reforma sindical é a geração de emprego e o fim do emprego informal - parcial e total. Para ele, além da reforma sindical, é preciso atender a três pressupostos essenciais: "crescimento econômico sustentado, boa educação e legislação trabalhista adequada".

 

Difícil discordar. Entretanto, é necessário garantir um sindicalismo com representatividade, o que poderá trazer um ganho essencial para a relação capital e trabalho - o diálogo social -, pois o que se constata atualmente é a marcante presença da intransigência e da intolerância no dia-dia da relação. Havendo diálogo, ou seja, afugentando-se a intransigência e a intolerância, com toda certeza, ocorrerá o crescimento mútuo da relação, bem como, a manutenção e a geração de postos de trabalho.

 

Aliás, muito se ouve e pouco se faz no sentido de se criar mecanismos para a geração de emprego.

 

A promessa de criar 10 milhões de empregos no país fica mais distante sem uma ampla reforma sindical e trabalhista, bem como uma considerável redução dos impostos sobre a folha de salários.

 

O desemprego e a perda do poder aquisitivo redundam no enfraquecimento de negociação dos sindicatos. Na situação econômica em que se encontra o país, a margem para negociação fica muito restrita. As empresas dizem sempre "não posso conceder", "não temos condições de atender", e nada se pode fazer. Os empregados buscam, com base nas perdas do passado, justificativa para conseguir pleitos absurdos.

 

Em tempos de crise econômica, tornam-se necessárias normas flexíveis. Enquanto uma parte tem emprego e é protegida, a outra parte trabalha e está desamparada pela legislação.

 

No setor fiscal, por exemplo, com a flexibilização e a diminuição de tributos, poderá ser resgatada uma quantidade de empresas que estão na clandestinidade, à margem da lei, de maneira total ou parcial, que passariam a gerar divisas para o Estado, emprego para os trabalhadores e, num contexto geral, prosperidade para a nação.

 

De qualquer sorte, é preciso tomar cuidado para não chegar à precariedade do emprego e da informalidade exagerada, pois o empregado deve ter garantias mínimas, asseguradas pela Constituição Federal e pela legislação em vigor, sendo o restante complementado pela negociação coletiva.

 

É preciso lembrar que o sindicalismo atual peca pela falta de representatividade, o que, nas negociações, reforça a tendência à intolerância e à intransigência. A mesma falta de diálogo entre sindicato e empresa, também vigora entre os próprios trabalhadores. Em muitas situações, eles sequer têm o direito de manifestar sobre o seu futuro, já que tudo decidem por eles.

 

Com relação aos recursos financeiros, atualmente os sindicatos dos empregados e dos empregadores se sustentam através do imposto sindical previsto da CLT e das diversas contribuições, por eles aprovadas em assembléias sem nenhuma representatividade.

 

Registre-se que, atualmente, a participação dos empregados nas assembléias é restrita, já que somente é permitida a participação dos associados. O que está sendo proposto, é um sindicalismo com representatividade, pautado na eficiência e na transparência, com o direito do trabalhador decidir o seu futuro, seja ele sindicalizado ou não.

 

Em contrapartida, o sindicato, terá o direito de cobrar, desde que aprovada em assembléia dos empregados, uma única contribuição negocial - de periodicidade anual, vinculada à negociação coletiva, a qual será descontada de todos os trabalhadores beneficiados por instrumento normativo, independentemente de filiação sindical - compatível com o serviço prestado, seja pelo aspecto quantitativo ou qualitativo. Os valores pagos pelos trabalhadores, a título de contribuição negocial, não poderão ultrapassar 1% da remuneração líquida recebida no ano anterior, que será paga em, no mínimo, três parcelas mensais, a partir do mês de abril de cada ano.

 

Consta, ainda, do relatório final da proposta do Fórum Nacional do Trabalho, no que diz respeito a sustentação financeira da Organização Sindical dos Empregadores, que "a contribuição de negociação coletiva, de periodicidade anual, vinculada à negociação coletiva, será devida por todas as empresas ou unidades produtivas sindicalizadas ou não independentemente do número de trabalhadores empregados e do porte da empresa ou unidade produtiva.

 

Ficam isentas do pagamento da contribuição de negociação coletiva as empresas ou unidades produtivas que não tenham empregados constantes da RAIS (RAIS negativa) para execução de suas atividades econômicas, no ano anterior. O valor da contribuição de negociação coletiva será aprovado em Assembléia amplamente convocada pelos Sindicatos.

 

O valor anual a ser pago pelas empresas ou unidades produtivas a título de contribuição de negociação coletiva não poderá ultrapassar o percentual de 0,8% do Capital Social da empresa registrada nas respectivas juntas comercias ou órgãos equivalentes ou o Valor da Terra Nua Tributável (setor rural) declaradas no Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural - ITR, que será fornecido pela Secretaria da Receita Federal com todas as informações cadastrais e econômico-fiscais, ou pelo órgão que vier a substituí-la.

 

O valor mínimo da contribuição de negociação coletiva não será maior que o equivalente a R$ 100,00, reajustado anualmente com base na média dos valores de reajuste salariais concedidos no ano anterior. O valor máximo da contribuição a ser cobrada não poderá ultrapassar 800 vezes o valor mínimo cobrado".

 

A Organização Sindical pede análise própria e mais demorada uma vez que traz alterações extensas, profundas e interessantes.

 

Diz seu próprio texto: "As especificidades da organização sindical, negociação coletiva e sustentação financeira do setor rural serão objeto de negociação específica entre as entidades sindicais de trabalhadores rurais e entidades sindicais de empregadores rurais".

 

Por fim, dentre outras, as mudanças que mais se destacam na proposta, são as seguintes: formação de base de dados e estatísticas trabalhistas; possibilidade de acordos em diferentes níveis; fim da data-base e de dissídios; obrigatoriedade da negociação, sob pena de multa; possibilidade de validades diferentes em cláusulas de um mesmo acordo; fim do julgamento de greve legal ou abusiva; fim de distinção entre trabalhadores e líderes de greves; criação da liberdade sindical; sindicatos poderão manter exclusividade por vontade dos trabalhadores e atendendo critérios; fim das práticas anti-sindicais; fim do imposto sindical e de contribuições compulsórias; criação da contribuição negocial, cobrada quando houver acordo; e, fim do poder normativo da Justiça do Trabalho.

 

Não há dúvida de que a Reforma Sindical proposta pelo Fórum Nacional do Trabalho inspira otimismo. A iniciativa pode representar um grande avanço na relação capital e trabalho, para, no futuro, brindar empregados e empregadores com uma Reforma Trabalhista justa e adequada, visando o aumento da produção com geração de empregos.

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* Advogado do escritório Leite, Tosto e Barros - Advogados Associados

 

 

 

 

 

 

 

 

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