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Pensando a agroenergia: oportunidades e desafios

O país é destaque nas manchetes dos jornais de todo o mundo com a febre dos biocombustíveis made in Brazil. Em recente pronunciamento à Comunidade Européia, o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva declarou que o país conseguiu desenvolver um programa consistente para a utilização de combustíveis renováveis em área restrita do nosso território, sem afetar a produção de alimentos, e que a floresta amazônica não está ameaçada pelo cultivo da cana-de-açúcar, uma vez que o solo e o clima da região da floresta não se prestam a este tipo de cultura.

30/8/2007


Pensando a agroenergia: oportunidades e desafios

Bruno B. Simões Corrêa*

O país é destaque nas manchetes dos jornais de todo o mundo com a febre dos biocombustíveis made in Brazil. Em recente pronunciamento à Comunidade Européia, o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva declarou que o país conseguiu desenvolver um programa consistente para a utilização de combustíveis renováveis em área restrita do nosso território, sem afetar a produção de alimentos, e que a floresta amazônica não está ameaçada pelo cultivo da cana-de-açúcar, uma vez que o solo e o clima da região da floresta não se prestam a este tipo de cultura.

Dois aspectos importantes podem ser retirados dessa declaração do Presidente da República. O primeiro ponto é que o mundo finalmente olha com interesse e atenção para o Brasil e, o segundo, é que os países desenvolvidos, embora confiantes na viabilidade dos combustíveis renováveis, poderão criar diversas restrições se estes representarem uma ameaça às nossas florestas e às áreas de preservação ambiental. Abriu-se uma oportunidade única para o país, mas que gera igualmente responsabilidades perante a comunidade internacional.

Neste sentido, é importante que se dê a devida atenção ao campo, onde está a chave para o sucesso ou o fracasso do país no novo cenário energético, que redesenhará o mapa geopolítico mundial. Não menosprezamos os gargalos logísticos que o país deverá superar, necessários para o desenvolvimento do comércio de commodities mundiais, porém entendemos que a fragilidade do sistema se dará nas relações de natureza agrária, especialmente na obtenção de financiamentos a custos competitivos, na contratação de seguros adequados para as atividades agrícolas, e na precária fiscalização das áreas de proteção ambiental, especialmente nas regiões de fronteira agrícola.

Não obstante a relevância da cadeia produtiva do agronegócio nacional, este setor sempre encontrou dificuldades para se financiar com linhas de crédito competitivas, além de não contar com seguros adequados às atividades agrícolas. Excluindo-se as linhas do crédito rural oficial, a maioria dos produtores sempre enfrentou entraves para captar recursos no mercado financeiro, em razão do risco de crédito a eles atribuído, associado aos riscos inerentes a qualquer atividade agrícola, que impacta, igualmente, na viabilidade econômica do seguro rural.

Embora o Brasil tenha enfrentado o desafio de forma auspiciosa e tenha aprimorado, nos últimos anos, a legislação voltada para o agronegócio, os novos mecanismos de financiamento ainda não amadureceram. A Lei nº. 11.076, de 30 de dezembro de 2004 (clique aqui), que criou o que se convencionou chamar de Novos Títulos do Agronegócio, englobando o Certificado de Depósito Agropecuário, emitido em conjunto com o Warrant Agropecuário - CDA/WA, o Certificado de Direitos Creditórios do Agronegócio - CDCA, a Letra de Crédito do Agronegócio - LCA e o Certificado de Recebíveis do Agronegócio - CRA, ainda é pouco conhecida e explorada.

Deve ser ressaltado que esses títulos criaram enormes oportunidades para os produtores rurais e para as agroindústrias, podendo despertar, igualmente, o interesse das instituições financeiras, diante da possibilidade de maciços investimentos estrangeiros no agronegócio brasileiro. Em vista do quadro que se desenha para os biocombustíveis made in Brazil, os paradigmas e o modo de se fazer negócio no campo devem mudar significativamente, muito embora a estruturação de operações com esses papéis ainda dependa de soluções inovadoras e criativas, para o atendimento das reais necessidades dos produtores rurais e das agroindústrias.

Além dos novos títulos, merece destaque a Cédula de Produto Rural – CPR, emitida por qualquer produtor rural, cooperativas ou associações de produtores, que tenham por objetivo antecipar receitas através da negociação de safra futura. Dentre as vantagens da CPR, ressaltamos a possibilidade de o produtor conciliar as suas necessidades de custeio à emissão deste papel, adequando seu fluxo de caixa às intempéries e necessidades de cada atividade agrícola, bem como a possibilidade de sua utilização como lastro para operações estruturadas com os títulos criados pela Lei nº. 11.076/04.

A CPR pode ser utilizada ainda como instrumento financeiro - a chamada CPR Financeira - que tem como grande diferencial a possibilidade de liquidação através do preço ou índice de preço fixado no próprio papel. Muito embora a CPR tenha tido enorme impulso com a criação da sua versão financeira, a CPR Física ainda é o instrumento mais adequado para as negociações entre os produtores rurais e as agroindústrias, que dependem da aquisição de insumos para a elaboração do seu produto final, como, por exemplo, as usinas de álcool e açúcar, as unidades de produção do biodiesel, as indústrias de papel, celulose e carvão vegetal, entre outras.

Ademais, tantos os novos títulos quanto a CPR admitem a vinculação de garantias, tais como a hipoteca de imóveis rurais e urbanos, o penhor e a alienação fiduciária, conferindo ao produtor a possibilidade de melhorar a classificação do seu crédito e, ao credor, a possibilidade de se resguardar em relação ao inadimplemento do tomador. Ressalte-se, ainda, que os bens vinculados não podem ser penhorados ou seqüestrados por outras dívidas do emitente do título ou do prestador da garantia real, nos termos da lei.

Como visto, além das vantagens enumeradas para a obtenção de financiamento, os produtores rurais conseguem com a emissão desses papéis uma melhor administração de riscos da sua atividade, tendo em vista que suas dívidas passam a estar atreladas a produtos agropecuários, ou a índices de preços dos mesmos. Está superada, portanto, a fase de consolidação do Estatuto da Terra e a dependência do produtor rural em relação ao gerente do seu banco para a obtenção de financiamentos.

Acreditamos firmemente que tais títulos podem representar uma nova revolução no campo, como forma eficaz de financiamento das atividades agropecuárias e agroindustriais. Assim sendo, atingimos um novo grau de profissionalização do agronegócio, que exigirá, além do pleno conhecimento de aspectos técnicos de cada atividade (sempre enfrentados de forma extremamente competente pela EMBRAPA e outras entidades de pesquisa), um profundo conhecimento dos diversos aspectos legais e financeiros inerentes a cada atividade agropecuária e/ou agroindustrial.

É igualmente animador o apoio do Governo ao desenvolvimento do mercado de seguros rurais, faltando, por outro lado, uma política ambiental consistente, com investimentos em recursos humanos e materiais nas estruturas de fiscalização das áreas de preservação ambiental, sobretudo nas regiões de fronteira agrícola. Deve ficar claro que a comunidade internacional cobrará do país uma política inequívoca quanto à preservação ambiental, que, se for negligenciada, terá como conseqüência restrições tarifárias, sanitárias e alfandegárias aos nossos produtos.

Diante das novas perspectivas para o agronegócio e os biocombustíveis, justa é a expectativa de que deverão ser promovidos esforços governamentais para a assinatura de acordos comerciais bilaterais (independente da prioridade dada ao Mercosul e à América Latina), como forma de ampliar a participação dos produtos brasileiros na pauta do comércio exterior de outros países.

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*Advogado especialista <_st13a_personname w:st="on" productid="em Direito Rural">em Direito Rural e Agroenergia, do escritório Mario Oscar Oliveira & Advogados Associados

 

 

 

 

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