Direito real de habitação
Antonio Ivo Aidar*
Em razão do espírito benemerente do instituto agora focalizado, entendemos que o direito postergado, restringe-se unicamente à moradia, não devendo ser entendida a possibilidade do beneficiário vir à locar o imóvel e, muito menos, cedê-lo em regime de comodato.
Com efeito, o nosso Código Civil de 1916 era altamente incoerente quando no § 2º, do artigo 1.611 estipulava que somente o cônjuge, casado pelo regime da comunhão universal de bens seria beneficiário do Direito Real de Habitação. Ora, se a intenção do legislador era proteger o cônjuge sobrevivente, soa como algo paradoxal ver alijado desse benefício, as pessoas casadas pelo regime da Comunhão Parcial e Separação Total de Bens.
A injustiça declinada prende-se ao fato de que o cônjuge supérstite, não casado pelo regime da Comunhão Universal e, que não tenha adquirido bens no curso da união matrimonial, via-se literalmente sem ter onde morar após o falecimento da outra parte no caso do lar conjugal ter sido adquirido pelo falecido, anteriormente à união civil ou a convivência estável.
Outrossim, no período compreendido entre 10 de março de 1996 á 11 de janeiro de 2002, quando entrou em vigência a Lei nº 10.406 (novo Código Civil), existiu uma clara e injusta vantagem para os companheiros em face das pessoas casadas, naquilo que pertine ao Direito Real de Habitação. O parágrafo único, do artigo 7º, da Lei nº 9.278/96, estendeu à todos os cidadãos que viviam em regime de União Estável, o Direito Real de Habilitação, independentemente de conviverem sob o mesmo manto da Comunhão Universal de Bens ou não. Portanto, a lei supra citada representou um avanço nesta questão e ascendeu a luz verde para que o novo Codex estendesse esse benefício à todas pessoas casadas, independentemente do regime de bens adotado. O assunto vertente encontra-se expressamente regulado no Código Civil vigente, no artigo 1.831, que assim determina:
“Ao cônjuge sobrevivente, qualquer que seja o regime de bens, será assegurado sem prejuízo da participação que lhe caiba na herança, o direito real de habitação relativamente ao imóvel destinado à residência da família, desde que seja o único daquela natureza a inventariar.” Somos da opinião de que quando a parte final do texto legal acima elencado fala em garantia ao direito real de habilitação, desde que o bem seja o único daquela natureza a inventariar, entra em conflito com o espirito do instituto, que têm o claro objetivo de proteger o cônjuge sobrevivente e garantir sua estabilidade, independente do espólio possuir outros imóveis da mesma natureza. Dessa maneira, indicamos àqueles que estudam a inserção de emendas ao Novo Código, que suprimam esta parte final do artigo 1.831, retro comentado. Data máxima vênia, o Direito de Família não pode e não deve tolerar dois pesos e duas medidas para uma só situação, sob pena de afrontar o princípio da isonomia que deve prevalecer nas relações jurídicas.
Examinando-se perfunctoriamente o nosso Estatuto Civil, verifica-se que ele manteve um silêncio Olímpico em face do direito real de habilitação dos conviventes. Nesse diapasão, afirmamos com absoluta convicção, que continua vigindo as disposições contidas no § único, do artigo 7º, da Lei nº 9.278/96 que assim preleciona:
“A lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare, quando seja com ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior” Nenhuma das hipóteses supra mencionadas ocorreu com a vigência do nosso Código, restando assim intocáveis as disposições contidas na lei especial.
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* Advogado do escritório Felsberg, Pedretti, Mannrich e Aidar - Advogados e Consultores Legais