O reembolso de despesas entre empresas que não compõem o mesmo grupo econômico gera relevantes debates no âmbito tributário. A controvérsia reside na interpretação da incidência de PIS/Cofins sobre essas operações. Por um lado, a RF trata o tema de forma mais abrangente e, por outro, a doutrina entende que tais valores podem ser entendidos como uma mera recomposição patrimonial que, por sua vez, não se caracteriza como uma hipótese de incidência tributária.
Vale mencionar que, nos termos do art. 195, inciso I, alínea "b", da CF/881, e o art. 1º das leis 10.637/022 e 10.833/033, a base de cálculo do PIS/Cofins é representada pela receita bruta auferida pela pessoa jurídica. Ainda, o art. 110 do CTN4, afirma que os conceitos de direito privado não podem ser alterados pela legislação tributária.
Dessa forma, a receita bruta, enquanto critério de tributação, deve ser interpretada como um ingresso financeiro que se incorpora de forma definitiva ao patrimônio da empresa e, em contrapartida, o reembolso de despesas, que se caracteriza como uma recomposição patrimonial, não preenche tal requisito, uma vez que é destinada a cobrir custos pagos em nome de terceiros.
Essa distinção é essencial para o tratamento tributário, uma vez que apenas valores que configuram receita são objeto de tributação pelo PIS/Cofins. No entanto, segundo o entendimento da RF, toda entrada de receita da empresa deve ser tributada pelo PIS/Cofins, conforme soluções de consulta que disciplinam o tema:
Solução de consulta Disit/SRRF06 77, de 6/7/12
ASSUNTO: Cofins
EMENTA: REGIME NÃO CUMULATIVO. REEMBOLSO DE DESPESAS. INCIDÊNCIA.
Está sujeito à tributação pela Cofins o reembolso de despesas relativas a viagens, transporte, etc., necessárias à execução dos serviços prestados pelo contribuinte, e que, por determinação contratual, devam ser ressarcidas a ele pelos tomadores dos referidos serviços.
DISPOSITIVOS LEGAIS: Lei 10.833/03, arts. 1º e 6º.
Solução de consulta Cosit 247, de 23/5/17
ASSUNTO: CSLL - CONTRIBUIÇÃO SOCIAL SOBRE O LUCRO LÍQUIDO EMENTA: RESULTADO PRESUMIDO. RECEITA BRUTA. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. Para fins de determinação do resultado presumido, a receita bruta da atividade de prestação de serviços compreende o preço do serviço prestado, não importando a denominação que se dê a esse preço ou a parcelas desse preço. Desse modo, custos e despesas faturados ao tomador do serviço devem ser computados como parte do preço de venda e, portanto, integrantes da receita bruta. DISPOSITIVOS LEGAIS: Lei 9.430/96, art. 29, I; lei 9.249/95, art. 20; decreto-lei 1.598/77, art. 12, II.
Solução de consulta Cosit 290, de 13/6/17
ASSUNTO: Contribuição para o PIS/Pasep EMENTA: RESSARCIMENTOS DE CUSTOS E DESPESAS. RECEITA. REGIME NÃO CUMULATIVO. INCIDÊNCIA. A contribuição para o PIS/Pasep apurada no regime não cumulativo incide sobre a receita relativa ao ressarcimento de dispêndios decorrentes de investimentos efetuados em razão de compromissos assumidos na prestação de serviços, mesmo que devam ser ressarcidas por terceiros por determinação contratual, por falta de amparo legal à sua exclusão. DISPOSITIVOS LEGAIS: CF/88, art. 195, inciso I, alínea b, lei 10.637/02, art. 1º, § 1º e § 3º e art. 5º.
Depreende-se que as soluções de consulta acima transcritas reforçam a posição da RF de considerar tributáveis para PIS/Cofins reembolsos de despesas relacionados à prestação de serviços, ainda que previstos contratualmente ampliando o conceito de receita bruta ao abranger ingressos financeiros sem previsão legal expressa de exclusão.
Entretanto, quando há um contrato celebrado entre duas pessoas jurídicas que não integram o mesmo grupo econômico, é imprescindível a análise do contexto das operações que ensejaram a despesa que será reembolsada para que se verifique se a despesa é relacionada à atividade contratada ou razões alheias à atividade-fim, sendo que, na primeira hipótese, é evidente a incidência do PIS/Cofins, enquanto, na segunda, é possível o afastamento da tributação desde que haja o tratamento contábil adequado. Nesse sentido, corrobora a doutrina5:
“(...) Seja como for, nas contratações de serviços é possível que o prestador – para além das obrigações típicas assumidas – também incorra em outros dispêndios por conta e ordem do tomador, no tocante, por exemplo, à contratação de terceiros para que estes forneçam bens ou serviços, mesmo que no contexto da transação original, mas sem com ela se confundir. (...) Consequentemente, dispêndios incorridos pelo prestador em benefício do cliente, que não sejam intrinsecamente vinculados à prestação dos serviços, deverão ser entendidos como “despesas do cliente” e, sua recomposição, como “reembolsos”. (...) Considerando os pontos elencados, resta claro que o fundamento para que um gasto seja considerado como próprio ou do cliente está, eminentemente, na (in)dissociabilidade deste dispêndio em relação à prestação de serviços pactuada. Este ponto pode ser claramente identificado no contexto do contrato firmado entre as partes, por meio da segregação entre o “preço” estipulado – que corresponde à receita esperada, que fará frente aos custos para execução do serviço – e os demais ingressos recebidos. (...)”.
Sendo assim, para que os contribuintes que, recorrentemente, adotam tal prática evitem autuações fiscais, é essencial a implementação de práticas contábeis claras, registrando despesas reembolsáveis como direitos a receber, sem que transitem pelas contas de resultado, o que ajuda a demonstrar que os valores recebidos não configuram receita.
Embora exista controvérsia sobre a tributação de reembolsos, a correta interpretação dos conceitos jurídicos e a aplicação de práticas contábeis rigorosas são capazes de mitigar riscos fiscais e as empresas devem estar preparadas para justificar a natureza da despesa perante o fisco, considerando que a abordagem da RF tende a ser mais abrangente no conceito de receita, ainda que se trate em recomposição patrimonial.
1 “Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios, e das seguintes contribuições sociais:
I - Do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei, incidentes sobre:(...)
b) A receita ou o faturamento;”
2 Art. 1º. A Contribuição para o PIS/Pasep, com a incidência não cumulativa, incide sobre o total das receitas auferidas no mês pela pessoa jurídica, independentemente de sua denominação ou classificação contábil.
3 Art. 1º. A Cofins, com a incidência não cumulativa, incide sobre o total das receitas auferidas no mês pela pessoa jurídica, independentemente de sua denominação ou classificação contábil.
4 Art. 110. A lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou implicitamente, pela CF/88, pelas constituições dos Estados, ou pelas leis orgânicas do Distrito Federal ou dos municípios, para definir ou limitar competências tributárias.
5 Rodrigo Maito da Silveira e Mateus Tiagor Campos, na Revista Direito Tributário Atual (52, ano 40, IBDT).