Introdução
A gestão de atestados médicos no ambiente de trabalho sempre foi uma questão delicada, tanto para empregadores quanto para empregados. A apresentação de atestados falsificados é um problema recorrente, que pode gerar desconfiança e comprometer a relação de trabalho. Em resposta a essa questão, o CFM - Conselho Federal de Medicina lançou a plataforma “Atesta CFM”, uma ferramenta digital inovadora que permite aos empregadores validar a autenticidade dos atestados médicos de forma rápida, segura e eficiente. Este artigo aborda as implicações legais, os benefícios e os desafios dessa plataforma para os empregadores, considerando seu impacto nas relações trabalhistas.
Recentemente, o CFM lançou a plataforma digital “Atesta CFM”, que tem como objetivo facilitar a verificação da autenticidade dos atestados médicos apresentados pelos empregados durante o contrato de trabalho. Entre suas diversas funcionalidades, a plataforma permite que os empregadores possam, com mais eficiência e segurança, confirmar se o atestado fornecido por um empregado é legítimo ou se há indícios de falsificação.
A criação dessa plataforma reflete uma preocupação crescente com a prática, de alguma forma recorrente, de apresentação de atestados médicos falsificados nas relações trabalhistas. A disponibilização dessa ferramenta indica que tal comportamento não é raro no mercado de trabalho, a ponto de o Conselho Federal de Medicina ter se visto na necessidade de intervir, oferecendo uma solução tecnológica. Para os empregadores, isso implica em uma mudança substancial no processo de validação desses documentos, que antes exigiam uma investigação mais demorada e menos segura.
Do ponto de vista jurídico, a falsificação de atestados médicos constitui crime de falsificação de documento público e uso de documento falso, conforme descrito nos arts. 304 e 297 do CP brasileiro. Em termos práticos, ao receber um atestado médico que desperte desconfiança, o empregador precisaria adotar medidas complexas para verificar sua autenticidade. O processo usual envolvia o contato com a unidade de saúde onde o profissional de saúde alegadamente atuava, para confirmar se ele estava, de fato, em exercício no momento da emissão do atestado. No entanto, essa verificação nem sempre era simples: a resposta da instituição de saúde poderia ser demorada, genérica ou até mesmo imprecisa, dificultando a aferição rápida da veracidade do documento.
Com a implementação da plataforma “Atesta CFM”, o cenário de morosidade na validação de atestados médicos parece substancialmente alterado. A plataforma disponibiliza uma forma rápida e eficiente para que os empregadores possam confirmar a autenticidade dos atestados médicos com apenas alguns cliques. Segundo informações fornecidas pelo próprio CFM, a validação é realizada por meio de avançados recursos tecnológicos, como a assinatura digital e a verificação em duas etapas. Esse processo oferece maior segurança jurídica, pois evita que atestados médicos falsificados passem despercebidos.
Vale ressaltar que a falsificação de atestados médicos não é apenas uma infração que pode resultar em consequências penais, mas também configura uma violação grave da confiança que permeia as relações de trabalho. Quando um empregador constata que um atestado é falso, ele tem a prerrogativa de aplicar uma série de medidas disciplinares, inclusive a demissão por justa causa. No caso de falsificação de documentos, o empregado pode ser dispensado por improbidade, conforme o art. 482, “a”, da CLT - Consolidação das Leis do Trabalho, que tipifica a falta grave que justifica a demissão sem aviso prévio ou direito a indenizações.
Outro ponto crucial que gera incerteza no cotidiano das relações de trabalho é a obrigatoriedade de incluir o CID - Classificação Internacional de Doenças nos atestados médicos apresentados pelos empregados. O TST tem uma postura oscilante sobre esse tema. Nos Informativos 114 e 191, o TST considerou nulas cláusulas de convenções ou acordos coletivos que obrigavam a inclusão do CID, argumentando que tal exigência violaria o direito à intimidade e à privacidade do trabalhador, princípios protegidos pela CF/88. Em contrapartida, no Informativo 126, o Tribunal validou uma cláusula de convenção coletiva que obrigava a inserção do CID, alegando que a informação sobre a doença do trabalhador permitiria ao empregador adotar medidas adequadas para o controle de enfermidades recorrentes, o que seria benéfico para a saúde coletiva dentro da empresa.
Diante dessa divergência nas decisões do TST e da falta de uma definição clara, muitos empregadores ficam na dúvida sobre a necessidade ou não de exigir o CID nos atestados médicos apresentados pelos empregados. A plataforma “Atesta CFM” se posiciona claramente sobre o tema: as informações relativas ao CID só serão visíveis ao empregador caso o empregado autorize sua divulgação. Essa cláusula de consentimento oferece uma solução prática e transparente para esse impasse jurídico, permitindo que os empregadores respeitem a privacidade dos trabalhadores, ao mesmo tempo em que têm a possibilidade de monitorar a saúde de sua força de trabalho quando autorizados.
Além da função de validação dos atestados médicos, a plataforma “Atesta CFM” oferece uma série de recursos adicionais que visam otimizar a gestão de documentos médicos dentro das empresas. Entre essas funcionalidades, destaca-se o gerenciamento digital de atestados e o armazenamento seguro desses documentos. Para os empregadores, isso significa uma redução significativa no uso de papel, maior organização e agilidade na conferência e armazenamento de atestados médicos, e uma maior segurança jurídica em relação ao cumprimento das normas trabalhistas.
Além disso, a plataforma “Atesta CFM” oferece esse serviço básico de validação de atestados médicos de forma gratuita, o que torna a adesão uma opção vantajosa para as empresas, especialmente para aquelas que lidam com grandes volumes de documentos médicos. Dado o custo-benefício da plataforma e a simplicidade do processo de cadastro, recomenda-se que os empregadores realizem o cadastro na plataforma, aproveitando as vantagens de uma gestão mais eficiente e segura dos atestados médicos.
Entretanto, convém registrar que em decisão liminar proferida em 04/11/24 nos autos da ação anulatória 1087770-91.2024.4.01.3400 em trâmite 3ª Vara Federal Cível da SJDF, foi determinada a suspensão dos efeitos da resolução CFM 2.382/24, a qual instituía a plataforma Atesta CFM, sob a fundamentação de que o CFM, ao determinar a obrigação de que todos os profissionais médicos utilizem a plataforma, invadiu competência legislativa da União Federal.
Através de nota pública, o CFM já manifestou que irá recorrer da decisão visando a retomada imediata dos efeitos da resolução 2.382/24. Acompanhemos.
Conclusão
A plataforma “Atesta CFM” representa um avanço significativo no modo como os empregadores podem lidar com a verificação de atestados médicos, oferecendo um meio rápido, seguro e prático de garantir a autenticidade dos documentos apresentados pelos empregados. Com recursos avançados de verificação digital e uma série de funcionalidades adicionais, a plataforma não apenas facilita o cumprimento das obrigações legais, mas também protege os empregadores de possíveis fraudes, contribuindo para um ambiente de trabalho mais transparente e organizado.
Uma vez retomados os efeitos da resolução CFM 2.382/24 e, por conseguinte, da plena funcionalidade da plataforma “Atesta CFM”, observada a gratuidade do serviço básico e a eficiência das ferramentas oferecidas, é altamente recomendável que as empresas se cadastrem na plataforma, adotando uma postura mais proativa na gestão dos atestados médicos e no combate a fraudes trabalhistas, ao mesmo tempo em que garantem o respeito à privacidade dos empregados.
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1 https://atestacfm.org.br/index.html