No Brasil, o uso oficial da IA pelo TJ/MG - Tribunal de Justiça de Minas Gerais, para simplificar a comunicação de decisões judiciais, marca uma nova era do Judiciário brasileiro. Na IRDR -tema 91, que trata da obrigatoriedade de consumidores tentarem soluções extrajudiciais antes de ajuizar ações, a IA foi empregada para criar um resumo claro e conciso de uma decisão judicial originalmente complexa.
Tantas inovações tecnológicas transformam a prática jurídica e a relação dos advogados com o conhecimento. A IA, blockchain, e automação na advocacia desafiam advogados a apresentarem aos clientes soluções inovadoras e resultados otimizados.
Ao discutir a mudança de paradigma com a adoção de ferramentas altamente tecnológicas na nova era da advocacia, devemos lembrar, primeiro, como a escrita mudou completamente a maneira como armazenamos e transmitimos conhecimento. Sócrates, reconhecido como o “pai da filosofia”, ao criticar a invenção da escrita, alertava que ela levaria ao esquecimento e ao enfraquecimento da memória humana.
Assim como a escrita mudou a maneira como armazenamos e transmitimos conhecimento, as ferramentas tecnológicas estão alterando a forma como advogados e operadores do Direito pesquisam, analisam e até mesmo argumentam.
Existem ferramentas baseadas em IA, como assistentes jurídicos, softwares de análise de jurisprudência, que oferecem uma capacidade sem precedentes de processar grandes volumes de informações em muito pouco tempo.
Com tantas ferramentas tecnológicas à disposição, o advogado não é mais um mero executor de tarefas burocráticas, mas um estrategista que usa a tecnologia para entregar resultados de forma eficiente.
No Brasil, onde o mercado já enfrenta desafios de saturação e baixa rentabilidade, adaptar-se não é mais uma escolha, mas uma necessidade de sobrevivência para escritórios de advocacia.
Enquanto a IA acelera a produtividade e reduz custos, ela também exige uma reestruturação significativa nos modelos de trabalho e educação.
Quando Sócrates criticou a escrita por temer que ela enfraquecesse a memória e a reflexão humana, seu ponto central era que as ferramentas externas, se não usadas com consciência, podem subjugar aquilo que há de mais humano e essencial em nós: a capacidade de pensar criticamente e agir com propósito.
Cabe ao advogado da nova era o papel ativo de moldar o Direito, interpretá-lo e defendê-lo em sua essência, independentemente das pressões institucionais ou tecnológicas.
A advocacia deve permanecer questionando, resistindo e defendendo os valores que sustentam a sociedade democrática.
A tecnologia, por mais avançada que seja, deve servir como ferramenta para amplificar essa luta, e nunca como algoz do pensamento crítico e da independência.
Renunciar a esse papel crítico é não apenas reduzir a advocacia a um estado burocrático de servidão, mas também trair sua função essencial de ser a voz que questiona o poder, mesmo quando todos os outros escolhem o silêncio.
A advocacia da nova era deve usar as ferramentas tecnológicas para otimizar tarefas repetitivas e melhorar a eficiência, mas não pode substituir a intuição, o julgamento ético e a capacidade humana de interpretar nuances que são fundamentais ao direito.
Na nova era, advogados realizam pesquisas jurídicas em segundos, automatizam revisões de contratos e até preveem tendências de decisões judiciais.
Assim como Sócrates enxergava a escrita como um desafio à memória, podemos ver a tecnologia como um desafio à prática jurídica tradicional. Como a história mostrou, cada transformação traz novas oportunidades.
Enquanto a tecnologia amplia nossa eficiência, cabe a nós advogados sermos um bastião da autonomia e da ética, não um reflexo das forças que visam controlar ou instrumentalizar o Direito.
A IA pode operar de forma independente em muitos aspectos técnicos, mas carece do que nos torna verdadeiramente humanos: a capacidade de discernir o certo do errado em contextos complexos, de adaptar soluções a situações únicas e de perceber as implicações emocionais e sociais de cada decisão.
Afinal, mesmo em um mundo automatizado, a inteligência humana, com sua criatividade, julgamento e empatia, permanece insubstituível. A advocacia da nova, cada vez mais, precisa de soft skills, que são tão importantes quanto dominar ferramentas de automação.