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Diferenças entre LTDA X SA e ao anteprojeto de reforma do CC

O modelo de sociedade limitada no Brasil destaca-se pela simplicidade e flexibilidade, ideal para pequenas e médias empresas, já as anônimas visam grandes negócios e captação ampla.

13/11/2024

Introdução

No cenário jurídico e econômico brasileiro, as sociedades limitadas se consolidaram como a forma societária mais amplamente adotada, devido à sua estrutura simplificada, menores custos de manutenção e flexibilidade de gestão. Estes fatores, somados à dispensa de publicação obrigatória de balanços, tornam esse modelo empresarial atraente para pequenos e médios negócios, que atualmente representam a maior parte das empresas registradas no Brasil. Em contrapartida, as sociedades anônimas, caracterizadas por sua estrutura organizacional mais complexa e adaptada a elevados padrões de governança, são preferidas por grandes corporações que demandam maior transparência e acesso a mecanismos de captação de recursos no mercado de capitais. Este artigo visa analisar as particularidades das sociedades limitadas e das sociedades anônimas, bem como os instrumentos financeiros que influenciam suas operações, a aplicação da legislação supletiva e as recentes evoluções normativas que afetam esses tipos empresariais no Brasil.

Sociedades limitadas e anônimas: Estrutura e características jurídicas

As sociedades limitadas são compostas por quotas sociais, que representam frações do capital social e conferem aos sócios direitos e deveres específicos. Esse formato societário proporciona maior controle sobre a gestão, sendo especialmente adequada para empresas que não têm intenção de captar recursos no mercado de capitais. À medida que uma sociedade limitada cresce e busca expandir suas operações, é comum a sua transformação em sociedade anônima, possibilitando maior acesso à captação de investimentos externos e abertura de capital ao público. A transformação para sociedade anônima traz a vantagem de emissão de ações e maior liquidez, embora exija o cumprimento de normas mais rígidas de transparência e governança.

Dado que a lei das sociedades anônimas (lei 6.404/76) estabelece um arcabouço normativo mais abrangente e detalhado, é frequente que contratos sociais de sociedades limitadas incluam uma cláusula de regência supletiva. Esta cláusula estabelece que, em caso de lacunas ou omissões no contrato social quanto a determinadas matérias, sejam aplicadas, de forma supletiva, as disposições normativas previstas para as sociedades anônimas. Tal mecanismo possibilita a utilização da lei 6.404/76 em situações específicas, desde que estas sejam compatíveis com a estrutura e a natureza jurídica das sociedades limitadas.

Instrumentos financeiros e captação de recursos

Entre os mecanismos exclusivos das sociedades anônimas e, por conseguinte, funcionalmente incompatíveis com a sociedade limitada, estão os valores mobiliários, como ações, debêntures, bônus de subscrição, notas comerciais e títulos de renda fixa, tais como CRA - Certificado de Recebíveis do Agronegócio ou CRI - Certificado de Recebíveis Imobiliários. Por sua natureza de títulos de mercado, esses instrumentos não se coadunam com os fins e propósitos da sociedade limitada e, portanto, não podem ser adotados por essas sociedades.

O mercado de capitais brasileiro, regulado pela CVM - Comissão de Valores Mobiliários, desempenha papel essencial na captação de recursos para empresas por meio de instrumentos financeiros. As sociedades anônimas são as principais emissoras de títulos negociáveis no mercado, o que possibilita uma maior capacidade de atração de investimentos e transparência. Recentemente com a edição da lei do ambiente de negócios em 2021, tornou-se possível que as sociedades limitadas e cooperativas também emitam notas comerciais com cláusula de conversão em quotas, similar às debêntures, oferecendo uma alternativa inovadora para captar recursos e expandir operações sem a necessidade de alteração do formato societário.

Reforma legislativa e perspectivas para o futuro das sociedades limitadas

Um instrumento fundamental para a governança das sociedades limitadas é o acordo de quotistas, o qual garante o alinhamento dos interesses dos sócios e preserva a confidencialidade de estratégias sensíveis, tais como políticas de distribuição de lucros, transferência de participações e mecanismos de resolução de conflitos internos. Embora o CC brasileiro atualmente não contemple esse tipo específico de acordo, a aplicação supletiva da lei das sociedades anônimas tem suprido essa lacuna. O anteprojeto de reforma do CC, contudo, prevê a inclusão de uma disposição específica para permitir a celebração de acordos de sócios em sociedades limitadas, estabelecendo uma base legal autônoma para esse instrumento, sem necessidade de aplicação supletiva às normas das sociedades anônimas. Essa inclusão normativa visa conferir maior segurança jurídica às diretrizes internas e operacionais dessas empresas, fortalecendo sua estrutura de governança.

Diferente das sociedades anônimas, que exigem pluralidade de acionistas salvo no caso das subsidiárias integrais, as sociedades limitadas podem ser constituídas por um único sócio, conforme a recente lei da liberdade econômica, através das sociedades unipessoais. Esse avanço normativo permitiu que tanto pessoas físicas quanto jurídicas constituam sociedades limitadas individualmente, proporcionando maior flexibilidade para o empreendedorismo. O anteprojeto de reforma do CC, entretanto, propõe a constituição de sociedades limitadas unipessoais apenas a pessoas físicas, o que, caso aprovado, exigirá uma regulamentação de transição para adequar as sociedades já constituídas por pessoas jurídicas.

Atualmente, todas as quotas sociais em uma sociedade limitada conferem direitos iguais a seus titulares, incluindo o direito de voto. No entanto, a proposta de reforma do CC visa a introduzir quotas preferenciais com direitos econômicos e políticos diferenciados, seguindo o modelo de ações ordinárias e preferenciais existentes nas sociedades anônimas. Essa medida representa um avanço na diversificação dos direitos políticos e econômicos dos quotistas, permitindo aos investidores uma nova alternativa de participação em empreendimentos em que o seu interesse esteja focado essencialmente nos direitos patrimoniais.

Todavia, essa inovação exige análise cuidadosa para assegurar sua compatibilidade com as normas vigentes, especialmente no que tange ao art. 1.072 do CC, que estabelece que as deliberações societárias devem ser tomadas pela maioria dos votos, contabilizados de acordo com o valor das quotas de cada sócio. Este dispositivo legal, de caráter imperativo, assegura o direito de voto a todos os quotistas; assim, qualquer exclusão ou restrição desse direito seria considerada nula de pleno direito.

Conclusão

O modelo de sociedade limitada no Brasil, amplamente adotado por sua simplicidade e menores custos regulatórios, tem se adaptado para responder às novas demandas do mercado e às exigências de empresas que priorizam autonomia e confidencialidade em suas operações. Reformas legislativas recentes, que permitem a emissão de notas comerciais e consideram a criação de quotas preferenciais, refletem essa evolução, oferecendo alternativas para que as sociedades limitadas possam captar recursos de forma eficiente e atrair investidores, sem a necessidade de conversão para o modelo de sociedade anônima.

Contudo, é fundamental que tais mudanças sejam implementadas com cautela, respeitando as particularidades desse tipo societário. As propostas de reforma do CC representam um avanço importante, mas demandam uma abordagem equilibrada, que garanta a preservação da essência das sociedades limitadas e garanta sua funcionalidade no contexto empresarial brasileiro.

Leonardo Theon de Moraes
Sócio fundador do TM Associados. Advogado, graduado em direito, com ênfase em direito empresarial, pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (2012).

Beatriz Rodrigues da Fonseca
Advogada atuante na área de Fusões e Aquisições no escritório Lacerda Diniz Sena Advogados Membra da Comissão de Direito Societário da OAB/MG (2022-2024) Secretária Geral da Câmara Jurídica da FEDERAMINAS e Vice-Presidente do Conselho Estadual de Direito Comercial da FEDERAMINAS.

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