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A MP 927/20 e os impactos para a classe trabalhista em face aos desmontes da CLT

A evolução histórica das leis trabalhistas no Brasil, desde a Revolução Industrial até a Reforma Trabalhista de 2017 e a MP 927 durante a pandemia.

8/11/2024

1 Intrudução 

A classe trabalhadora, desde sempre vem sendo temas de discussões no que dizem respeito as condições legais que visam garantir os seus direitos.  A História que não deixa mentir:  com o passar dos tempos, a classe dos trabalhadores, comumente, sempre foi explorada por seus empregadores, possibilitando, assim, com que esses se unissem para promoverem manifestações a fim de que os seus patrões pudessem atender as suas reinvindicações.

Esse movimento adquiriu maior hegemonia logo após do apogeu da revolução industrial, final do século XVIII e XIX, originando-se no continente europeu e, posteriormente, nos Estados Unidos. Além de permitir com que a classe trabalhadora se reunisse e formassem sindicatos e leis trabalhistas e organizações sindicais, terminou se expandindo em grande parte do mundo, inclusive no Brasil.

No dia 1º de maio de 1943, foi instituída, no Brasil a consolidação das leis trabalhistas, durante o governo de Getúlio Vargas, que condicionou a classe trabalhadora a ter mais chances de fazerem valer os seus direitos.

Com o passar dos anos, questionou-se a possibilidade de a CLT vir a ser reformulada, em virtude de sua durabilidade, contanto que isso não complicasse a situação da mão de obra.  Esse questionamento perdurou até o governo Dilma Rousseff e terminou não chegando a nenhuma solução. Ademais, o afastamento dela da presidência da república, ocasionado por um processo de impeachment, contribuiu para que esse questionamento fosse levado adiante.

Logo após substituir Dilma Rousseff da presidência da república, Michel Temer retomou priorizou a discussão referente a reformulação da CLT sancionando, no dia 13 de julho de 2017, a lei 13467 que ficou conhecida como reforma trabalhista. Ao mesmo que essa nova legislação permitiu com que fosse reconhecida outras modalidades laborais, como o teletrabalho e o intermitente, deixou várias lacunas que geraram certas contradições e deixaram os trabalhadores em situações bastante comprometedoras.

Em virtude da pandemia ocasionada pelo COVID 19, foi assinada, no dia 22 de março de 2020, a medida provisória 927 cuja finalidade é suspender os contratos de trabalho, possibilitando com que os contratos de trabalhos fossem suspensos. Deixando, dessa forma, a situação do trabalhador mais complicada.

1.2 Objetivos

1.2.1 Objetivo geral

Identificar os impactos causados pela medida provisória 927 a classe trabalhista e os desmontes da CLT

1.2.2  Objetivos específicos  

1.3 Metodologia

Esta pesquisa decorreu de um apanhado bibliográfico que consistem em autores vinculados as áreas trabalhistas por meio de artigos científicos escritos por esses, bem como as legislações que contrapõem o posicionamento desses autores.

O primeiro tópico busca em abordar a origem dos direitos trabalhistas, fazendo uma explanação histórica, fundamentando-se na revolução industrial, até as origens das primeiras reinvindicações dos operários, na Europa e nos Estados Unidos, até chegarem no Brasil e, finalmente, ser sancionada a CLT.  Dentro desse tópico, foram utilizados os materiais de Anderson Cega e Guilherme Tavares, a Constituição Federal, a CLT e o Histórico da 24º Regional do TRT para contar as origens da consolidação das leis trabalhistas no Brasil.

O segundo tópico, consiste em explorar a reforma trabalhista de 2017, tendo como referências bibliográficas a própria lei 13467 e os doutrinadores Claudineia P. F. de Melo, Cleonice P. dos Santos e Daiane Gomes Italia que apontam as contradições apresentadas nessa nova legislação, salientado por Mauricio Gondinho Delgado.  Francisco Armando Costa complementa esse ponto de vista tomando como base o princípio da proteção. Luís José Dezena da Silva, durante a sua nomeação de ministro do TST, contrapõem ponto de vista defendido pelos outros autores.

O último tópico está direcionado a abordar a relação da MP 927 com a COVID 19, analisando os direitos dos trabalhadores estabelecidos por essa em seu artigo 3º. Daniele Silva e Vólia Bonfim salientam que essa MP deveria ser analisada com uma maior profundidade que não deixasse o trabalhador vulnerável.

2. O Processo história da legislação trabalhista no Brasil

A revolução industrial teve origem na Inglaterra, no final do século XVIII e início do século XIX, por meio de um processo de mecanização que garantiu uma produção de longa escala.

O aperfeiçoamento das máquinas implantadas na produção, deixou o a mão de obra em segundo plano, como observaram Anderson Cega e Guilherme Tavares (2012). Resultando, assim, em sucessivas demissões.

Somado a isso, os operários recebiam um salário baixo para trabalharem em fábricas que apresentavam instalações precárias, condicionando-os ao perigo e a salubridade sem que houvesse distinção de gênero, não havendo dispensa entre mulheres e crianças.

A exploração da mão de obra também estava vinculada a falta de limites na jornada de trabalho. De acordo com Anderson Cega e Guilherme Tavares (2012), a jornada de trabalho naquela época, chegava até a 18 horas., sendo que, na maioria das vezes, a jornada terminava com o sol se pondo.

Tais fatores possibilitaram a classe trabalhista se unirem com a finalidade de promoverem um movimento que fizessem valer os seus direitos por meio de um trade unions, desencadeando piquetes que, posteriormente, se expandiram por várias partes do mundo.

Logo após a assinatura da lei aurea, em 1888, que declarou o fim da escravidão negra no Brasil, teve início dos direitos dos trabalhadores bem como os meios para que fossem solucionados os conflitos entre empregadores e empegados. No entanto, isso adquiriu maior hegemonia no início do século XX com a influência de imigrantes.

A partir desse momento, surgiram leis ordinárias que passaram a tratar de trabalho de menores (1891), sindicatos rurais (1903) e urbanos (1907) e férias. Por volta da década de 1930, o então presidente da República, Getúlio Vargas, criou o Ministério do Trabalho, Industria e Comércio, passando, também a expandir decretos sobre profissões, trabalho das mulheres (1932) e salário-mínimo (1936).

Diante desse contexto, Getúlio Vargas promulgou, em 1934, a primeira constituição brasileira que tratava especificamente do Direito do Trabalho, como bem analisam Anderson Cega e Guilherme Tavares (2012).

É a influência do constitucionalismo social, que em nosso país só veio a ser sentida em 1934. Garantia a liberdade sindical (art. 120), isonomia salarial, salário-mínimo, jornada de oito horas de trabalho, proteção do trabalho das mulheres e menores, repouso semanal, férias anuais remuneradas (§12 do art. 121). Cega e Tavares: 2012, p. 7).

Todos esses pontos apesentados nessa Carta Magna terminaram sendo aproveitados, posteriormente, na Constituição de 1937. Vale ressaltar que foi durante o regime do Estado Novo, a Justiça do Trabalho foi concebida com o intuito de solucionar os conflitos entre empregadores e empregados.

De acordo com o TRT da 24ª Região (2013), a Justiça do Trabalho já era um órgão existente, mas ela reportava apenas ao poder Executivo. Somente em 1941, ela passou a fazer parte do Poder Judiciário.

Em consequência disso, o presidente Getúlio Vargas assinou, em 1º de maio de 1943, o Decreto 5452, criando, assim, a consolidação das leis trabalhistas que possibilitou a unificação das leis vigentes no Brasil em prol dos trabalhadores, fazendo valer as relações individuais e coletivas do trabalho, conforme estabelecidas em seu artigo primeiro.

3. A reforma trabalhista EM 2017

A reforma trabalhista vinha sendo questionada, durante o governo de Dilma Rousseff, tendo como proposito uma livre negociação entre empregados e empregadores. Porém, ela só foi levada adiante, quando Michel Temer assumiu a presidência da República.

Naquele momento, o Brasil atravessa uma forte crise econômica que possibilitou o aumento de desemprego, por isso o então presidente da República aderiu a reforma trabalhista que alterasse a CLT.

No dia 13 de julho de 2017, foi sancionada a lei 13467 que ficou popularmente conhecida como a reforma trabalhista. De acordo com o Ministério do Trabalho, essa nova legislação trouxe regras validas tanto para os contratos de trabalhos vigentes, quanto os antigos atuais, conforme observam Claudineia P. F. de Melo, Cleonice P. dos Santos e Daiane Gomes Italia (2018).

As autoras apontam alterações nesse ordenamento jurídico que correspondem a vários aspectos do Direito Trabalhista, como: contratação, férias, jornadas de trabalho, demissão etc., entretanto, elas afirmam que algumas mudanças precisarão ser negociadas entre os empregadores e empregado, seja de forma isolada ou não.

Mauricio Gondinho Delgado (2017) salienta que a razão dessa Reforma encontra-se vinculado ao antigo objetivo da História como ferramenta de desigualdades entre pessoas e grupos sociais pelo qual descaracteriza as ideias apresentadas pela Constituição Federal referente aos direitos fundamentais da pessoa humana na esfera trabalhista, previsto no artigo 7º dessa legislação que correspondem a proteção a despedida arbitrária ou sem justa causa; seguro desemprego, em caso de demissão involuntária; fundo de garantia; trabalho noturno, fundo de garantia; adicional de periculosidade e insalubridade, etc.

Francisco Armando Costa (2019) afirma que a reforma trabalhista viola o princípio da proteção, visto que esse, dentro da Justiça do Trabalho, busca interpretar as regras da legislação trabalhista que coloquem o trabalhador em uma posição mais favorável, visto que esse é a parte mais vulnerável, conforme ele observa:

O trabalhador sempre fora tido como a parte mais frágil da relação jurídica na esfera do Direito Laboral, fato devido ao diminuto poder de barganha com o empregador diante da ameaça de perda do emprego, o que era explorado pelo patrão, suprimindo direitos seus direitos, sem receio quanto a sanções. (Costa, 2019, N.P).

O advento dessa lei, segundo o autor, permitiu com que fosse revisto o antigo conceito previsto na CLT que amparava a mão –de-obra trabalhadora tendo como referência o posicionamento do ministro do TST Luís José Dezena da Silva que durante a sua sabatina, realizada no dia 10 de outubro de 2018, afirmou que a reforma trabalhista não surgiu como forma de prejudicar o empregado, pois ela apresentar um víeis progressista que tem como intuito o desenvolvimento econômico por meio da valorização dos valores do trabalho e também da livre iniciativa. 

Em contrapartida, Francisco Armando Costa (2019) afirma que o Direito está sempre em movimento e as leis trabalhistas têm a finalidade de proteger a parte mais frágil que, nesse caso, é o trabalhador. Por isso, a reforma trabalhista deve ser analisada com mais profundidade, em virtude de suas lacunas existentes.

4. A MP 927 e o covid-19 

No dia 22 de março de 2020, foi editada a medida provisória 927 (MP 927), que estabelece medidas trabalhistas a serem adotadas pelas empresas, de modo a possibilitar o enfrentamento da calamidade pública causada pelo COVID-19.

Dentre as principais medidas apresentadas destacam-se as que se encontram previstas no art. 3º.:

  1. o teletrabalho;
  2. a antecipação de férias individuais;
  3.  a concessão de férias coletivas;
  4. o aproveitamento e a antecipação de feriados;
  5. o banco de horas;
  6. a suspensão de exigências administrativas em segurança e saúde no trabalho;
  7. o direcionamento do trabalhador para qualificação; e
  8. o diferimento do recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - FGTS. 

Além dos empregados regidos pela CLT, essa medida provisória também se tornou aplicável ao empregador terceirizado; trabalhador temporário; o empregado rural e ao empregado doméstico. Esse último, deverá conter os requisitos referentes a jornada de trabalho, banco de horas e férias.

Danielle Silva (2020) afirma que muitas destas medidas já estavam previstas nas leis trabalhistas, sobretudo na CLT. A principal diferença reside nas alterações com relação aos prazos e requisitos para a implementação de cada uma delas, conforme ela observa em relação ao teletrabalho:

Como é na CLT: Para alterar de regime presencial para teletrabalho, é preciso haver mútuo acordo entre as partes (empregado e empregador). Para alterar do teletrabalho para regime presencial, não é necessário o consentimento do empregado, mas deve haver um prazo de 15 dias para adaptação. Em ambos os casos, as alterações devem constar em aditivo contratual.

Como ficou na MP: essas alterações podem ser determinadas pelo empregador, independentemente de concordância do empregado. Além disso, é dispensado o aditivo contratual. (Sllva: 2020, NP.)

De acordo com Vólia Bonfim (2020), essa medida foi adotada com o propósito de   acalmar os ânimos e flexibilizar as relações de trabalho, autorizando uma série de medidas para tentar evitar a extinção de postos de trabalho e de empresas. Todavia, pecou a em relação ao posicionamento do governo que o não prevê uma participação no suporte dos empresários e trabalhadores, com seus recursos públicos. 

Nessas condições, a autora recomenda que seja estabelecida uma análise mais aprofundada e que, consequentemente, permita com que haja uma maior flexibilização referente as regras trabalhistas em cada caso específico.

Conclusão

Não é de hoje que se questiona os direitos dos trabalhadores, por essa razão foi que o então presidente da República, Getúlio Vargas, institui a consolidação das leis trabalhistas. Com o decorrer dos anos, essa legislação vem apresentando pontos que merecem ser revistos e atualizados.

A reforma trabalhista, instituída em 2017, possibilitou com que vários artigos da CLT fossem revogados, na proporção que fossem criados outros. Entretanto, os legisladores, no momento em que a conceberam, se esqueceram de observas alguns detalhes, possibilitando, assim uma certa ambiguidade. E como se isso não fosse o suficiente, o princípio da proteção passou despercebido.

Não é necessário entender a fundo as legislações trabalhistas para compreender que o esse princípio é um dos pilares mais importantes, pois é por intermédio dele que o trabalhador fica condicionado a ter os seus direitos assegurados pela lei.

Somado a isso, a aplicação da MP 927, literalmente, deixou o trabalhador de mão atadas, visto que essa medida permitiu a suspensão do contrato de trabalho sem que fosse garantido nenhum benefício a esse. 

Como o trabalhador sempre foi a parte mais frágil, é preciso que o Poder Legislativo, no momento em que conceberem alguma nova lei, estejam atentos para o princípio da proteção e, desse modo, criei mecanismos para que a legislação trabalhista não o deixe desamparados, como vem ocorrendo, atualmente.

_____

BONFIM, Vólia. Breves Comentários à MP 927/20  e aos Impactos do Covid-19 nas relações de emprego, http://genjuridico.com.br/2020/03/25/mp-927-impactos-do-covid-19/

CEGA, Anderson; TAVARES, Guilherme. História do Direito do Trabalho. Revista Cientifica Eletrônica do Curso de Direito da FAEP, janeiro de 2012. São Paulo.

BRASIL. Constituição Federal,  5 de outubro de 1988, http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm

BRASIL. Consolidação Das leis trabalhistas, 1º de Maio de 1943 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm

CIENTÍFICA ELETRÔNICA DO CURSO DE DIREITO – ISSN: 2358-8551 15º Edição - Janeiro de 2019 – Periódicos Semestral 12 HUGO, Victor, “O Noventa e três” (Quatrevingt-treize), 1874, Paris. MAIOR, Jorge Luiz Souto.

COSTA, Francisco Armando. O princípio da proteção e a reforma trabalhista. https://costaarmando.jusbrasil.com.br/artigos/762556404/o-principio-da-protecao-e-a-reforma-trabalhista?ref=feed

DE MELO, Claudinéia P. F.; DOS SANTOS, Cleonice; ITALIA, Daiane Gomes. Um Estudo Sobre Os Impactos Da reforma trabalhista Para Os Trabalhadores Da Região Paulínia. Faculdade de Paulinia, Curso de Bacharel em Ciencias Contábeis, São Paulo ,2018.

DELGADO, Maurício Gondinho. A reforma trabalhista no Brasil: com os comentários à lei 13.467/2017 / Mauricio Delgado Godinho, Gabriela Neves Delgado. São Paulo, Editora LTr, outubro 2017.

Medida provisória NO. 927, 22 de março de 2020.  http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2020/Mpv/mpv927.htm

SILVA, Danielle. MP 927/2020 e Covid-19: entenda as 8 medidas trabalhistas de enfrentamento da calamidade pública. https://www.direcaoconcursos.com.br/artigos/mp-927-2020-e-coronavirus-saiba-quais-sao-as-8-medidas-trabalhistas-de-enfrentamento-da-calamidade-publica/Tribunal Regional do Trabalho, 24º Região. A História da CLT. https://trt-24.jusbrasil.com.br/noticias/100474551/historia-a-criacao-da-clt

Eric Tadeu do Vale Lima
Advogado e Jornalista, integra a Comissão de Direito de Família e Direito do Trabalho na OAB do Ceará.

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