Migalhas de Peso

Por que muitos produtores estão entrando com a recuperação judicial?

A recuperação judicial no agronegócio brasileiro cresce em 2024, protegendo produtores em crise severa causada por fatores climáticos e econômicos.

29/10/2024

O agronegócio brasileiro enfrenta uma crise sem precedentes, marcada por uma combinação devastadora de fatores econômicos e ambientais. De acordo com dados recentes do Serasa Experian, os pedidos de recuperação judicial por parte de produtores rurais cresceram 523.53% em 2024. Esse aumento expressivo reflete o impacto profundo que a crise tem causado no setor, levando muitos a buscar proteção jurídica para evitar a falência.

Em 2024, a safra de soja e milho registrou o maior prejuízo em 25 anos, conforme relatado por Mauro Osaki, pesquisador do Cepea - Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada. O fenômeno climático El Niño, que ocorreu em 2023, intensificou ainda mais as adversidades, contribuindo para a queda na produtividade e o aumento dos custos. Além disso, a redução nos preços das commodities, aliada aos custos de produção em alta, tem pressionado severamente as margens de lucro dos produtores.

Produtores rurais em dificuldades: As razões por trás do aumento nos pedidos de RJ

Com o cenário adverso, muitos produtores rurais têm encontrado na recuperação judicial uma saída estratégica para reestruturar suas dívidas e garantir a continuidade de suas operações. Devido à crise, o produtor rural está de mãos atadas, e para muitos a RJ está servindo como um instrumento legítimo para não sair da atividade. De forma que o produtor rural possa pagar todas as suas dívidas com a sua produção e não com seus bens.

Além disso, o produtor rural recorre à recuperação judicial porque o faturamento líquido anual não está sendo suficiente para cobrir todas as suas obrigações financeiras. Muitos enfrentam dívidas milionárias, o que dificulta ainda mais a resolução dos passivos financeiros.

Proteção do patrimônio: alternativas em meio à crise

A recuperação judicial é um processo legal que oferece ao produtor rural altamente endividado a oportunidade de reestruturar suas dívidas, protegendo seu patrimônio e garantindo a continuidade de suas atividades. Diferente de outras formas de renegociação, a RJ blinda o patrimônio do produtor contra cobranças judiciais e arrestos, permitindo a celebração de acordos com prazos de carência, descontos e parcelamentos favoráveis.

Em um cenário onde bancos muitas vezes impõem juros exorbitantes de até 40% ao ano, a recuperação judicial pode trazer um alívio significativo. Instituições financeiras costumam oferecer condições mais favoráveis aos produtores em RJ, como prazos de pagamento de até 15 anos com juros de 6% ao ano.

O produtor rural entra em RJ para conseguir quais benefícios? 

Embora muitos considerem essas medidas como "benefícios", é fundamental compreender que não se trata de privilégios, mas de procedimentos padrão dentro de um processo legal. O objetivo principal de uma recuperação judicial, é "recuperar o produtor rural, evitando sua falência”. No entanto, por se tratar de um processo judicial, as concessões podem variar. Com base em nossa vasta experiência em reestruturações financeiras de produtores rurais, observamos que, normalmente, ao buscar essa alternativa, o produtor consegue assegurar algumas proteções:

  1. Congelamento de Juros e correção monetária: Até 1 ano sem acréscimos sobre o montante da dívida.
  2. Descontos significativos: Redução de até 20% sobre o total das dívidas.
  3. Carência para pagamento: 2 anos de carência antes do início das parcelas.
  4. Prazo estendido: De 10 a 15 anos para quitação das dívidas parceladas.
  5. Proteção do patrimônio: Blindagem contra penhoras e arrestos sobre bens e ativos financeiros.

O que acontece durante a recuperação judicial?

Durante o processo de recuperação judicial, todos os processos de cobrança são paralisados, e novas ações de cobrança são proibidas por até 1 ano. Isso inclui a suspensão de buscas e apreensões de máquinas agrícolas e operações de barter com grãos.

Outro ponto relevante é que o administrador judicial não interfere na gestão da fazenda. O produtor continua a administrar seu negócio, podendo comprar ou vender imóveis, fazer novos contratos de arrendamento, e até mesmo contrair novos empréstimos, desde que demonstre a viabilidade das operações ao juiz.

A recuperação judicial, quando utilizada de maneira estratégica, pode ser a diferença entre a falência e a recuperação de um negócio rural. Para o produtor rural que está enfrentando dificuldades financeiras, quanto mais cedo procurar orientação jurídica, melhores são as chances de reorganizar suas finanças e garantir a continuidade de suas atividades.

A crise que assola o agronegócio brasileiro tem forçado muitos produtores rurais a buscarem alternativas para evitar a falência, e a recuperação judicial tem se mostrado uma das ferramentas mais eficazes nesse cenário. O aumento de 523.53% nos pedidos de RJ em 2024 evidencia a gravidade da situação e a urgência com que os produtores estão agindo para proteger seu patrimônio e manter suas operações em andamento.

Portanto, é fundamental que os produtores rurais reconheçam a importância de agir rapidamente e buscar a orientação jurídica adequada. A recuperação judicial não deve ser vista como uma última tentativa desesperada, mas como uma estratégia legítima e planejada para garantir que o legado do trabalho árduo e da produção rural não seja perdido, mas sim preservado e fortalecido para o futuro.

Leandro Marmo
Advogado especialista em Direito do Agronegócio, professor da pós-graduação de Direito do Agronegócio da PUC-PR, autor de obra jurídica.

Veja mais no portal
cadastre-se, comente, saiba mais

Artigos Mais Lidos

Afinal, quando serão pagos os precatórios Federais em 2025?

19/12/2024

Atualização do Código Civil e as regras de correção monetária e juros para inadimplência

19/12/2024

5 perguntas e respostas sobre as férias coletivas

19/12/2024

A política de concessão de veículos a funcionários e a tributação previdenciária

19/12/2024

Julgamento do Tema repetitivo 1.101/STJ: Responsabilidade dos bancos na indicação do termo final dos juros remuneratórios

19/12/2024