A recente RDC - Resolução da Diretoria Colegiada 885, publicada pela ANVISA, tem gerado grande preocupação entre especialistas, advogados e defensores dos direitos dos consumidores. A medida, que introduz um projeto-piloto para a digitalização das bulas de medicamentos permitindo a dispensa opcional da versão impressa dentro da caixa, é alvo de críticas de órgãos de defesa do consumidor por potencialmente limitar o acesso à informação em um país marcado por desigualdades socioeconômicas e exclusão digital.
De acordo com o advogado Alexandre de Morais, coordenador do movimento Exija Bula, a proposta traz riscos à segurança da população, principalmente entre os grupos mais vulneráveis, como idosos, pessoas com deficiência e cidadãos de baixa renda. Segundo ele, o projeto pode evoluir para a eliminação total da bula impressa em medicamentos, substituindo-a pela versão digital sem que a população esteja preparada para essa transição. Nem mesmo em países desenvolvidos a bula impressa foi eliminada, então por que o Brasil deveria seguir esse caminho?
Um dos principais pontos de crítica é a exclusão digital que pode ser agravada pela medida. Segundo dados recentes, mais de 80% da população, conforme pesquisa do Instituto DataFolha, deseja a manutenção da bula impressa dentro da caixa dos medicamentos. Essa insistência da ANVISA vai na contramão do que foi levantado durante a Consulta Pública realizada pela própria agência, com resultados semelhantes à enquete do DataFolha, o que coloca em dúvida o compromisso com os interesses da população.
Outro ponto de preocupação levantado por especialistas é o impacto dessa medida no SNCM - Sistema Nacional de Controle de Medicamentos. A RDC prevê a revogação de artigos da lei 11.903/09, que estabelece diretrizes para a rastreabilidade e o controle dos medicamentos no Brasil. Isso representa um retrocesso em termos de segurança e fiscalização dos remédios, afetando diretamente a saúde pública.
O projeto-piloto inclui também medicamentos fornecidos em amostras grátis, por estabelecimentos de saúde e pelo SUS, o que gera questionamentos sobre a desigualdade no acesso à informação. Por que os consumidores que recebem medicamentos pelo SUS ou em amostras grátis teriam menos direito à informação do que aqueles que compram medicamentos em farmácias?
Diante dessas preocupações, o movimento Exija Bula faz um apelo urgente para que a RDC 885/24 seja revista. O direito à informação sobre os medicamentos é um direito básico do consumidor e não pode ser comprometido em nome de interesses econômicos.