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Da possibilidade de conversão do procedimento de tomada de decisão apoiada em interdição – Quando o limite é atingido e o procedimento mais gravoso se torna necessário

A lei de Inclusão fortalece a autonomia das pessoas com deficiência, permitindo a tomada de decisão apoiada e garantindo proteção e dignidade.

26/9/2024

As alterações legislativas introduzidas pela lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (lei 13.146/15), em especial a previsão de que os absolutamente incapazes são apenas os menores de 16 anos, e também o procedimento de Tomada de Decisão Apoiada, indicam, a partir de uma interpretação teleológica, que a autonomia  das pessoas com algum grau de deficiência, em especial quando se está falando de indivíduos que embora estejam acometidos de deficiência intelectual (déficit cognitivo) e/ou de deficiência mental, deve ser o máximo possível preservada. Isso porque possuem certo grau de capacidade de compreensão dos seus atos (incapacidade relativa), de maneira que, a princípio, o processo de interdição, por ser opção mais drástica, pode ser visto como ato violador dos direitos dessas pessoas, que se sentem colocados em uma posição de inferioridade e de limitação no exercício da capacidade social. Justamente por tal razão, viu-se a necessidade de criação de um novo procedimento que, em sua essência, fosse mais brando, embora garantisse a mesma proteção que o procedimento de interdição avaliza. 

O processo de TDA - Tomada de Decisão Apoiada visa garantir o devido apoio à pessoa com algum grau de dificuldade cognitiva em suas decisões sobre atos da vida civil, buscando preservar que tais indivíduos terão todos os dados e informações necessárias para o pleno exercício de seus direitos e obrigações, ou seja, visou garantir segurança para àqueles que ainda preservam certo grau de capacidade e autonomia para a gestão de seus atos. 

A TDA é indicada nos casos em que o interessado é capaz de manifestar a sua vontade, e que preserva relativo grau de autonomia, mas já apresenta alguma dificuldade para conduzir sozinho determinados atos da vida civil, seja em decorrência de uma doença neurodegenerativa (como o Mal de Alzheimer), ou ainda por conta de uma deficiência intelectual.

Trata-se de um procedimento de jurisdição voluntária, no qual a própria pessoa com deficiência indica quem serão os nomeados a exercer o papel de apoiadores, garantindo que sejam apontadas pessoas de confiança do relativamente incapaz. Nesse aspecto, a lei prevê que a única pessoa que pode ajuizar a ação de tomada de decisão apoiada e indicar os apoiadores é o próprio interessado, ou seja, a pessoa que será apoiada (§2º do art. 1.783-A do CC), diferenciando-se da interdição, cujo rol é mais ampliativo no que tange aos legitimados. Somente até aqui já é possível perceber uma grande diferença no que concerne ao processo de interdição, em que, embora seja respeitada a vontade da pessoa interditada, em inúmeros momentos não há escolha de sua parte, tendo que se sujeitar ao que os outros definem para si.

Nesse diapasão, na tomada de decisão apoiada, o apoiado conservará a capacidade de fato, até mesmo nos atos específicos em que seja coadjuvado pelos apoiadores, ocasião em que não sofrerá restrição absoluta em seu estado de plena capacidade, apenas será privada a sua legitimidade da firmar alguns atos sozinho, em especial negociais, na sua vida civil, como atos de disposição patrimonial. Assim, tal modelo acaba beneficiando àquelas pessoas com algum grau de deficiência, com impossibilidade física, mental e até mesmo àqueles sem maiores gravidades mentais, mas que dispõem de limitações sensorial.

Feitos tais esclarecimentos, fica claro que tanto o procedimento de tomada de decisão apoiada quanto o processo de interdição visam unicamente resguardar os interesses da pessoa que não possui plenas condições de gerir seus atos com plenitude, de maneira que necessita de auxílio de terceiros para garantir a preservação de seus interesses e respeito aos seus direitos, devendo ser observado o grau de limitação para fins de decisão acerca de qual procedimento é mais adequado no caso concreto.

Nessa linha, destaca-se que muito embora se esteja diante de institutos com fins e efeitos jurídicos diversos, tendo em vista a nova ótica conferida pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência, o que se percebe é que ambos os desígnios visam prestigiar a dignidade da pessoa humana bem como, na medida do possível, a sua maior autonomia possível, sendo viável analisar a situação de acordo com cada especificidade, pertinência e com a melhor adequação ao grau de dificuldade da pessoa no momento do pedido. Sendo assim, se a situação evidenciar que há um agravamento do quadro clínico, o que possui o condão de impossibilitar a manutenção do procedimento mais brando por não abranger uma proteção completa e efetiva, nada impede que haja a conversão do procedimento de tomada de decisão apoiada para o de interdição, sem perder de vista a necessidade de adaptações procedimentais. Significa dizer que dentro do procedimento original é possível mudar a modalidade e instituto processual utilizado, visando garantir o devido respeito aos mais vulneráveis. 

A possibilidade de conversão se sustenta em uma perspectiva fática, a partir da lógica que acomete, por exemplo, pessoas com doenças neurodegenerativas. Isso porque alguém que tenha sido diagnosticado com mal de Alzheimer em grau inicial, para quem a Tomada de Decisão Apoiada seria a opção mais adequada, lamentavelmente verá o seu grau de cognição e autonomia diminuírem ao longo do tempo, vez que se trata de doença progressiva e irreversível. Não faria sentido, assim, que não fosse possível pleitear a conversão em interdição, a partir do momento em que a doença já tenha ceifado boa parte do grau de autonomia de que gozava o então apoiado.

Tal possibilidade de conversão se encontra pautada no princípio da elasticidade processual, que visa justamente uma adaptação procedimental de acordo com as circunstâncias que o caso concreto exige. Mais ainda, a conversão procedimental visa resguardar, no mesmo procedimento já ajuizado, os princípios da economia processual, razoável duração do processo e da proteção da pessoa com deficiência, garantindo mais efetividade ao processo.  

Clique aqui para ler a íntegra do artigo.

Mayara Santin Ribeiro
Advogada e sócia do escritório Reis & Alberge Advogados. Pós-graduada em Direito Civil e Processo Civil pela UCM e em Direito das Famílias e das Sucessões pela UTP.

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