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O direito de extensão e a depreciação de imóvel confrontante, contíguo e de mesmo proprietário para todos os tipos de desapropriação

Falta de previsão legal para o direito de extensão em desapropriações parciais e discute a jurisprudência, destacando recentes decisões do STJ.

23/9/2024

O presente artigo versa sobre situações concretas, porém que não possuem previsão legal que amparem, de maneira justa, o direito de extensão da desapropriação fundamentada em utilidade pública e o direito de extensão e depreciação do imóvel confrontante, contíguo e de mesmo proprietário para todos os tipos de desapropriação.

O direito de extenção 

O direito de extensão consiste em englobar a totalidade do imóvel expropriado quando a desapropriação parcial tornar a área remanescente desprovida de conteúdo econômico.

O direito de extensão atualmente está previsto apenas no § 1º do art. 19 da lei 4.504/64, que dispõe sobre o estatuto da terra, bem como no art. 4º da lei complementar 76/93, que regula a desapropriação por interesse social para fins de reforma agrária,

O art. 4º da lei complementar 76/93 exige, para o exercício do direito de extensão, que a área remanescente fique reduzida à superfície inferior à da pequena propriedade rural, ou prejudicada substancialmente em suas condições de exploração econômica, caso seja o seu valor inferior ao da parte desapropriada.

Cumpre destacar que não há disposição legal sobre o direito de extensão da desapropriação à área remanescente no decreto-lei 3.365/41 (utilidade pública), tampouco na lei 4.132/62 (interesse social). Ademais, o art. 12 do decreto 4.956/03 foi expressamente revogado pelo anexo IV do decreto 11/91, não integrando mais o ordenamento jurídico, de modo que não pode ser utilizado como base normativa para fundamentar o direito de extensão.

Previsão legal para os casos de depreciação da área remanescente e o direito de extensção da indenização

O art. 27 do decreto-lei 3.365/41 prevê somente que eventual depreciação da área remanescente do imóvel desapropriado deve ser levada em conta na fixação do valor da indenização, a título de compensação pelos prejuízos sofridos pelo proprietário.

Diante disso, há previsão legal para as seguintes situações fáticas: (i) depreciação da área remanescente do imóvel em razão de desapropriação parcial (art. 27 do decreto-lei 3.365/41), caso não seja comprovado o esvaziamento econômico da área remanescente; (ii) extensão da desapropriação para a integralidade do imóvel em razão de desapropriação parcial, caso seja comprovado o esvaziamento econômico da área remanescente e a desapropriação seja declarada de interesse social para fins de reforma agrária.

Logo, não há no ordenamento jurídico previsão legal as seguintes situações que estão presentes no cotidiano dos operadores do direito (advogados, procuradores, juízes, peritos judiciais, assistentes técnicos etc.) que atuam em desapropriação, cujos imóveis foram declarados de utilidade pública (decreto-lei 3.365/41) ou interesse social (lei 4.132/62), vejamos:

  1. extensão da desapropriação para a integralidade do imóvel em razão de desapropriação parcial, caso seja comprovado o esvaziamento econômico da área remanescente;
  2. depreciação de imóvel confrontante também de propriedade do expropriado, caso não seja comprovado o seu esvaziamento econômico, cujos imóveis são contíguos e não há divisão física entre eles, mas que não foi inserido pelo poder público no decreto expropriatório; e
  3. extensão da desapropriação de imóvel confrontante, caso seja comprovado o seu esvaziamento econômico, também de propriedade do expropriado, cujos imóveis são contíguos e não há divisão física entre eles, mas que não foi inserido pelo poder público expropriante no decreto expropriatório.

Jurisprudência dos tribunais estaduais, do STJ e o recente entendimento da primeira turma do STJ acerca do direito de extensão

Em razão da ausência de previsão legal, naturalmente restou aos advogados dos proprietários dos imóveis expropriados comprovar e convencer os juízes, peritos judiais e desembargadores dos prejuízos causados pela desapropriação à área remanescente ou ao imóvel confronte à área desapropriada também de titularidade do expropriado.

O resultado desta árdua advocacia foi a construção de um mesmo entendimento pelos tribunais estaduais e pelo STJ, que apesar de reconhecerem os limites impostos pelo art. 4º da lei complementar 76/93, também reconhecem o direito de extensão da desapropriação, caso seja comprovada a inviabilidade econômica da área remanescente do imóvel.

Aqui cabe um exemplo para melhor elucidação: as propriedades, ainda não unificadas, de um mesmo titular de domínio, que seriam destinadas a empreendimento imobiliário. A área não desapropriada se torna imprestável ao fim a que se destinava.

Em diversas oportunidades, o STJ reconheceu o direito de extensão para imóveis declarados de utilidade pública para fins de desapropriação1. Todavia, recentemente, a 1ª turma do STJ no julgamento do AgInt no recurso especial 1.937.626 – RO teve que se manifestar especificamente sobre a aplicação da legislação vigente sobre o direito de extensão e, por maioria, entendeu que a lei que incidir no caso em apreço deve ser aplicada em sua integralidade, não sendo possível a conjugação de lei anterior (decreto 4.956/03), ainda mais revogada, com legislações posteriores (lei complementar 76/93 e decreto-lei 3.365/41), para se extrair de cada uma delas o que melhor beneficiar o expropriado ou o expropriante, visto que o Poder Judiciário estaria, nessa hipótese, criando uma terceira norma, invadindo, por consequência, competência reservada ao Poder Legislativo.

Com isso, de maneira inédita, a 1ª turma do STJ modificou o entendimento do egrégio tribunal de justiça de origem para afastar o direito de extensão e aplicar o direito de desvalorização da área remanescente, uma vez que a desapropriação do imóvel expropriado foi fundamentada em declaração de utilidade pública (decreto-lei 3.365/41).

Situação prática e solução compatível com a justa indenização

No nosso entendimento, em razão da ausência de previsão legal para os casos de declaração de utilidade pública (decreto-lei 3.365/41) e interesse social (lei 4.132/62) deve ser aplicado subsidiariamente o art. 4º da lei complementar 76/93 (esvaziamento do proveito econômico), como é a jurisprudência dos tribunais estaduais e STJ, sob pena de enriquecimento ilícito do poder público ao deixar de indenizar o proprietário de maneira justa.

E não para por aí. O direito de extensão e depreciação da área remanescente deve ser estendido para imóvel confrontante, também de propriedade do expropriado, cujos bens são contíguos e não há divisão física entre eles, mas que não foi inserido pelo poder público expropriante no decreto expropriatório.

Abaixo um caso prático recente de desapropriação de imóveis declarados de utilidade pública. Visualiza-se que fisicamente é uma única área de 3.250,00m², passível de incorporação imobiliária e com propostas de compra por construtoras que ultrapassam R$ 13 milhões, porém é composta por três matrículas imobiliárias e possuem o mesmo proprietário, incorporador.

Inicialmente, o Poder Público desapropriou apenas dois imóveis que compõem duas matrículas imobiliárias (área verde) e excluiu o imóvel objeto da área vermelha do decreto de desapropriação.

É crível o proprietário não fazer jus ao direito de extensão ou depreciação da área remanescente para o imóvel confrontante (matrícula distinta)? Qual é o aproveitamento econômico que restará ao proprietário incorporador sobre esse imóvel?

Conclusão

Diante de situações como essa e que não são exceções é que defendemos que os direitos de extensão e depreciação devem ser estendidos para a área remanescente e para os imóveis confrontantes, contíguos e de mesmo proprietário, independentemente do fundamento da declaração, pois a desapropriação deve, obrigatoriamente, deixar a parte expropriada absolutamente indene. Não é razoável o proprietário do imóvel ser lesado em razão da omissão e inércia do legislador ao não regulamentar situações cotidianas como a descrita acima.

_____

1 REsp n. 986.386/SP, relator Ministro Castro Meira, Segunda Turma, julgado em 4/3/2008, DJe de 17/3/2008

REsp n. 882.135/SC, relatora Ministra Denise Arruda, Primeira Turma, julgado em 17/4/2007, DJ de 17/5/2007, p. 217.

Flávio Yunes Elias Fraiha
Advogado. Presidente da Comissão de Estudos de Desapropriação do IASP. Especialista em Direito Civil pelo Mackenzie e Processo Civil pela EPM. Palestrante no Instituto de Engenhria e no IBAPE.

Cesar Chaim
Advogado. Pós-Graduado em Direito Civil e Empresarial pelo Damásio. Especialista em desapropriação.

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