O estudo do Direito mudou nos últimos anos, especialmente pelo avanço da tecnologia e o surgimento de novos direitos, o que deu origem também a ramos do direito, a exemplo do Direito Digital.
Nesse contexto, aliado à revolução digital, nos últimos 30 anos, o estudo do Direito passou também pela evolução do direito constitucional, de modo que foram incorporados novos direitos, hoje adjudicados pela população não apenas pelas vias administrativas, mas também pela via judicial.
Ainda nesse mesmo cenário a expansão dos serviços prestados à população expôs as deficiências dos serviços públicos prestados diretamente ou por meio de concessões de serviços público.
O cenário acima descrito demonstra, por um lado como o Direito evoluiu e por outro, a consequência de sua evolução, o aumento da litigiosidade, isso porque a consolidação de novos direitos, quer seja pela concretização de direitos constitucionais, quer seja pelo surgimento de novos direitos ou pela cobrança maior da sociedade pela prestação de serviços públicos eficientes.
Para Maria Cecília de Araújo Asperti1, a litigiosidade não se confunde com conflituosidade “pois nem todo conflito é reconhecido formalmente pelas partes ou as leva a invocar a intervenção de um terceiro em sua resolução, havendo, na realidade, uma série de outros fatores que influenciam o reconhecimento do conflito, sua evolução e a decisão dos envolvidos de ajuizar uma demanda (ou um litígio). Daí porque a litigiosidade dever ser entendida como a busca de uma prestação jurisdicional”
Pela leitura da afirmação acima é possível perceber que a litigiosidade não se resume a resolução judicial de conflitos, mas a todos a formas de utilizadas de modo a garantir uma prestação jurisdicional, não necessariamente por meio de um sentença judicial, abrangendo os meios alternativas de conflitos, as soluções apresentados por meio dos Centros de Inteligência da Justiça, as decisões concertadas (cooperação judicial), entre outras formas de garantir a prestação jurisdicional adequada.
Nesse sentido, surgiram formas de litigância anômala, fenômeno decorrente das relações travadas em uma sociedade de massa exposta a um grande volume de informações e apelos de consumo, podendo ser tomadas como exemplo a litigância repetitiva e litigância predatória.
A litigância repetitiva é uma forma legítima de litigar, isso porque decorre das relações de consumo de massa e, na maior parte das vezes, é resultado da falha prestação de serviços.
Ao contrário, a litigância predatória é ilegítima, isso porque se utiliza do sistema de justiça para fins indevidos, ou seja, cria demandas inexistentes ou abusa do direito de ação, a exemplo do que ocorre o fracionamento indevido de ações.
Dentro desse contexto, ainda que os conceitos acerca da litigância predatória estejam em construção, seus efeitos já podem ser sentidos concretamente, quer seja pelo aumento de número de ações com tal características no Poder Judiciário, quer seja pela violação aos consumidores, decorrente de utilização indevida das informações constantes em seus cadastros para utilização em demandas fabricadas ou ainda da captação fraudulentas de procurações.
As situações acima relatadas já caracterizam ofensa aos direitos dos consumidores, isso porque se valem da sua boa-fé dos para obter seus dados e outorga de procurações.
De igual modo, o número de ações indevidas propostas impactam diretamente do tempo de tramite dos processos, razão pela qual ações legítimas, por vezes, sofrem um aumento no tempo de tramitação.
Assim, pelas situações acima expostas, observamos que as demandas predatórias prejudicam toda o sistema de justiça, aí incluídos todos seus atores, mas também os consumidores, violando, dessa forma sua proteção, garantida constitucionalmente.
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1 ASPERTI, Maria Cecília de Araújo. A mediação e a conciliação das demandas repetitivas. 1ª ed. Belo Horizonte. Ed. Fórum. 2020. p. 23.