Em 5/8/24 foi assinado em Santiago novo tratado de extradição entre Brasil e Chile. O ato, uma vez incorporado por Decreto, substituirá o decreto 1.888/37. Como diretrizes gerais, estabelece-se que os delitos que permitem extradição devem ser punidos com pena de prisão ou outra pena privativa de liberdade por período superior a dois anos e que a concessão para o cumprimento de pena de prisão ou outra pena privativa de liberdade terá cabimento se, no momento de envio do pedido de extradição, restar ainda um período mínimo de seis meses de pena a ser cumprida pela pessoa procurada.
Também deve ser respeitada a dupla imputação (o delito deve ser punido em ambos os países), bastando uma identidade, em caso de mais de um fato delitivo. Prevê-se, ainda, que a extradição pode ser fundada em delitos contemplados nos tratados multilaterais vigentes para ambas as partes e que, em matéria de delitos fiscais, financeiros, tributários e relativos a câmbio, a extradição não poderá ser recusada mediante justificativa de que a legislação nacional da parte requerida contenha normas fiscais e aduaneiras ou normas de regulamentação cambial distintas da legislação nacional da parte requerente, sempre e quando se reúnam os demais requisitos para extradição.
Como causas de recusa à extradição, o novo tratado apresenta a possibilidade de o país requerido considerar afetada sua soberania, segurança nacional, ordem pública ou ser o pedido contrário à sua Constituição.
O Brasil, por exemplo, tem vedação constitucional à extradição de brasileiros natos em determinados casos: se houver fundada razão para acreditar que há riscos de perseguição fundada ou agravada em aspectos discriminatórios (razão de raça, origem étnica, idade, capacidade mental, sexo, gênero, religião, nacionalidade, orientação sexual ou opinião política – sendo o terrorismo), se puder implicar punição cruel, degradante, e se em um dos países houver prescrição da pena ou da ação penal.
Além de excluir crimes militares, extradição de menores (crianças e adolescentes), veda-se extradição em caso de sujeição ao extraditando a tribunal de exceção ou tribunal militar e nas situações em que já tiver havido absolvição, anistia, indulto, ou, ainda, concessão de asilo ou refúgio.
Há relevante inovação que não veda a extradição, mas permite a reabertura do caso, na hipótese de o pedido de extradição ser fundado em sentença dada à revelia e sem assistência por defesa técnica providenciada pelo extraditando. Por fim, o tratado exclui a qualificação como políticos (e permite a extradição) nos casos de terrorismo, atentado contra a vida, a integridade física, ou a liberdade de Chefe de Estado ou de Governo, de pessoal diplomático ou de outras pessoas internacionalmente protegidas, ou de um membro da família de algum deles, bem como genocídio, crimes de guerra, crimes de agressão ou crimes de lesa humanidade.
Há ainda disposições que permitem a recusa facultativa do pedido, particularmente, nas seguintes situações: se pessoa procurada estiver sendo julgada atualmente, no território da parte requerida, pelos mesmos atos nos quais se fundamenta o respectivo pedido; se em teste de proporcionalidade sobre a gravidade do delito e os interesses de ambas as partes considerar que a extradição pode ser incompatível com questões humanitárias, devido à saúde ou a outras circunstâncias pessoais da pessoa procurada; se procure a pessoa por um ato que constitua um delito que, em conformidade com a legislação nacional da parte requerida, tenha sido cometido, total ou parcialmente, em seu território; se as autoridades competentes da parte requerida decidiram não iniciar ou dar por concluído um processo penal relacionado com mesmo delito ou crime.
As autoridades centrais designadas pelas partes são o Ministério da Justiça e Segurança Pública, pelo Brasil e o Ministério das Relações Exteriores, pelo Chile.
Além de formalidades sobre o procedimento, envolvendo questões concretas sobre entrega, traslado, custos e disciplina sobre bens apreendidos, o tratado prevê a possibilidade de extradição simplificada, quando a pessoa procurada (extraditando) concordar, em manifestação considerada irrevogável, em ser entregue ao país requerente. Faz-se ainda referência à incidência do princípio da especialidade (não se poderá processar o extraditando ou sentenciá-lo com o objetivo de cumprir uma pena ou uma ordem de prisão por qualquer delito cometido previamente àquele ou àqueles que motivaram a sua extradição).
Também consta a vedação da reextradição (redirecionamento ou envio) a terceiro Estado sem consentimento do país requerido e se anota que em caso de pedidos de extradição concorrentes, por mais de um país, haverá uma decisão discricionária, que deverá levar em conta: o Estado requerente em cujo território tenha sido cometido o delito mais grave; o Estado que primeiro pediu a entrega do extraditando, se a gravidade dos delitos for idêntica; e o Estado de origem, ou, em sua ausência, o do domicílio do extraditando, se os pedidos são simultâneos.
Para além das disposições anteriores, em alguma medida, comuns aos tratados de extradição, um ponto inovador e que se destaca diz respeito à prisão para os fins da entrega ao Estado requerente. Como regra, nos processos de extradição, há previsão de se poder pedir a prisão preventiva, como uma medida decorrente do próprio pedido, como se se tratasse de um desdobramento inevitável.
O novo tratado traz a inovação de que a decisão acerca do pedido de prisão preventiva será tomada com base na legislação nacional do país Requerido e que deverá informar imediatamente à parte requerente de sua decisão. Em até 60 dias do pedido de prisão, deverá ser formalizado o pedido de extradição.
Tem-se como muito bem-vinda essa previsão que permite uma análise mais individualizada das condições da necessidade da prisão, para além da possibilidade de se considerarem outras medidas menos gravosas, como outras cautelares diversas como suficientes.
Compreende-se que essa previsão se traduz em um aceno para a superação da extradição como um ato burocrático, do non inquiry irrestrito e para a adequada compreensão de que a preservação dos direitos fundamentais é obrigação de todas as partes envolvidas na cooperação jurídica internacional.