Nas proximidades das eleições foi aprovada a “PEC Kamikaze” convolada na EC 123 de 14-7-22.
Essa Emenda, ao invés de descrever as hipóteses de declaração de emergência, a exemplo das hipóteses de decretação do estado de defesa e do estado de sítio, decretou concretamente o estado de emergência e sob efeito dessa “emergência” instituiu diretamente benefícios sociais casuísticos, para serem executados até 31-12-22.
A norma constitucional de efeito concreto instituiu os seguintes benefícios sociais:
- o benefício mensal do Auxílio Brasil de que trata a lei 14.284/21 passa dos atuais R$ 400,00 para R$ 600,00 até o limite de R$ 26.000.000.000,00;
- o Programa de Auxílio Gás de que trata a lei 14.237/21 passa para R$ 120,00 para o botijão de 13 kg até o limite de R$ 1.050.000.000.000,00;
- a União aportará aos Estados, DF e Municípios recursos emergenciais de R$ 2.500.000.000.000,00 para custeio de transporte coletivo gratuito aos idosos, previsto no § 2º, do art. 230 da CF;
- concede aos Transportadores Autônomos de Cargas registrados no RNTRC o auxílio mensal de R$ 1.000.00 até o limite de R$ 5.400.000.000.000,00;
- a União entregará recursos financeiros de R$ 3.800.000.000.000,00 em cinco parcelas mensais de R$ 760.000.000,00 exclusivamente aos Estados e ao Distrito Federal que outorgarem créditos do ICMS aos produtores ou distribuidores de etanol hidratado em seus territórios, em montante equivalente ao valor recebido;
- aos taxistas registrados é outorgado o auxílio no importe total de R$ 2.000.000.000,00.
Contra essa Emenda o Partido Novo ingressou com a ADI que tomou o 7.212 distribuída em 18/7/22.
O STF não apreciou a medida cautelar adotando o rito do art. 12 da lei de regência da matéria para conhecimento direito do mérito. Na prática essa praxe do STF tem sido uma lástima, acarretando da prolação de decisão definitiva a destempo.
A decisão só foi proferida depois de dois anos, ou seja, no dia 1/8/24, por maioria de votos, reconhecendo a inconstitucionalidade do art. 3º da EC 123/22 (declaração do estado de emergência); do art. 5º (institui benefícios sociais), e do art. 6º que zerou a alíquota incidente sobre a gasolina, até 31/12/22.
Conferiu-se efeito ex nunc para não prejudicar aqueles que receberam o benefício social.
Trata-se de uma decisão inócua, pois os dispositivos declarados inconstitucionais eram de natureza temporária, cujos efeitos se exauriram em 31/12/22.
Era o caso de julgar prejudicada a ação pela manifesta perda superveniente do objeto, conforme salientou o ministro André Mendonça.
No entretanto prevaleceu o voto do ministro Gilmar Mendes, que sustentou a inexistência da perda de objeto “porque muitas ações relativas a leis com tempos exíguos, dificilmente, são julgadas em tempo hábil”.
Em abono de sua tese citou o precedente da ADPF 623 que declarou a inconstitucionalidade de decreto editado pelo ex presidente, Jair Bolsonaro, que reduziu o número de integrantes no CONAMA.
Com a devida vênia o precedente citado não serve para o caso de ADI que pressupõe norma em vigor. A ADPF serve para impugnar a norma que não mais está em vigor, para eventual invalidação dos efeitos da norma ao tempo de sua vigência.
Nesse tipo de ação em que se ataca preceito constitucional de vigência temporária, sem a apreciação da medida cautelar, o resultado do julgamento não produzirá qualquer efeito jurídico.
Sustentar que há ações pendentes relativas a leis com tempos exíguos, não nos convence, data máxima vênia, pois nesses casos cabe aos juízes e tribunais reconhecerem a perda superveniente do objeto.
Positivamente, estamos diante de uma decisão inócua do ponto de vista jurídico, apesar do esforço liderado pelo insigne ministro Gilmar Mendes, procurando extrair algum efeito da decisão proferida tardiamente, sem apreciação da medida cautelar.