A Constituição de 1934 foi a primeira a prever a estabilidade dos funcionários públicos. Exigia a aprovação em concurso público e dois anos de exercício ou dez anos sem concurso. Desde então, esteve presente em todas as nossas cartas.
A justificativa única para a estabilidade, que constitui um privilégio se comparada com a realidade instável dos demais membros da sociedade, é a garantia da continuidade dos serviços públicos a serem prestados para os cidadãos que custeiam o Estado.
As atividades públicas de fornecimento de educação, saúde, segurança, proteção contra incêndios, licenciamento e fiscalização, entre outras, devem ser contínuas porque as necessidades coletivas que geram tais serviços são igualmente perenes.
Por isso, os cidadãos e empresas devem pagar tributos sem interrupção, uma vez que a arrecadação é o antecedente financeiro necessário à prestação igualmente contínua dos serviços públicos.
Os direitos humanos que geram tais serviços são permanentes e incondicionados, já que o seu atendimento constitui a própria justificativa de existência do Estado contemporâneo. Em consequência, não podem estar subordinados aos interesses dos que têm o dever de prestá-los.
Na iniciativa privada não existe estabilidade (salvo poucas exceções legais, todas transitórias) e a remuneração é negociada livremente. Em consequência da ausência de vínculos permanentes, os parâmetros financeiros da relação trabalhista devem estar sempre abertos à negociação, incluindo a livre interrupção coletiva dos serviços para obter melhores condições de trabalho.
Em sentido oposto, a relação entre servidores públicos e o Estado é institucional, e não contratual. O cidadão que deseja servir ao público passa por um concurso voltado ao preenchimento de uma função pública permanente e aceita essa relação de estabilidade recíproca.
A greve do servidor público contraria a própria essência do serviço público e constitui um sequestro do direito coletivo à sua prestação contínuada. A interrupção coletiva dos serviços públicos, como instrumento de pressão para obter melhorias remuneratórias, deixa indefesos os cidadãos que os custeiam e deles dependem. Não pode haver reciprocidade de mão-única.
A ilicitude da interrupção na prestação dos serviços é agravada pela obtenção de remuneração pelos servidores sem a prévia prestação da atividade laboral, que constitui sua única justificação. Os cidadãos contribuintes não tem a opção de suspender o pagamento dos seus tributos, pois seu dever é legalmente instituído, assim como o dos servidores.
A greve não pode ser vista como mais um dos direitos a eles atribuídos, mas sim como o afastamento ilícito de um dever contínuo que assumiram livremente. Por isso, é inaceitável.