Foi com enorme satisfação que recebi o convite da prestigiosa Associação dos Advogados de São Paulo para proferir palestra, juntamente com o estimado amigo e professor José Roberto do Santos Bedaque, nesta terça-feira, 28.05, às 18h, sobre a causa de pedir no processo civil, ocasião em que será lançado o livro da talentosa professora Clarisse Frechiani Lara Leite, sobre o qual escrevo esta breve resenha.
O processo civil brasileiro é informado pelo princípio da substanciação, uma vez que o artigo 319, inciso III, do Código de Processo Civil, impõe ao demandante o dever de especificar, já na petição inicial, os fatos e os fundamentos jurídicos do pedido. Com a defesa do réu estabilizam-se os elementos subjetivo e objetivos da demanda, não havendo possibilidade, por ato volitivo exclusivo do autor, de alteração até o momento que precede a extinção do processo.
No entanto, pode ocorrer que, durante a respectiva tramitação do procedimento, fatos e provas novos ou supervenientes venham a influir de tal sorte no objeto de um processo, que devem ser sobrelevados pelo juiz. É por esta razão que o artigo 493 do Código de Processo Civil preceitua que: “Se, depois da propositura da ação, algum fato constitutivo, modificativo ou extintivo do direito influir no julgamento do mérito, caberá ao juiz tomá-lo em consideração, de ofício ou a requerimento da parte, no momento de proferir a decisão”.
Este fenômeno, além de ostentar significativa relevância prática, delineia-se complexo, sobretudo pela sua inexorável repercussão no desfecho do processo.
Enfrentando o desafio de discorrer acerca desta intrincada temática, Clarisse Frechiani Lara Leite, em recente monografia com a qual conquistou o título de professora livre-docente da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, intitulada Fatos e provas novos no processo civil (São Paulo, Ed. RT, 2024), toma como ponto de partida uma provocadora indagação: “o que é ‘prova nova’ apta a legitimar a ação rescisória com fundamento no inciso VII do artigo 966 do Código de Processo Civil”.
Para responder a esse questionamento e a muitos outros correlatos, a referida autora divide o envolvente estudo em quatro partes, sendo que na segunda delas vem examinado o aporte de fatos no processo visando ao julgamento do mérito. Observo que nesse capítulo são analisadas as categorias de fatos essenciais, de fatos principais e de fatos secundários.
Ressalte-se, nesse particular, que, ainda neste tópico da tese, a autora aborda duas questões que normalmente são tratadas de forma indistinta, quais sejam, o papel da vontade na inserção de tais fatos no processo, mediante alegações e provas, e os respectivos momentos possíveis de introdução destes no curso do processo.
As terceiras e quarta partes da obra em apreço são dedicadas à relevância dos fatos e provas novos para futura modificação da decisão de mérito coberta pela coisa julgada material. Destacam-se aqui a ação rescisória fundada em prova nova, a ação revisional por alteração do estado de fato e a renovação da ação coletiva com base em prova nova.
Elogiável, por todos os aspectos, o original e minudente item sob a rubrica A ação rescisória fundada em prova nova, no qual esmiuçadas todas as questões pertinentes, em especial, as dimensões objetiva e subjetiva da novidade da prova, bem como o momento oportuno em que teria sido possível a sua produção no processo anterior.
De inequívoco interesse é a afirmação, destacada pela autora, de que a revelia no processo de origem não impede a propositura de ação rescisória fundada em prova nova.
Convida outrossim à reflexão a alusão ao fato superveniente, que não tem a aptidão para lastrear ação rescisória, mas, sim, para embasar ação revisional.
Oportuno ademais o detido exame da tese sobre a substancial conexão entre duas diversificadas situações, vale dizer, da ação rescisória com alicerce em prova nova e da repropositura da ação coletiva diante da improcedência pela insuficiência probatória. Como, a propósito, vem salientado na conclusão do livro, “a constatação, amparada na doutrina, de que a prova nova constitui requisito de admissibilidade da segunda demanda e de que o novo julgamento de mérito apenas se legitima enquanto decorra de tal novel elemento probatório, revela a grande semelhança estrutural desse instrumento com a ação rescisória fundada em prova nova. Trata-se, sem dúvida, de técnicas diversas, a revelar graus de estabilidade distintos atribuídos pelo sistema, para a decisão ‘ordinária’ de mérito e para a decisão de improcedência fundada em ausência de provas”.
Pois bem, a tese então submetida à comissão examinadora, com as devidas atualizações, vem agora a lume. Trata-se, como facilmente se observa, de uma verdadeira contribuição à literatura jurídica brasileira.
Pela sua abrangência e atualidade, realçadas nestas brevíssimas linhas, não tenho dúvida em recomendar a consulta da obra aos estudiosos da ciência processual.
Uma última palavra à editora RT, que não hesitou em prestigiar a jovem autora, na renomada coleção Liebman, idealizada pelo saudoso professor Arruda Alvim e coordenada pelos estimados professores Teresa Arruda Alvim e Eduardo Talamini.
Vale!