A reforma tributária instituída pela Emenda Constitucional 132/23, introduziu novos princípios em nosso sistema tributário, como a simplicidade, a transparência, a justiça tributária, a cooperação e a defesa do meio ambiente.
Isso significa dizer que todo o novo sistema tributário deverá ser criado (regrado), interpretado e aplicado à luz desses novos princípios, além dos já existentes, como a legalidade, a irretroatividade, a anterioridade, a isonomia etc.
Hoje, tratamos aqui apenas da simplicidade. Sabe-se que uma das maiores críticas ao sistema brasileiro sempre foi a sua complexidade, diversas espécies tributárias, variadas bases de tributação e alíquotas, constante guerra fiscal entre os entes tributantes, além da extensa e complexa legislação, o que desencadeava diferentes interpretações e inúmeros conflitos entre fisco e contribuinte. Daí a importância da simplicidade.
Nesse sentido, a expressa determinação do princípio da simplicidade mostra um grande avanço em nosso sistema, o que pode ser percebido, de plano, pela criação do chamado IVA DUAL, com a substituição do ICMS e do ISS pelo IBS e, da contribuição ao PIS e da Cofins pela CBS.
Além da redução de tributos, haverá simplificação no cálculo, que será "por fora”, de maneira mais transparente, sem a inclusão do IBS e da CBS nas próprias bases, o que acontecia nos regimes anteriores, de maneira que de forma clara se saberá o valor do produto ou serviço e o valor dos tributos sobre ele incidentes. Ainda, a fixação de uma alíquota padrão, com possibilidade de isenção ou redução em duas faixas: 60% e 30% (regimes diferenciados), também deve diminuir a complexidade no cumprimento das obrigações tributárias.
Não bastasse, a recente apresentação pelo Governo Federal do PLP 68/24, também já demonstra grande avanço no tocante à simplicidade, especialmente porque unifica as regras gerais do IBS e da CBS (IVA DUAL) em um mesmo texto legal, trazendo uma legislação uniforme, aplicável a ambos os tributos e em todo o território nacional. Essa uniformização da legislação certamente contribuirá para redução de litígios tributários no país, que hoje ultrapassam 75% do PIB brasileiro (processos administrativos e judiciais), conforme constatou o núcleo de pesquisa em tributação do INSPER, no “Diagnóstico sobre o contencioso tributário brasileiro”.1
Toda a simplificação acima destacada terá efeito também sobre o compliance e o custo de conformidade das empresas, não só pela simplificação da legislação e redução do risco de inconformidade, mas também pela redução das obrigações acessórias2 e também dos modelos de recolhimento que vêm previstos na nova sistemática, entre as quais se inclui o chamado “split payment”, que nada mais é do que o recolhimento dos tributos no momento da liquidação da operação financeira, ou seja, no momento do pagamento da operação, automaticamente, e não mensalmente, como até o momento.
Segundo informações da Receita Federal, toda essa automatização, que conectará Comitê Gestor, instituições financeiras e autoridades administrativas pode ser facilmente implementada, especialmente levando em conta todo o aparato tecnológico já existente no que diz respeito à obrigação acessória, à fiscalização e à arrecadação.
O “split payment” não é uma unanimidade e tem gerado discussões, não só sobre a viabilidade da sistemática, mas também sobre o impacto de sua aplicação no fluxo de caixa das empresas (além de mudanças relacionadas ao período de apuração e vencimento), de toda forma, independentemente das questões mais conflituosas que vem sendo levantadas, o “split payment” é, sem sombra de dúvidas, um divisor de águas no tocante à conformidade e à simplicidade.
O texto do PLP 68/24, condiciona a não cumulatividade ao efetivo recolhimento da obrigação tributária nas operações anteriores, o que faz da regularidade fiscal e do compliance tributário um fator primordial dentro das relações comerciais e contratuais.
Assim, o “split payment” também poderá ser um importante aliado na diligência da conformidade tributária nas relações comerciais, de forma simplificada e automática, evitando contenciosos como os existentes nos dias de hoje, frutos da glosa de créditos em sistemáticas não cumulativas.
É evidente que toda a implementação da reforma tributária exigirá uma mudança paradigmática e será desafiadora, especialmente no período de transição, mas, se bem regulamentada e implementada com respeito aos antigos e novos princípios tributários (o que inclui o da simplicidade), veremos avanços importantes no tocante ao custo de compliance tributário no Brasil.
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1 Disponível em: https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2022/02/relatorio-contencioso-tributario-final-v10-2.pdf
2 Importante lembrar que será necessária a adequação de todos os sistemas de controles ao novo modelo, lembrando ainda que haverá um período de transição, em que as empresas seguirão tanto com o “antigo sistema” (PIS, COFINS, IPI, ICMS e ISS), quanto com o novo regime (IBS e CBS). Esse período de transição exigirá um controle de conformidade bastante rígido, sob pena de impacto na regularidade fiscal (conformidade).