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Estado de Defesa ou Intervenção Federal, qual a medida constitucional adequada para ser adotada em relação ao Rio Grande do Sul?

Governo federal deve decretar Estado de Defesa para socorrer o RS diante da calamidade. É hora de ação efetiva e urgente.

10/5/2024

É inquestionável o fato de que o governo federal precisa agir para socorrer o Rio Grande do Sul. Nenhum estado membro possui recursos humanos e os equipamentos necessários para fazer frente a uma catástrofe como a que está acontecendo com o povo gaúcho. O governo federal tem todos os recursos, por intermédio das Forças Armadas para fazer os resgates, atender às vítimas e garantir a segurança da população.

Ainda existem muitas pessoas para serem resgatadas e com o aumento das chuvas, que já começou ontem, o número de vítimas irá aumentar ainda mais. Além da chuva torrencial, ainda virá o frio. A previsão é da temperatura é de 10 graus, nesta semana. As pessoas não irão sobreviver sem ajuda imediata. Não adianta mandar só dinheiro, é preciso enviar pessoas para fazer o trabalho de resgate com urgência.

Diante desse cenário de devastação e caos, qual a medida cabível a ser adotada pelo governo federal para efetivamente prestar socorro ao povo sul-rio-grandense?

Entendemos que cabe a decretação de Estado de Defesa, nos termos do art. 136, da CF:

Art. 136. O Presidente da República pode, ouvidos o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional, decretar estado de defesa para preservar ou prontamente restabelecer, em locais restritos e determinados, a ordem pública ou a paz social ameaçadas por grave e iminente instabilidade institucional ou atingidas por calamidades de grandes proporções na natureza.

Por que a decretação de um Estado de Defesa e não somente uma Intervenção Federal?

Intervenção Federal, (art. 34, CF) é medida administrativa que suspende momentaneamente a autonomia do ente federativo ou de uma parte específica dele como foi o caso, por exemplo, do Rio de Janeiro, em 2018, e em Brasília, em 2023. Ambas as ações abrangeram apenas a área de Segurança Pública. A principal limitação de uma Intervenção Federal é a impossibilidade de restrição de direitos fundamentais.

Já, no âmbito do Estado de Defesa, é possível incluir no texto do Decreto a restrição de direitos, mesmo os fundamentais, que se fizerem necessários para o bom andamento dos trabalhos de reestruturação e organização daquela parte do território afetada pela calamidade. Naturalmente, o Decreto precisa ser bem embasado, claro, definindo de forma direta quais os diretos restringidos, em quais situações e por quanto tempo. Cabendo ao Supremo Tribunal Federal a aplicação dessa medida.

A decretação de um Estado de Defesa traria, no mínimo, três recursos salutares para atender a população de maneira realmente efetiva neste momento tão grave:

(i) viabilizaria a escolha de um interventor com expertise em situações de crise para assim organizar as ações de maneira mais rápida e eficiente;

(ii) nos termos do art. 136, inc. II, seria possível requisitar prédios públicos para servir como apoio às vítimas de forma mais simplificada e célere;

(iii) seria possível prever no Decreto a suspensão imediata de contas de influenciadores ou qualquer pessoa que compartilhasse mentiras ou fomentasse a desinformação.

A propagação criminosa de fake news a respeito da tragédia no Rio Grande do Sul, a postura absurdamente oportunista de algumas ditas “subcelebridades” que estão se aproveitando da desgraça do povo gaúcho para se autopromover, bem como casos graves de intolerância religiosa que estão sendo propagados são questões que demandam uma resposta enérgica e expedita do Estado.

Sem um instrumento jurídico apto para controlar essas ações envolvendo teoricamente a liberdade de expressão (que não deve se confundir com liberdade de desinformação!), será impossível controlar de maneira suficientemente ágil os disseminadores de fake news e golpistas. Eles são muitos e se ocupam em ganhar espaço e visibilidade produzindo o caos. Com isso, criminosamente, atrapalham o trabalho de quem está empenhado em verdadeiramente oferecer suporte às vítimas. Ações individuais e pontuais, como o governo está adotando através da Advocacia-geral da União, não são, nem serão suficientes.

O texto constitucional cita, no art. 136, inc. I, alínea “c” a possibilidade restrição de sigilo de comunicação. Considerando uma interpretação através do método hermenêutico-concretizador é possível depreender que a Constituição ao trazer essa hipótese, em 1988, visava conter um potencial perigo de desarticulação dos trabalhos, em razão de conluios organizados através de conversas havidas de forma secreta. Atualmente, as falas publicizadas via redes sociais comportam essa mesma probabilidade de dano. Logo, é defensável pugnar que a Constituição autoriza a restrição de tais pronunciamentos marcadamente nocivos ao trabalho dos agentes públicos e da sociedade.

Por fim, é imperioso que o governo federal destaque um contingente realmente efetivo para fazer frente à calamidade que o Rio Grande do Sul está vivendo. O estado recebeu apenas 13.600 militares das FFAA. É um número irrisório, considerando que o Brasil conta com 360 mil militares na ativa. A tragédia no Sul já atingiu mais de 1,4 milhão de pessoas. É urgente o envio de recursos humanos para socorrer as vítimas com a maior brevidade possível.

Sem a decretação do Estado de Defesa o envio das tropas depende de acordo com o governador do Estado. A falta de uma estruturação de cadeia de comando clara, pode comprometer a autonomia de atuação dos militares. Considerando que os membros das Forças Armadas deverão estar à frente dos trabalhos e que o Presidente da República é o Comandante Supremo das Forças Armadas, o ideal seria o Presidente escolher um membro de uma das Forças para liderar as tropas e lhe prestar contas do andamento das ações. Mas tal contexto só seria possível, com a transferência Poder das mãos do Chefe do Poder Executivo estadual para o Chefe do Poder Executivo Federal.

É hora de ajudar o povo gaúcho. Nada é mais urgente e importante que isso. Se o Presidente pode fazer, ele deve fazer. Não é uma escolha, ante o pior desastre que o povo brasileiro já viveu. Sim, o povo brasileiro está vivendo essa tragédia. Somos todos gaúchos nesse momento!

Adriana Cecilio Marco dos Santos
Advogada. Professora de Direito Constitucional da Universidade Nove de Julho. Especialista e Mestra em Direito Constitucional. Autora das obras: Advogando em Mandado de Segurança e A Separação dos Poderes e o Sistema de Freios e Contrapesos. Diretora Nacional da Coalizão Nacional de Mulheres.

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