Mudança na forma de interpretação no STF exige avaliação detalhada das evidências em disputas sobre o vínculo de emprego. Evolução jurisprudencial reconhece a complexidade e a diversidade das formas de trabalho na sociedade contemporânea.
Em decisões recentes, o STF provocou uma significativa mudança na interpretação e na aplicação do ônus da prova em disputas que discutem a existência de vínculo de emprego na Justiça do Trabalho. Antes da Reforma Trabalhista, a CLT, em seu art. 818, determinava, de maneira breve, que a prova das alegações incumbia à parte que as fazia.
A Reforma Trabalhista estabeleceu, com maior precisão, a distribuição do ônus da prova, aproximando a redação do art. 818 da CLT àquela do art. 373 do CPC, especificando que ao reclamante cabe a prova dos fatos que fundamentam seu direito, enquanto ao reclamado incumbe demonstrar a existência de fatos modificativos, impeditivos ou extintivos do direito da parte autora.
Esta mudança legislativa reflete uma evolução no entendimento jurídico sobre o reconhecimento da relação de emprego, reforçando a necessidade de uma abordagem mais equitativa e detalhada na análise das provas em ações trabalhistas.
Na mesma linha, a jurisprudência do STF tem se movido em direção à valorização da liberdade contratual e da diversidade das novas formas de trabalho, como evidenciado nas decisões sobre a licitude da terceirização e da divisão de trabalho entre pessoas jurídicas diversas (RE 958.252, ADPF 324 e reclamação 65.868). Nesses julgamentos, o Supremo reconheceu a constitucionalidade da terceirização de atividades-meio e fim, afastando a presunção de vínculo de emprego e indicando uma interpretação mais adaptada às dinâmicas modernas do mercado de trabalho.
Além disso, há certas relações jurídicas de natureza cível em que a legislação própria prevê expressamente a ausência da relação empregatícia. Por exemplo, a lei que regula o transporte autônomo de cargas dispõe que as relações entre os contratantes serão “sempre de natureza comercial, não ensejando, em nenhuma hipótese, a caracterização de vínculo de emprego” (art. 5º da lei 11.442/07). Ainda, a lei do Salão Parceiro que dispõe que “o profissional-parceiro não terá relação de emprego ou de sociedade com o salão-parceiro enquanto perdurar a relação de parceria tratada nesta lei” (art. 1º, §11, da lei 12.592/12).
Da mesma forma, a lei de franquias também prevê claramente que “o sistema de franquia empresarial, pelo qual um franqueador autoriza por meio de contrato um franqueado a usar marcas e outros objetos de propriedade intelectual (...), sem caracterizar relação de consumo ou vínculo empregatício em relação ao franqueado ou a seus empregados, ainda que durante o período de treinamento” (art. 1º da lei 13.966/19).
Essa evolução jurisprudencial fomentada pelo STF reflete um reconhecimento da complexidade e da diversidade das formas de trabalho na sociedade contemporânea, demandando dos tribunais trabalhistas uma análise mais aprofundada e casuística das relações laborais que vão além da relação de emprego.
Portanto, respaldado pelo atual entendimento do Supremo, especialmente nesses casos em que a legislação dispõe expressamente sobre a inexistência de vínculo empregatício em contratos de natureza civil, fica claro que caberá à parte autora comprovar as suas alegações acerca de eventuais irregularidades no contrato firmado pelas partes, bem como demonstrar a existência concomitante dos requisitos da relação de emprego.
Dessa forma, o atual cenário jurídico, fortalecido pela legislação e pela jurisprudência do STF, exige uma avaliação detalhada das evidências em disputas sobre o vínculo de emprego, considerando a presunção de validade das formas diversificadas de organização do trabalho.