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Médico senhor do tratamento: Utilização de medicação off label e o custeio pelo seguro de saúde

A prescrição off label ocorre quando um médico decide usar um medicamento para uma indicação não aprovada, baseado em sua convicção sobre os benefícios para o paciente. Isso é permitido pela liberdade médica de decisão, apesar de não ser oficialmente regulado pelas agências de saúde.

18/4/2024

O médico é o profissional que pode decidir por uso das prescrições constantes da bula do medicamento quando se trata de uma situação e que seja necessário a medicação off label, representando, portanto, por um ato médico.

Desta forma, se o médico estiver convicto dos benefícios de uma medicação para seus doentes, alguns vão receitar medicamentos para indicações não aprovadas - a chamada prescrição off label.

Logo pode-se dizer que a prescrição off label define-se como a prescrição para uma indicação, doença ou doente fora das indicações aprovadas. Esse tipo de prescrição é admitida baseada no conceito de que as agências oficiais não regulam a prática da medicina e os médicos têm liberdade de decisão em relação ao que acham melhor para os seus pacientes.

Além disso, os arts. 422 e 423 do Código Civil, definem que os contratos devem atender a função social. Na mais coerente intepretação, isso significa garantir ao segurado o custeio do tratamento que necessita pelo plano de saúde, então vejamos:

Art. 422- Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé.

Art. 423- Quando houver no contrato de adesão cláusulas ambíguas ou contraditórias, dever-se-á adotar a interpretação mais favorável ao aderente.

Neste sentido é a doutrina mais abalizada:

"Os contratos de planos de assistência à saúde são contratos de cooperação, regulados pela lei 9656/98 e pelo Código de Defesa do Consumidor, onde a solidariedade deve estar presente, não só enquanto mutualidade (típica dos contratos de seguros, que já não são, ex vi a nova definição legal como "planos"), mas enquanto cooperação com os consumidores, enquanto divisão paradigmática-objetiva e não subjetiva da sinistralidade, enquanto cooperação para a manutenção dos vínculos e do sistema suplementar de saúde, enquanto possibilidade de acesso ao sistema de contratar, enquanto organização do sistema para possibilitar a realização das expectativas legítimas do contratante mais fraco... Aqui está presente o elemento moral, imposto ex vi lege pelo princípio da boa-fé, pois a solidariedade envolve a ideia de confiança e cooperação. Confiar é ter a "expectativa mútua, de que", em um contrato, "nenhuma parte irá explorar a vulnerabilidade da outra". Em outras palavras, o legislador consciente que este tipo contratual é novo, dura no tempo, que os consumidores todos são cativos e que alguns consumidores, os idosos, são mais vulneráveis do que os outros, impõe na solidariedade na doença e na idade e regula de forma especial as relações contratuais e as práticas comerciais dos fornecedores..."

Além do mais, vale dizer que deve ser priorizado o direito à saúde e à vida em relação ao direito contratual.

De outro lado, os planos de saúde apenas podem estabelecer para quais moléstias oferecerão cobertura, não lhes cabendo limitar o tipo de tratamento que será prescrito, incumbência essa que pertence ao profissional da medicina que assiste o paciente. Portanto, não será diferente em situações em que houver indicação de medicação off label em que há o consentimento e o aceite do paciente, nada obsta o tratamento, muito menos a negativa do plano de saúde.

No entanto, o médico ao prescrever um medicamento off label, deve obediência a princípios abstratos, como a da bioética e da ética médica, mas as regras do código de ética médica.

A este respeito a 1ª turma recursal do TJ/BA, reformou a sentença de primeiro grau e decidiu com brilhantismo, acerca da negativa de custeio de medicação off label, o dever de cobertura pelo plano de saúde, uma vez que o médico é o senhor do tratamento, e ainda concluiu que o hospital entrasse com ação de cobrança contra o plano de saúde, senão vejamos:  

JUIZADO ESPECIAL. DIREITO DO CONSUMIDOR. RECURSO INOMINADO. DECISÃO MONOCRÁTICA (ART. 15, XI E XII, DO REGIMENTO INTERNO DAS TURMAS RECURSAIS E ART. 932, III, IV e V, DO CPC). PLANO DE SAÚDE. DIAGNÓSTICO DE COVID-19. MINISTRADO O MEDICAMENTO TOCILIZUMABE (ACTEMRA). NEGATIVA DE CUSTEIO PELO PLANO DE SAÚDE. UTILIZAÇÃO OFF LABEL. DEVER DE COBERTURA. MÉDICO SENHOR DO TRATAMENTO. PRECEDENTES DO STJ. COBRANÇA INDEVIDA. INEXIGIBILIDADE DO DÉBITO. DANOS MORAIS NÃO CONFIGURADOS. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA REFORMADA. RECURSO PROVIDO.

1. A operadora não pode impor limitações que descaracterizem a finalidade do contrato, razão pela qual se revelam abusivas as cláusulas contratuais que estipulam ou restringem o tipo de medicamento a ser utilizado no tratamento das doenças previstas na cobertura do plano de saúde.

2. O art. 19 da revogada RN 428/17 previa que "os planos privados de assistência à saúde deverão assegurar cobertura para medicamentos registrados/regularizados na ANVISA que sejam utilizados nos procedimentos diagnósticos e terapêuticos contemplados na presente RN e em seus Anexos, de acordo com a segmentação contratada".

3. Não se olvida que a novel Resolução 465/21 da ANS recrudesceu o procedimento para cobertura de medicamentos off label (conforme parágrafo único, "c", do art. 17 e art. 24), porém, o poder Judiciário mantém o firme posicionamento no sentido que o médico é o senhor do tratamento, possuindo melhor capacidade para determinar a terapêutica com maior eficácia para cura de seu paciente com base na medicina em evidência, dando interpretação mais elástica ao art. 16 da mencionada Resolução 465/21.

4. Mesmo reconhecendo que os planos de saúde podem estabelecer quais doenças estão excluídas da cobertura securitária, não lhes é dado a escolha do tratamento, cuja definição cabe, exclusivamente, ao médico ou equipe profissional que assiste ao paciente, sob pena de, agindo assim, o plano de saúde restringir os direitos ou obrigações inerentes à natureza do contrato, de tal modo a ameaçar seu objeto ou equilíbrio contratual.

5. "(...) Os protocolos clínicos e diretrizes terapêuticas, como fundamento para indeferir o fornecimento de medicamentos, são genéricos e podem não representar a melhor alternativa, sendo digno de maior confiança o diagnóstico e a prescrição realizados pelo médico que atende o paciente (...)."(TJPR - RN 1.454.241-1. Rel. Des. Adalberto Jorge Xisto Pereira. DJ: 1754 7/3/16).

Eleilza Souza
Advogada Brasil e Portugal. Professora, escritora. Mestranda em Direito Civil- Universidade de Lisboa/PT Especialista em Direito da Medicina- UCOIMBRA. Comissão Especial Direito Internacional OAB/BA.

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