No âmbito da ADIN - Ação Direta de Inconstitucionalidade 2.859/DF, o STF reconheceu a constitucionalidade do emprego, para fins fiscais, de informações bancárias dos contribuintes, nos moldes estabelecidos pela lei complementar 105/01.
Esse contexto tem estimulado os Estados a lavrarem autos de infração de ICMS sobre a diferença entre os valores declarados pelos contribuintes e os valores extraídos das informações financeiras fornecidas por administradoras de cartões de crédito e débito.
A prática adotada pelos Estados tem gerado debates significativos quanto à sua legalidade.
Afinal, a validade dessas autuações depende do respeito ao rito procedimental versado na LC 105/01, o que nem sempre é observado.
Conforme apontou o STF na ADIN 2.859/DF, o § 2º do art. 5º da LC 105/01 autoriza as instituições financeiras a transferir ao Fisco informações genéricas sobre as movimentações bancárias, sem viabilizar a identificação da origem ou natureza dos respectivos gastos.
Caso a análise dessas informações genéricas apresente indícios de ilícitos fiscais, a autoridade fiscal poderá requisitar informações e documentos adicionais, mediante instauração de específica fiscalização para a adequada apuração de fatos, conforme prevê o § 4º do art. 5º da LC 105/01.
Essa regra (§ 4º do art. 5º) é ressaltada pelo art. 6º da LC 105/01, segundo o qual o Fisco somente poderá examinar profundamente as informações bancárias quando houver processo administrativo instaurado para esse fim.
Tanto é assim que, ao julgar a ADIN 2.859/DF, o STF ressaltou a imprescindibilidade de prévia intimação do contribuinte quanto ao exame aprofundado de suas movimentações financeiras. Confira-se:
"Assim, a exemplo do que prevê o mencionado decreto federal, a regulamentação da matéria no âmbito estadual e municipal deverá, obrigatoriamente, conter as seguintes garantias: [...] ii) prévia notificação do contribuinte quanto à instauração do processo (leia-se, o contribuinte deverá ser notificado da existência do processo administrativo previamente à requisição das informações sobre sua movimentação financeira) e relativamente a todos os demais atos; [...]"
A esse respeito, o TJ/PI reconheceu a nulidade de auto de infração lavrado a partir da quebra do sigilo bancário, diante da ausência de prévia instauração de específico procedimento administrativo, em nome do contribuinte, para apurar eventuais irregularidades. Confira-se trechos do voto condutor do acórdão:
"No caso em questão, verifica-se que a autuação fiscal, como antes dito, se iniciou com a lavratura do auto de infração (ID 8489.721), que, por sua vez, decorreu de informações prestadas pelas administradoras de cartões de crédito e débito, ou seja, não houve prévia notificação da apelada, o que revela a invalidade de todo o procedimento fiscal.
Em outros termos, evidente que a utilização de dados constantes dos arquivos das operadoras de cartão de crédito/débito não se deu no curso do procedimento administrativo, mas sim consistiu no ponto de partida do próprio levantamento fiscal, no qual foi constatada a infração. [...]
Dessa forma, conclui-se pela nulidade dos autos de infração ora impugnados, ante a ausência de procedimento administrativo prévio à autuação da empresa apelada, conforme entendimento esposado pelo magistrado de origem."
(Apelação 0025196-40.2015.8.18.0140, relator: Des. José Wilson Ferreira de Araújo Júnior, 2ª Câmara de Direito Público, julgado em 7/7/23).
Por essa perspectiva, a legalidade dos autos de infração baseados em informações bancárias é condicionada à prévia instauração de procedimento administrativo destinado a investigar a fundo as movimentações financeiras, de maneira a garantir o rito preconizado pela lei complementar 105/01.