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Cabos e nervos de aço

Em discussão, perante a ABNT – Associação Brasileira de Normas Técnicas -, encontra-se a revisão da norma técnica NBR 6327, que visa estabelecer requisitos técnicos mínimos no que diz respeito aos cabos de aço para uso geral.

12/6/2007


Cabos e nervos de aço

Márcio Costa de Menezes e Gonçalves*

Em discussão, perante a ABNT – Associação Brasileira de Normas Técnicas -, encontra-se a revisão da norma técnica NBR 6327, que visa estabelecer requisitos técnicos mínimos no que diz respeito aos cabos de aço para uso geral.

Todo e qualquer produto que possui norma ou regulamento técnico, de acordo com o Código de Defesa do Consumidor (clique aqui), deve ser monitorado e fiscalizado, uma vez que o principal objetivo de mencionadas normas é dar proteção à saúde e segurança dos consumidores. Da mesma forma, os órgãos responsáveis pelo controle das fronteiras em nosso país, quando do desembaraço aduaneiro, devem observar o atendimento ou não a mencionados dispositivos legais.

Cada país, ao legislar sobre saúde, segurança e meio ambiente, possui autonomia (e não poderia ser diferente) para albergar em seu ordenamento jurídico regras que julguem aplicáveis às suas próprias necessidades e peculiaridades. Neste passo, normas técnicas têm servido para reforçar a soberania de cada país, quando possibilitam a adoção, sob medida, de critérios mínimos voltados à segurança de determinados produtos. O caso dos brinquedos, no Brasil, ilustra bem essa situação. Além dos brinquedos, é lógico, outros produtos precisam ser "controlados", principalmente aqueles que representam riscos aos usuários (trabalhadores), como no caso cabos de aço.

No caso específico dos cabos de aço, um processo de revisão de norma técnica (NBR 6327), que se alonga por mais de um ano, vem sendo debatido no seio da ABNT, junto à Comissão de Estudo Mista. Tal Comissão é constituída por representantes dos fabricantes (três sobreviventes, dos mais de dez fabricantes que existiam no Brasil, ocasionando a perda de aproximadamente 2 mil empregos, em uma década), importadores (estes em número considerável e crescente), representantes de consumidores e os chamados neutros, ou representantes da Academia.

Nas discussões de revisão da referida norma técnica, frise-se, em vigência, muitos avanços técnicos foram conquistados, como, por exemplo, a necessidade de colocação de um fitilho no interior dos cabos de aço, que indica o fabricante e/ou importador daquele determinado produto e o seu telefone de atendimento ao consumidor, até mesmo porque acidentes com cabos de aço ocorrem em nosso país de uma maneira bastante freqüente, e o mínimo seria a identificação da origem de mencionados cabos. O Código de Defesa do Consumidor brasileiro é tido mundialmente como um "Código de Vanguarda", e no caso brasileiro, o avanço da norma técnica de cabos de aço, alinha-se com esta característica inovadora.

Sim, afirma-se que acidentes derivados da má qualidade de cabos de aço colocados em nosso país acontecem com elevada freqüência. Aliás, esta é uma das principais motivações para a existência de uma norma técnica que verse sobre o assunto, até mesmo porque o produto requer atenção, em nível extremo, por suas características de uso. As organizações do trabalho têm verificado que as principais causas de acidentes com cabos de aço, se devem ao uso de materiais inadequados (sem qualidade) e a omissão de inspeção.

A norma brasileira é bastante avançada e tem como modelo a norma internacional ISO, com interessantes evoluções, como o fitilho já mencionado, e a restrição a determinadas bitolas de algumas construções específicas de cabos de aço, que já não se encontram presentes em diversos países da Comunidade Européia, há mais de décadas, devido à sua baixa performance; esta possui influência direta com os problemas relacionados justamente com a segurança.

Recentemente, por pressão de alguns maus importadores, que não demonstram preocupação com a segurança dos produtos que colocam em nosso país, e que começaram a lançar ameaças infundadas contra a ABNT (como denúncia por suposta configuração de barreira técnica) aquela entidade, intimidada, recuou no processo de revisão da norma, colocando, repentinamente, e de forma temerária, para consulta pública, através do Edital 05/2007 (clique aqui) , o cancelamento da norma técnica brasileira que existe há quase três longos anos, e que vem sendo revisada há mais de um ano... O exíguo prazo concedido pela ABNT se encerra no próximo dia 13 de junho, muito curto para a importância do tema e a necessidade de aprofundamento do debate!!!.

Tal situação não poderá prosperar, mas a preocupação é latente, principalmente se levarmos em consideração que mencionado cancelamento poderá abrir nossas fronteiras a toda sorte de produtos sem qualidade, que colocarão em risco a vida de milhares de trabalhadores, principalmente nos canteiros de obras espalhados pelo nosso país, trabalhadores que dependem da qualidade e segurança dos cabos de aço para continuarem vivos e sem riscos de acidentes, que quando não trazem a morte, podem trazer seqüelas irreversíveis. E quem se responsabilizará por isso?

Todas as medidas administrativas e jurídicas já vêm sendo analisadas, e deverão ser adotadas pela sociedade civil organizada, mas decisões políticas podem colocar em risco a soberania de nosso país e a segurança de milhares de trabalhadores.

Não há que se falar em barreira técnica advinda da existência da norma brasileira. O Acordo sobre Barreiras Técnicas da OMC (clique aqui) é categórico ao afirmar que "nada impede que os países tomem medidas necessárias para assegurar a qualidade dos produtos comercializados, a proteção da vida e saúde de sua população, seja ela humana, animal ou vegetal, a preservação do meio ambiente ou para a prevenção de práticas enganosas, desde que não constituam discriminação arbitrária ou injustificável". Proteger a vida e segurança dos nossos trabalhadores não parece nada arbitrário ou injustificável.

Neste passo, aguarda-se que a ABNT cancele imediatamente a consulta pública que versa sobre o cancelamento da norma técnica brasileira de cabos de aço, bem como para que retome o processo de revisão de mencionada norma, atitude que representará um avanço, e não um retrocesso, advindo unicamente de pressões infundadas daqueles grandes distribuidores atacadistas que tentam a todo o custo colocar em nosso país produtos importados baratos e, principalmente sem qualidade.

Espera-se do INMETRO, de igual sorte, a conclusão do processo da regulamentação técnica sobre cabos de aço, que contemple e ratifique todos os avanços conquistados pela norma técnica brasileira, que são adequados à realidade do mercado nacional.

A situação atual faz com que aqueles que prezam pela segurança e qualidade dos cabos de aço tenham que ter, também, nervos de aço para suportar um cenário tão indefinido e preocupante. Ao mesmo tempo, é o momento mais que propício para que a sociedade se manifeste acerca da questão colocada sob a forma de consulta pública, e vote contra o cancelamento da norma brasileira, tendo a consciência de estar preservando a vida de milhares de brasileiros.

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*Advogado do escritório De Vivo, Whitaker e Castro Advogados, ex-Secretário Executivo do Conselho Nacional de Combate à Pirataria, do Ministério da Justiça, e advogado especialista em Propriedade Intelectual e combate às fraudes.

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