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O “laranja” integra a organização criminosa?

Crime evolui com sociedade, gerando organizações mais sofisticadas, infiltrando-se no Estado. Combate requer aprimoramento investigativo para desmantelar estruturas e identificar laranjas.

19/3/2024

O crime é um fator social e, como tal, tende a acompanhar o aprimoramento das relações humanas, tornando-se cada vez mais moderno e engenhoso. Um sinal claro desta evolução nas práticas delitivas é a constituição de organizações criminosas cada vez mais engendradas, com métodos inovadores que dificultam a investigação pelas forças policiais.

Neste sentido, é possível dizer que o delito de organização criminosa ameaça as estruturas do Estado na medida em que adquire perspicácia suficiente para inserir tentáculos nos entes públicos, como forma de robustecer a musculatura de sua influência, além da inserção de interpostas pessoas – conhecidas como laranjas -, que objetivam dificultar a detecção e rastreamento não só do crime em si, mas também de seus lucros.

Portanto, em um contexto de rápida qualificação dos grupos criminosos, também é necessário que as instituições estatais promovam o aperfeiçoamento de suas práticas investigativas, de forma a dificultar a perpetuação do ilicíto, o que faz com que a figura do “laranja” ganhe grande conotação para a própria existência das organizações criminosas.

Isto porque o “laranja” possui diversas funções dentro de uma organização, podendo integra-la ou não, a depender do grau de consciência que possuía acerca da prática delitiva e da intenção (dolo) para a sua consecução.

Acerca disto, o Código Penal Brasileiro (art.29) prevê que incide nas penas do crime aquele que, de qualquer modo, concorre para a sua execução, na medida de sua culpabilidade.

Todavia, é importante asseverar que para que determinada pessoa, ainda que na função de “laranja”, adote a posição de membro de uma organização criminosa, a consciência e vontade de ingressar nas fileiras do crime é indispensável, tendo em vista que não existe, no Brasil, o delito na forma culposa.

Ilustra-se, neste contexto, a situação em que uma pessoa empresta a sua conta bancária para que um conhecido receba transferências, baseada na confiança inerente a uma relação de amizade preexistente e, em seguida, vem a ser investigada por tráfico de drogas em um contexto de organização criminosa, pois os valores recebidos eram oriundos do comércio de entorpecentes.

É possível notar que, sob a ótica apresentada, não haveria qualquer intenção de ocultar os valores advindos de um crime de tráfico, bem como sequer possuía, o “laranja”, a consciência sobre a intenção do agente criminoso e a origem dos valores.

Desta forma, no que pese a conduta tipificar os crimes de organização criminosa e, possivelmente, lavagem de dinheiro, não há que se cogitar desta hipótese se não restasse demonstrada a intenção clara do “laranja” em emprestar suas movimentações bancárias para camuflar a origem do capital e proteger os demais integrantes da empreitada.

Em síntese, apesar da vasta negligência da pessoa que se coloca na posição de interposta (laranja), permitindo que em seu nome sejam praticados diversos ilícitos, é necessário que todo o contexto seja analisado para aferir o grau de concordância que possuía com o crime e, em não havendo, as medidas cíveis utilizadas no processo penal, como o bloqueio de valores, mostram-se suficientes para mitigar os efeitos patrimoniais do delito.

Leonardo Tajaribe Jr.
Advogado Criminalista. Especialista em Direito Penal Econômico (COIMBRA/IBCCRIM). Pós-Graduado em Direito Penal e Processual Penal (UCAM). E-mail: leonardotajaribeadv@outlook.com

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