Observamos com surpresa o recente posicionamento do Superior Tribunal de Justiça Desportiva do Futebol (STJD), que através de uma Medida Inominada Acautelatória, emitiu decisão contra o Sport Club do Recife que resulta no bloqueio de acesso ao público para jogos em casa e impede a participação em partidas como visitante. A penalidade será aplicada até o STJD julgar a denúncia futura a ser apresentada pela Procuradoria da Justiça Desportiva, considerando-se o limite máximo de 10 jogos, conforme o § 1º do artigo 213 do CBJD.
Contextualizando, a punição aplicada pelo STJD ao Sport Recife surge em meio a uma comoção popular, desencadeada pelas imagens de injustificável e inaceitável agressão ao time do Fortaleza Esporte Clube, ocorridas na madrugada do dia 22 de fevereiro de 2024. É importante destacar que esse lamentável incidente ocorreu em uma via pública, mais de 8 quilômetros de distância do estádio onde a partida aconteceu, apesar de a equipe cearense estar sob escolta policial.
A punição do STJD ao Sport Recife se baseia no entendimento de que o clube é responsável pela segurança e integridade de todos os envolvidos no evento esportivo, principalmente no trajeto de ida e volta da praça desportiva. Essa decisão reflete a interpretação atual do tribunal sobre o papel dos clubes em garantir a segurança não apenas dentro do estádio, mas também nas imediações e trajetos relacionados aos eventos esportivos.
No entanto, o rigor desta punição levanta debates sobre os limites da responsabilidade dos clubes em incidentes que ocorrem fora do ambiente estritamente esportivo, mas não só isso. A aplicação desta penalidade também suscita questionamentos sobre a isonomia do STJD, o que acaba gerando a percepção de uma possível disparidade nas decisões do tribunal. Aplicações distintas de punições para eventos semelhantes podem criar uma percepção de rigor excessivo do STJD em alguns casos. Isso pode comprometer a justiça e equidade esperadas no julgamento de infrações disciplinares no futebol brasileiro.
O STJD é uma instituição-chave no cenário esportivo brasileiro, responsável por julgar e decidir questões disciplinares no futebol profissional e amador. Sua importância reside na garantia da integridade das competições, e espera-se que promova uma aplicação equitativa das regras e regulamentos estabelecidos pelas entidades organizadoras. Além disso, o STJD contribui para a profissionalização e transparência no esporte, estabelecendo padrões de conduta e punindo irregularidades para incentivar boas práticas de governança. Sua atuação é crucial para preservar a credibilidade do futebol brasileiro e promover uma cultura de integridade e responsabilidade no meio esportivo.
Criado em conformidade com as diretrizes estabelecidas pelo Código Brasileiro de Justiça Desportiva (CBJD), o STJD tem a responsabilidade de julgar e decidir sobre questões disciplinares, litígios e infrações cometidas no âmbito do futebol profissional e amador no Brasil. Apesar de se esperar que o STJD garanta uma implementação justa das normas e regras definidas por entidades organizadoras, como a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e as federações estaduais, ocasionalmente surgem questionamentos sobre a igualdade e a precisão de suas decisões.
É de se esperar que o tribunal garanta a integridade das competições e preserve os valores éticos e desportivos que regem o esporte, porém, em certas ocasiões, suas decisões parecem gerar controvérsias. Ao aplicar punições, é crucial que o STJD seja imparcial e igualitário. No entanto, em alguns casos, a percepção de desigualdade nas penalidades pode suscitar dúvidas sobre a consistência de suas decisões.
Analisando recentes posicionamentos do STJD em casos similares, notamos como os julgamentos divergem. Há enorme rigor contra um clube, enquanto outros são isentos de responsabilidade. Parece que estamos diante de um rigor punitivo “regionalizado”. Essa disparidade nas decisões do tribunal levanta preocupações sobre a coerência e a imparcialidade do seu julgamento, o que ajudaria a minar a confiança na sua capacidade de aplicar punições de forma justa e equitativa. Essa falta de consistência compromete a credibilidade do sistema de justiça desportiva e reforça a necessidade urgente de revisão e transparência nos processos decisórios do STJD.
Um caso muito semelhante ao que gerou a punição exagerada aplicada ao Sport Recife ocorreu no jogo entre os times do Flamengo e do Atlético-MG, em 13 de julho de 2022, no Maracanã, válido pelas oitavas de final da Copa do Brasil. Na ocasião, torcedores rubro-negros invadiram o estádio e, do lado de fora, apedrejaram o ônibus que transportava a delegação do time mineiro, resultando na quebra de vidros e estilhaços que atingiram jogadores, embora sem maiores ferimentos. Surpreendentemente, o STJD julgou e absolveu o Flamengo de todos estes fatos, alegando que o clube não teve culpa pela atitude dos torcedores de invadirem o estádio, visto que o tumulto ocorreu na área externa, que seria de responsabilidade do Poder Público. Especificamente sobre o apedrejamento do ônibus do Atlético-MG, o STJD considerou que a responsabilidade para coibir tal ação era da Polícia Militar e dos órgãos públicos encarregados da segurança no entorno do Maracanã, e não do clube.
O contraste entre os julgamentos do STJD nos casos envolvendo o Flamengo e o Sport Recife evidencia uma inconsistência preocupante na abordagem do tribunal para casos idênticos, quando envolvem times de maior ou de menor influência política. No caso do Flamengo, mesmo com eventos de violência ocorrendo no entorno do estádio, o STJD adotou uma postura complacente, absolvendo o clube e atribuindo total responsabilidade à segurança pública. Por outro lado, no caso do Sport Recife, onde o incidente isolado ocorreu muito distante da praça desportiva, durante a madrugada e sob escolta policial, o STJD foi rigoroso e responsabilizou o clube pela falha na segurança. Essa discrepância sugere que, enquanto para o clube carioca a segurança é considerada dever do Poder Público, para o Sport Recife a segurança é imputada como de sua responsabilidade. Situações semelhantes, mas com interpretações diferentes.
Esta inconsistência prejudica a credibilidade do sistema de justiça desportiva. A (falta de) equidade na aplicação das penalidades do tribunal é questionada, pois o tratamento diferenciado a casos análogos pode sugerir uma falta de isonomia. A percepção de que alguns clubes são submetidos a um rigor excessivo enquanto outros são isentados da mesma responsabilidade compromete a integridade e a credibilidade do sistema de justiça desportiva, alimentando a desconfiança pública quanto à imparcialidade e equidade nas decisões.
Essa disparidade reforça no imaginário popular o conceito de que forças políticas costumariam interferir no mundo do futebol, distorcendo o curso justo das punições. Quando os julgamentos parecem ser influenciados por interesses externos, seja por pressões políticas ou econômicas, a confiança na integridade do esporte é abalada, minando os valores de justiça e fair play que devem reger o futebol. Assim, é essencial que as instituições desportivas ajam com transparência e imparcialidade, assegurando que todas as equipes sejam tratadas de forma equitativa perante a lei.
Diante da análise desses casos e da percepção de disparidade na aplicação de punições pelo STJD, é evidente a necessidade urgente de revisão e transparência nos processos decisórios do tribunal. A inconsistência nas decisões mina a credibilidade do sistema de justiça desportiva e alimenta a desconfiança pública quanto à imparcialidade e equidade nas punições. A confiança no esporte como um espaço de justiça e integridade é essencial para preservar seus valores fundamentais e garantir a equidade entre todos os participantes. Somente assim é possível garantir a confiança dos torcedores e atletas no sistema de justiça desportiva, fortalecendo cada vez mais os valores éticos e desportivos que devem nortear o futebol brasileiro.