Um tema frequentemente questionado pelos contribuintes é se a confissão de dívida, muitas vezes utilizada pelos Fiscos para adesão a parcelamentos especiais, inibiria a discussão judicial sobre determinado tributo.
Um contribuinte, quando adere a um programa de recuperação de créditos fiscais - Refis, é obrigado a confessar os débitos, tendo em vista a inserção de uma cláusula, por parte dos Fiscos, na adesão ao parcelamento, ou seja, a confissão da dívida, pelo contribuinte, é condição imprescindível para fins de adesão ao parcelamento de débitos tributários. Ou seja, por ser adesão ao parcelamento, o contribuinte não tem margem de negociação das cláusulas, aderindo às cláusulas elaboradas pelo Fisco.
Todavia, não raras vezes, ainda que se parcele o suposto débito, este é fruto de cobranças ilegais ou inconstitucionais.
Cabe ressaltar que muitas vezes o contribuinte adere ao parcelamento diante da necessidade premente de obtenção de certidão negativa de débitos, visando à própria manutenção do seu negócio.
Analisando a impossibilidade de se discutir o suposto débito pelo simples fato de aderir ao parcelamento, ainda que o débito seja ilegal ou inconstitucional, é admitir que a relação jurídico-tributária não se origine de lei, mas sim de um contrato entre as partes. Logo, é evidente a possibilidade de questionamento judicial, justamente pelo fato de a lei ser a norma instituidora de um tributo, e não um contrato entre o Fisco e o contribuinte.
O STJ, ao julgar o Tema 375 dos recursos repetitivos, entendeu que “é possível o questionamento judicial no tocante à relação jurídico-tributária, como, por exemplo, a legitimidade da norma instituidora do tributo. Isso porque a obrigação tributária exsurge da imponibilidade da norma jurídico-tributária, vale dizer, não tem natureza contratual, mas ex lege”
Adotando as lições de Leandro Paulsen, o STJ entende que “a confissão da dívida não inibe o questionamento judicial da obrigação tributária, no que se refere aos seus aspectos jurídicos. Quanto aos aspectos fáticos sobre os quais incide a norma tributária, a regra é que não se pode rever judicialmente a confissão de dívida efetuada com o escopo de obter parcelamento de débitos tributários.”
Ou seja, os aspectos jurídicos da cobrança podem ser questionados judicialmente, justamente pela norma instituidora da relação jurídico-tributária ser a lei. O fato de o contribuinte ter confessado o débito não descaracterizaria uma inconstitucionalidade da relação jurídico-tributária, que pode ser reconhecida posteriormente à confissão. Veja-se com mais detalhes o que diz o STJ:
“Não se está com isso afirmando a absoluta inviabilidade de questionar as dívidas tributárias objeto de confissão ou de parcelamento. Conforme anotou Leandro Paulsen, com base em significativa resenha jurisprudencial e doutrinária, "a confissão não inibe o questionamento da relação jurídico-tributária". Todavia, "isso não significa que a confissão seja desprovida de valor. Terá valor, sim, mas quanto aos fatos, que não poderão ser infirmados por simples reconsideração do contribuinte, mas apenas se demonstrado vício de vontade. A irrevogabilidade e a irretratabilidade terá apenas essa dimensão. Assim, e.g., se confessada dívida relativamente a contribuição sobre o faturamento, será irrevogável e irretratável no que diz respeito ao fato de que houve, efetivamente, o faturamento no montante consignado; entretanto, se a multa era ou não devida, se a legislação era ou não válida, são questões que poderão ser discutidas”.
A legitimidade das fontes normativas que disciplinam a sua instituição é, por isso mesmo, passível de controle pelo Poder Judiciário. Todavia, no que se refere às circunstâncias fáticas sobre as quais incidem as normas tributárias, essas certamente são colhidas pela força vinculante da confissão de dívida e da cláusula de irretratabilidade.
Por isso, tendo em vista a natureza institucional (e não contratual) da relação jurídico-tributária, incapaz, por isso mesmo, de criação por ato de vontade, seja bilateral, seja unilateral, como é o caso dessa confissão de dívida, é cabível o controle, pelo Poder Judiciário, da legitimidade das fontes normativas que disciplinam a sua instituição, mesmo quando há confissão de dívida.
Adotando este entendimento, a 2ª turma da 2ª câmara Cível do TJ/TO, reconheceu o indébito tributário após o contribuinte aderir a um parcelamento, confessando o débito tributário, determinando-se que o Estado restitua o valor recolhido.