Ao longo de seus 100 anos de existência, a Corte de Arbitragem da International Chamber of Commerce tem desempenhado um papel fundamental na promoção e segurança jurídica do comércio internacional. Seus Regulamentos de Arbitragem estabelecem um mecanismo único de escrutínio das sentenças arbitrais antes de serem publicadas. O escrutínio das sentenças tem sido um pilar fundamental da arbitragem da ICC, desde a sua inserção no Regulamento de Arbitragem de 19271.
No regulamento de arbitragem mais recente, de 2021, o mecanismo de escrutínio está presente no artigo 34, que prevê: “Before signing any award, the arbitral tribunal shall submit it in draft form to the Court. The Court may lay down modifications as to the form of the award and, without affecting the arbitral tribunal’s liberty of decision, may also draw its attention to points of substance. No award shall be rendered by the arbitral tribunal until it has been approved by the Court as to its form”.
A previsão do escrutínio pela ICC, que a verifica quanto à sua forma, sem imiscuir no mérito do litígio, também está presente nos regulamentos de arbitragem anteriores, como o artigo 27 do regulamento 1998, artigo 33 do regulamento 2012 e artigo 34 do regulamento 2017. O mecanismo é um exemplo de como a ICC está comprometida em garantir a qualidade e a confiabilidade da arbitragem comercial.
Alguns dos benefícios do de escrutínio da sentenças arbitrais incluem a garantia da qualidade das sentenças da ICC, a confiança das partes, o aumento da probabilidade de execução da sentença e o prestígio da Corte de Arbitragem como principal instituição internacional de arbitragem comercial. A verificação inclui a observação da estrutura da sentença em seus aspectos de forma, através do checklist que analisa a presença dos tópicos abaixo.
A primeira parte diz respeito às generalidades, como menção do número de identificação do procedimento constando na folha de rosto; título da sentença arbitral, se interlocutória, parcial ou fina; parágrafos e páginas numeradas; índice; lista de abreviaturas; e traduções. Além disso, também é verificado se há indicação da versão aplicável do regulamento de arbitragem da CCI, que podem ser de 1998, 2012, 2017 ou 2021.
A segunda parte é sobre a identificação das partes, de seus representantes e dos árbitros que compõem o procedimento. Nela, devem estar contidos os nomes e endereços das partes; esclarecimentos acerca de qualquer divergência entre os participantes do procedimento e os signatários do contrato; e endereços dos representantes e dos árbitros.
A terceira parte, sobre a convenção de arbitragem e o direito aplicável, analisa se a sentença menciona o texto integral da convenção de arbitragem e eventuais aditamentos; indicação exata das partes e dos signatários da convenção de arbitragem; e menção à cláusula que dispõe acerca do direito aplicável ao litígio.
A quarta parte é o histórico do procedimento arbitral. Dela devem constar o resumo de todas as etapas do procedimento; menção das eventuais decisões da Corte da ICC sobre insurgências contra existência, validade ou escopo da convenção de arbitragem, sede da arbitragem ou quantidade de árbitros; constituição do tribunal arbitral e indicação do presidente; prazo para entrega da Sentença Arbitral final, incluindo prorrogações.
A quinta parte diz respeito à competência. Quando a jurisdição do tribunal arbitral for contestada ou quando existir no procedimento parte que não foi signatária da convenção de arbitragem, a sentença deverá incluir a decisão do tribunal sobre sua própria competência ou declarar porque isso não é necessário.
A sexta parte escrutina os custos da arbitragem nas sentenças arbitrais finais. É verificada a existência de menções aos custos do procedimento fixados pela Corte da ICC e custos advocatícios de cada parte.
A sétima e última parte refere-se à seção dispositiva da sentença arbitral. Verifica-se se a sentença inclui uma parte que menciona todas as ordens, sejam declaratórias, condenatórias ou constitutivas; se a sentença arbitral considera todos os pedidos das partes; se estão claras a sede da arbitragem, data da sentença e as assinaturas dos árbitros.
Após o checklist, se a Corte considerar que a sentença arbitral não cumpre os requisitos de qualidade, ela pode determinar que a sentença seja corrigida. Além dessas questões, outras podem ser levantadas pela Corte da ICC, já que o formulário do escrutínio não é um documento exaustivo.
Em conclusão, o mecanismo de escrutínio das sentenças arbitrais da ICC é um importante elemento de garantia da qualidade e da confiabilidade da arbitragem comercial que corre na Câmara. Ele contribui, sobretudo, para a execução das sentenças, ao verificar elementos formais que são tidos como imprescindíveis para validade das sentenças arbitrais em diversas leis de arbitragem de vários ordenamentos jurídicos nacionais.
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1 FLECKE-GIAMMARCO, Gustav. The ICC Scrutiny Process and Enhanced Enforceability of Arbitral Awards, Journal of Arbitration Studies, v. 24, n. 3, p. 47-77, 2014.