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Intolerância religiosa, microagressões e ambiente do trabalho

Em meio a tempos tumultuados, o aumento do antissemitismo no Brasil após conflitos em Israel destaca a urgência de combater a intolerância religiosa. Ataques indiscriminados refletem a necessidade de compreensão e diálogo para superar esse cenário de insegurança.

2/2/2024

No último dia 21 de janeiro foi celebrado o Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa e, mais do que nunca, cabe refletir sobre essa data.

Estamos vivendo tempos difíceis em que claramente a avalanche diária de notícias sobre guerras, terrorismo e questões geopolíticas induz todos a ter opinião sobre tudo o que se passa no mundo, porém, muitas vezes sem qualquer profundidade. Nesse caos, rapidamente as opiniões se polarizam e a confusão se instaura e gera atritos entre amigos, conhecidos e colegas de trabalho.

Nessa linha, o mundo tem vivenciado inúmeros casos de antissemitismo após o início da guerra de Israel contra o grupo terrorista Hamas (segundo levantamento da Confederação Israelita do Brasil e da Federação Israelita do Estado de São Paulo, o antissemitismo aumentou em 1000% no Brasil desde outubro de 2023). Ataques ao governo israelense rapidamente viram atos ofensivos a pessoas da religião judaica. E desconhecimento sobre as questões que envolvem a Palestina viram ataques tanto a comunidade judaica como muçulmana, a depender do interlocutor. Em poucos meses, um sentimento de insegurança diante de tanta intolerância se instalou notadamente nessas duas comunidades e não se sabe como tal mal será desfeito.

Confundir governos com religião, liberdade de crença e religião com decisões políticas, desqualificar pessoas em razão de sua religião, relativizar ofensas e ataques terroristas quando dirigidos a pessoas de determinada religião, responsabilizar pessoas de uma religião por decisões tomadas por órgãos internacionais, negar fatos comprovados historicamente (como o Holocausto), ridicularizar crenças e datas religiosas, dentre outros atos desrespeitosos são comportamentos absolutamente inconcebíveis e danosos.

É necessário atentar para esse tema no ambiente de trabalho, pois os atos que traduzem a intolerância religiosa estão espalhados no dia a dia, em todos os lugares. Ser alvo de críticas, ser desrespeitado em razão das crenças e religiões (ou mesmo ausência delas) é algo muito mais recorrente do que se imagina e cabe atenção ao tema, tanto para se evitar ambientes hostis de trabalho, como para prestigiar a tão importante diversidade em todos os seus aspectos e, não menos importante, a reputação do empregador, que facilmente pode se ver envolvido em situações de racismo religioso (decorrente de atos de preconceito contra religiões de matriz africana), antissemitismo, islamofobia, preconceitos contra evangélicos e outras, em razão de comportamentos inadequados de seus empregados ou prepostos. Levantamento feito pelo Instituto de Defesa dos Direitos das Religiões Afro-Brasileiras mostrou o aumento expressivo de ações envolvendo o tema da intolerância religiosa no Brasil nos últimos 15 anos.

Cabe aos empregadores o combate não apenas dos casos de flagrante desrespeito à diversidade religiosa e aos crimes de ódio, como aos casos menos óbvios, travestidos por microagressões que são comuns e tão nocivas quanto os casos de assédio moral. Frases como: “você não tem cara de budista” (como se houvesse um modelo padrão de pessoa para determinada religião); “você é árabe, portanto, é muçulmano” (como se a procedência familiar determinasse a religião); “precisa encontrar Jesus” (como se uma religião fosse superior a qualquer outra e/ou coubesse uma conversão a alguma religião); “todo judeu é rico” (atribuindo uma condição econômica a pessoas de determinada religião); “esse colar é de macumbeiro” (desrespeitando adereços e  tratando genericamente de religiões de matriz africana, com tom pejorativo), dentre tantas outras são típicas microagressões que não podem ser admitidas.

Nessa linha, treinamentos para educar os empregados a respeito da multiplicidade de religiões existentes e suas peculiaridades, bem como sobre questões geopolíticas, que não se confundem com questões religiosas e sobre estereótipos que devem ser repelidos nas falas e comportamentos do dia a dia, devem estar na pauta dos departamentos de recursos humanos e comitês de diversidade que muitas empresas possuem. Isso porque, a prevenção a todo e qualquer comportamento desrespeitoso e o fomento à liberdade religiosa seguem sendo as melhores formas para criar e manter um ambiente saudável de trabalho.

Cibelle Linero
Sócia da área Trabalhista do BMA Advogados.

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