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Acidentes de trabalho na construção civil: responsabilidade do empregador, seus direitos e proteções

Setor da Construção Civil no Brasil enfrenta altos índices de acidentes de trabalho, subestimados devido a subnotificações. Em 2023, registrou mais de 20 mil afastamentos previdenciários, evidenciando sua periculosidade, especialmente em estados como SP e MG.

5/1/2024

A Construção Civil é um dos setores líderes em acidentes de trabalho, acarretando perdas econômicas substanciais, conforme evidenciado pela Organização Internacional do Trabalho - OIT. O Brasil, figurando entre os países mais perigosos para trabalhadores, testemunha um acidente de trabalho a cada 51 segundos, com mais de 600 mil incidentes somente no último ano, segundo dados do Ministério Público do Trabalho - MPT1. Esses dados, porém, subestimam a realidade, pois muitos acidentes não são oficialmente reportados.

Especificamente, no setor a construção civil, o ano de 2023 testemunhou 20.224 afastamentos previdenciários, consolidando-se como uma das atividades mais perigosas para os trabalhadores, ficando apenas atrás do transporte rodoviário de cargas em termos de risco de mortalidade. São Paulo lidera o cenário com 204.157 acidentes, seguido por Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná.

Ao analisar as notificações de acidentes de trabalho neste, entre os principais agentes causadores destacam-se: queda de altura (36%), impacto contra pessoa/objeto (18,7%), veículo de transporte (13,2%), queda do mesmo nível (8,79%), máquinas e equipamentos (7,69%).

Quanto às lesões mais frequentes, observam-se: fraturas (25,4%), cortes, lacerações, feridas contusas, puncturas (18,9%), lesões imediatas (11,5%), escoriações, abrasões (9,45%), contusões, esmagamentos (8,26%).

No que diz respeito às partes do corpo mais comumente afetadas entre os trabalhadores acidentados na construção civil em 2022, destacam-se dedo (20,8%), pé (12%), mão (6,77%), perna (4,98%) e joelho (4,5%).

Estes dados reforçam a necessidade de medidas preventivas e treinamentos específicos para proteger os trabalhadores, já que o descumprimento das normas de segurança e as más condições laborais continuam a ser as principais causas desses acidentes.

A jurisprudência e legislação trabalhista considera a construção civil uma atividade de risco, o que significa que o empregador pode ser responsabilizado independentemente

de culpa em casos de acidentes. Isso abre espaço para a aplicação da responsabilidade objetiva do empregador, obrigando-o a reparar os danos, inclusive por danos morais, materiais e estéticos.

Os danos materiais compreendem o reembolso integral das despesas médicas ao longo do tratamento, além de uma compensação financeira pela perda ou diminuição comprovada da renda. Em situações mais graves, essa compensação pode evoluir para uma pensão vitalícia, sendo concedida diante de lesões permanentes que impossibilitem o retorno ao trabalho ou resultem em uma redução parcial da condição física, limitando a capacidade de exercer a profissão.

Em caso de falecimento do empregado, os herdeiros também têm direito a uma indenização por dano material, na forma de pensão mensal. Essa pensão corresponde aos rendimentos que a vítima recebia no momento do acidente, conforme estabelecido no art. 950 do Código Civil.

Os danos morais, por sua vez, referem-se ao impacto emocional e psicológico decorrente do acidente. Esta categoria de danos abarca as repercussões nas esferas emocionais e mentais da vítima, refletindo-se em sofrimento, angústia e desequilíbrio psicológico após o evento adverso. É importante considerar os efeitos não apenas físicos, mas também psíquicos, que podem persistir a longo prazo, influenciando a qualidade de vida e o bem-estar do indivíduo afetado pelo ocorrido.

Ademais, em situações de lesões desfiguradoras, como cicatrizes e amputações, há direitos específicos conhecidos como dano estético, os quais devem ser demandados pelo trabalhador acidentado para garantir a devida reparação.

Além disso, é essencial que trabalhadores tenham a ciência de que durante o afastamento pelo INSS por acidente de trabalho, o empregador não pode ter cortados seus benefícios essenciais, como vale alimentação e plano de saúde, a fim de que tenha garantido seu reestabelecimento adequado.

Outro ponto importante é que as doenças ocupacionais têm os mesmos direitos de indenização que os acidentes de trabalho. Em 2022, doenças como osteomusculares e do tecido conjuntivo foram a segunda maior causa de afastamento na construção civil, evidenciando que os riscos aos quais os trabalhadores do setor estão expostos ultrapassam os acidentes diretos. Riscos ergonômicos, ausência de Equipamentos de Proteção Individual - EPI adequados, movimentos repetitivos, excesso de peso e outros fatores são comuns nesse ambiente, contribuindo para o desenvolvimento de doenças ocupacionais. Essa realidade reforça a importância de considerar os impactos das condições laborais na saúde dos trabalhadores.

É vital que os trabalhadores da construção civil estejam cientes desses direitos e busquem apoio legal em casos de acidentes laborais, pois a legislação prevê essas medidas para assegurar a proteção e reparação adequada aos trabalhadores afetados. A prevenção, conhecimento e ação são fundamentais para transformar esse cenário desafiador e promover ambientes de trabalho mais seguros e saudáveis.

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1 O Observatório de Segurança e Saúde no Trabalho, criado pela iniciativa SmartLab de Trabalho Decente em colaboração com pesquisadores da Faculdade de Saúde Pública da USP, é uma ferramenta desenvolvida no âmbito do projeto "Acidente de Trabalho: da Análise Sócio Técnica à Construção Social de Mudanças". Esta ferramenta, do Ministério Público do Trabalho, visa simplificar o acesso a uma gama diversificada de informações de bancos de dados e anuários governamentais, oferecendo estatísticas e indicadores de maneira integrada e sinérgica. Isso proporciona uma pesquisa mais fácil e compreensão aprofundada sobre o tema, acelerando o processo de tomada de decisão. Disponível em:  https://smartlabbr.org/.

Antonia de Maria Ximenes Oliveira
Advogada especializada em Direito do Trabalho, Diretora Jurídica do SPC/RJ; Delegada da Comissão de Prerrogativas da OAB/RJ; possui especializações em Direito do trabalho como MBA em Acidente de trabalho/doenças ocupacionais, e em Direito Constitucional e Direitos Humanos - pela Universidade de Coimbra/PT.

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