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Herança digital e o direito à personalidade: bens de valor sentimental no ciberespaço

A herança digital, composta por bens intangíveis de valor sentimental, como fotos e conversas online, é um tema em ascensão no direito sucessório, carecendo de legislação específica para regulamentar acessos e direitos hereditários.

20/12/2023

Uma das poucas certezas da vida é a morte. O patrimônio do falecido muitas vezes é motivo de litígios entre herdeiros. Isso não é novidade.

Mas e o conteúdo intangível deixado pelo falecido? A chamada herança digital não possui valor econômico, mas tem uma enorme importância sentimental. Os bens digitais possuem uma natureza estritamente pessoal. Como exemplos de conteúdos digitais tem-se as fotos salvas na nuvem, conversas com amigos íntimos nas redes sociais, contas de e-mails, aplicativos, entre outros.

Em que pese o avanço da tecnologia tem se tornado um tema cada vez mais discutido, ainda não há lei específica a respeito do direito sucessório de conteúdos digitais e respectivos acessos.

Contudo, é possível se resguardar por meio do testamento (manifestação de última vontade), previsto no Código Civil. Ou seja, o testamentário pode deixar registrado sua vontade, nesse caso especifico, de quem está autorizado a ter acesso aos conteúdos deixados em computador, celular e demais dispositivos móveis.

O compartilhamento de dados vai além da etimologia “herança digital”. Seria possível dizer que se trata de direito à personalidade, o qual é protegido pela Carta Magna e também legitimado no Código Civil. Portanto, mesmo pós mortem, alguns direitos da personalidade do falecido continuam ou deveriam continuar produzindo efeitos.

Os três principais pontos em questão são: a preservação da privacidade e intimidade do de cujus, bem como de quem ele entrou em contato; a inviabilidade dos herdeiros se envolverem e tomarem partido de conflitos personalíssimos; e a violação à proteção dos dados.

Quanto ao terceiro ponto supracitado, a lei geral de proteção de dados (lei 13.709/18) estabelece que todos os dados pessoais só podem ser consultados com a anuência do usuário. Mas é preciso inovar ainda mais, trazendo hipóteses de tratamento de informações em caso de eventual sucessão.

O primeiro passo para definir regras a respeito da transmissão e gerenciamento de dados após a morte já foi dado, por meio do PL 1689/21, que altera a lei 10.406/02. Porém, ainda está em tramitação na Câmara dos Deputados.

Acredita-se que após a aprovação e sanção do referido projeto e com o aumento de ferramentas de inteligência artificial que buscam eternizar a presença do indivíduo, muitas dificuldades enfrentadas até então serão solucionados. E, assim como temos a liberdade de escolher sobre o patrimônio, talvez será possível definir, com a ajuda dos recursos tecnológicos, qual parte da vida privada pode ser partilhada e acessada por terceiros.

Thais Paiva
Jornalista. Advogada. Pós graduanda em direito digital.

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