Tendo em vista a quebra da Petrobrás com o advento do episódio que ficou conhecido como “Petrolão”, o presidente Michel Temer sancionou a lei 13.303 de 30 de junho de 2016, conhecida como Lei das Estatais, adotando medidas para fortalecer o compliance e a governança nas empresas do Estado (empresas públicas e sociedades de economia mista).
O art. 17 da Lei estabelece os seguintes requisitos mínimos para a indicação para os cargos de diretor e demais cargos nos seguintes termos:
“Art. 17. Os membros do Conselho de Administração e os indicados para os cargos de diretor, inclusive presidente, diretor-geral e diretor-presidente, serão escolhidos entre cidadãos de reputação ilibada e de notório conhecimento, devendo ser atendidos, alternativamente, um dos requisitos das alíneas “a”, “b” e “c” do inciso I e, cumulativamente, os requisitos dos incisos II e III:
I - ter experiência profissional de, no mínimo:
a) 10 (dez) anos, no setor público ou privado, na área de atuação da empresa pública ou da sociedade de economia mista ou em área conexa àquela para a qual forem indicados em função de direção superior; ou
b) 4 (quatro) anos ocupando pelo menos um dos seguintes cargos:
1. cargo de direção ou de chefia superior em empresa de porte ou objeto social semelhante ao da empresa pública ou da sociedade de economia mista, entendendo-se como cargo de chefia superior aquele situado nos 2 (dois) níveis hierárquicos não estatutários mais altos da empresa;
2. cargo em comissão ou função de confiança equivalente a DAS-4 ou superior, no setor público;
3. cargo de docente ou de pesquisador em áreas de atuação da empresa pública ou da sociedade de economia mista;
c) 4 (quatro) anos de experiência como profissional liberal em atividade direta ou indiretamente vinculada à área de atuação da empresa pública ou sociedade de economia mista;
II - ter formação acadêmica compatível com o cargo para o qual foi indicado; e
III - não se enquadrar nas hipóteses de inelegibilidade previstas nas alíneas do inciso I do caput do art. 1o da Lei Complementar no 64, de 18 de maio de 1990, com as alterações introduzidas pela Lei Complementar no 135, de 4 de junho de 2010.”
O parágrafo 2º desse art. 17 vedou a indicação para o Conselho de Administração e para a Diretoria:
“I - de representante do órgão regulador ao qual a empresa pública ou a sociedade de economia mista está sujeita, de Ministro de Estado, de Secretário de Estado, de Secretário Municipal, de titular de cargo, sem vínculo permanente com o serviço público, de natureza especial ou de direção e assessoramento superior na administração pública, de dirigente estatutário de partido político e de titular de mandato no Poder Legislativo de qualquer ente da federação, ainda que licenciados do cargo;
II - de pessoa que atuou, nos últimos 36 (trinta e seis) meses, como participante de estrutura decisória de partido político ou em trabalho vinculado a organização, estruturação e realização de campanha eleitoral;
III - de pessoa que exerça cargo em organização sindical;
IV - de pessoa que tenha firmado contrato ou parceria, como fornecedor ou comprador, demandante ou ofertante, de bens ou serviços de qualquer natureza, com a pessoa político-administrativa controladora da empresa pública ou da sociedade de economia mista ou com a própria empresa ou sociedade em período inferior a 3 (três) anos antes da data de nomeação;
V - de pessoa que tenha ou possa ter qualquer forma de conflito de interesse com a pessoa político-administrativa controladora da empresa pública ou da sociedade de economia mista ou com a própria empresa ou sociedade.
§ 3º A vedação prevista no inciso I do § 2º estende-se também aos parentes consanguíneos ou afins até o terceiro grau das pessoas nele mencionadas.”
Só que na calada da noite do dia 13 de dezembro de 2022 a Câmara dos Deputados aprovou o PL 2896/22 reduzindo a quarentena de 36 meses para apenas 30 dias, mediante alteração dos arts 17 e 93 da lei 13.303/16.
Em 17 de março de 2023 o Ministro Ricardo Lewandowski, antes de deixar a Corte Maior, proferiu decisão monocrática na ADIn 7331 desobrigando a observância da quarentena de 36 meses.
Ou seja, antes mesmo da conversão do projeto legislativo aprovado pela Câmara em lei, a nova regra das estatais vem sendo aplicada.
Como o estatuto da Petrobrás, está de acordo com a lei vigente, lei 13.303/16, a Assembléia Geral da Petrobrás, realizada em 30 de novembro de 2023, aprovou, por maioria de 58%, a reforma estatutária para retirar a quarentena de 36 meses abrindo o caminho para o enfraquecimento do compliance e da governança nas empresas estatais.
O Presidente da Petrobrás declarou que essa proibição nem precisaria estar no estatuto da empresa, porque reflete a proibição legal que no seu entender não mais existe, apesar de o projeto legislativo aprovado pela Câmara não ter sido sancionado pelo Executivo.
O que existe até hoje é uma mera decisão monocrática do Ministro Ricardo Lewandowski com fundamento no projeto legislativo em tramitação.
Contudo, o Tribunal de Contas da União concedeu medida liminar para suspender a aplicação do estatuto na parte que eliminou a quarentena de 36 meses, no uso de suas atribuições constitucionais (art. 71 da CF).
Está com inteira razão o TCU, pois aquela decisão monocrática do ministro Lewandowski suspendendo a aplicação da quarentena de 36 meses precisa ser apreciada pelo Plenário do STF que deve guiar-se pela texto legislativo vigente.
Estranho é o momento que estamos vivendo em termos de normalidade institucional, ou seja, um projeto legislativo em tramitação prevalece sobre a lei objeto de alteração parcial por chancela de um ministro do STF. É a subversão do direito em todos os sentidos!