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A jurisprudência do TST sobre a concessão de stock options

Matéria ainda controvertida na Justiça do Trabalho, é necessário a análise quanto a natureza jurídica das stock options, muitas vezes, matéria de recurso perante o TST.

8/12/2023

INTRODUÇÃO

Com o avanço do capitalismo e da concorrência entre as sociedades empresariais, as grandes empresas passaram a disputar não só espaço no mercado, mas como também profissionais do mais alto nível de qualificação, a ponto de que participação nos lucros e resultados - PLR’s, além dos altos salários já não era suficiente para reter bons profissionais.

Passou-se a ser necessário um sistema recompensador e de longo prazo. Surgem então os planos de stock options, que, segundo Alice Monteiro de Barros (2007):

[...] constituem um regime de compra ou de subscrição de ações e foram introduzidas na França, em 1970, cujas novas regras encontram-se na lei 420/01. Não se identificam com a poupança salarial. O regime das stock options permite que os empregados comprem ações da empresa em um determinado período e por preço ajustado previamente. Se o valor da ação ultrapassa o preço, o beneficiário obtém lucro e, em consequência, duas alternativas lhe são oferecidas: revender de imediato a mais valia ou guardar os seus títulos e se tornar um empregado acionista.

Em outras palavras, as stock options podem ser entendidas como sendo um sistema de incentivo de recompensas financeiras aos profissionais responsáveis pelos rumos da companhia, ou seja, oferecer aos altos cargos a opção de compra de ações da empresa em um valor inferior e mais vantajoso ao do mercado.

Previsto na lei 10.101/00, a participação nos lucros e resultados, comumente concedido aos empregados, afasta a incidência de encargos trabalhistas e previdenciários e descaracteriza a habitualidade a tais pagamentos, o que evita a incorporação de tais verbas no salário.

Previstas na lei 6.404/76 - lei de Sociedade Anônima -, as stock options ainda não possuem legislação específica sobre o tema, o que leva a um debate intenso sobre a matéria, ficando a cargo da jurisprudência e dos debates acadêmicos o auxílio em uma melhor compreensão do instituto, principalmente no que tange à natureza remuneratória das stock options.

1. CONSIDERAÇÕES ACERCA DAS STOCK OPTIONS

No universo acadêmico brasileiro, não é fácil encontrar alguma doutrina jurídica que trate especificamente sobre as stock options. Na tentativa de suprir tal necessidade, surgem os artigos acadêmicos abordando tal tema relacionado com as mais diversas matérias.

De acordo com Brian J. Hall, em seu artigo publicado pela Universidade de Harvard, até pouco tempo atrás, a maior parte da remuneração se dava em dinheiro, na forma de salários e bônus, sendo a opção de compra de ações apenas a nota de rodapé. Agora em crescimento exponencial, as concessões de opções de ações passaram a dominar os salários de executivos nos EUA:

O principal objetivo da concessão de opções de ações é, evidentemente, vincular a remuneração ao desempenho – garantir que os executivos lucrem quando as suas empresas prosperam e sofram quando fracassam. Muitos críticos afirmam que, na prática, as concessões de opções não cumpriram esse objetivo. Os executivos, argumentam eles, continuam a ser recompensados ??tão generosamente pelo fracasso como pelo sucesso. (Hall, Brian J, 2000)

Em agosto de 2023 foi aprovado no Senado Federal o PL 2.724/22, Marco Legal do Stock Options, a primeira legislação que versa especificamente sobre o instituto jurídico da concessão de opção de compra de ações (Stock Options), porém ainda não está em vigor.

Mauricio Godinho (2012) busca conceituar o Stock Option como um mecanismo no qual a sociedade anônima empregadora estabelece a possibilidade de seus administradores ou empregados adquirirem ações da respectiva companhia, cotadas em bolsas de valores, em condições relativamente mais vantajosas do que a simples aquisição diversa e à vista no mercado versátil. Exercendo a opção, o trabalhador se torna proprietário de certo lote de ações, podendo vendê-lo oportunamente no mercado acionário observada, na época, a cotação encontrada no pregão.

O parágrafo único do art.2º do referido PL, bem como a própria lei 6.404/76 - lei das Sociedade Anônimas - e o Conselho de Administração de Recursos Fiscais - CARF, estabelece que a concessão de opção de compra de ações possui natureza completamente mercantil, discussão essa que foi debatida durante muito tempo em ações judiciais envolvendo o Instituto, principalmente no que se refere à integração à remuneração do empregado.

Portanto, 47 anos após a promulgação da lei das S.A e menos de 1 ano após a aprovação do Marco Legal do Stock Option, é de suma importância analisar como o TST tem decidido acerca das stock options, principalmente no que se refere à natureza jurídica de tal instituto, uma vez que impacta diretamente na aplicação do stock option enquanto como remuneração flexível aos empregados.

2. A STOCK OPTION E SUA NATUREZA NÃO SALARIAL

Sem sombra de dúvidas, a concessão de stock options é uma ação com efeitos bilaterais, afetando empresa e empregado, de modo a impactar positivamente os dois polos. A empresa é beneficiada no tocante à retenção de um funcionário/colaborador importante, de modo a incentivá-lo, contribuindo para a cultura da empresa e consequentemente, com uma equipe motivada, os resultados são alavancados.

Para os colaboradores, uma motivação, que, apesar de depender de uma variável, ou seja, dependente do cenário da companhia em momento posterior, permanece sendo de suma importância para fazer com que ele não queira sair, mas que se mantenha retido e incentivado.

O objetivo do pagamento por meio de ações é estabelecer um horizonte maior para os gestores da companhia, criando um alinhamento de interesses com os acionistas, e um mecanismo para retenção e motivação. Como resultado desse plano de incentivo, os colaboradores passam a incluir-se como parte da gestão da empresa, o que contribui para a motivação e para o evidente aumento de produção, o que gera maiores lucros para as organizações. Sua utilização resulta em produção extra, o que evidencia que os colaboradores estão se conscientizando de que parte do resultado será revertida em remuneração. (Krauter, 2006)

O CARF já firmou posicionamento no sentido de que os planos de stock options são mercantis na sua origem, mas, caso não sejam identificados elementos próprios dessa natureza (como a assunção de risco, a onerosidade e a voluntariedade da adesão ao plano), ter-se-ia então natureza remuneratória para fins tributários.

Nota-se que se trata de uma opção, ou seja, é facultativo ao empregado exercer ou não, além disso, não se trata de uma contraprestação do trabalho prestado, ou seja, não possui onerosidade, além disso, caso opte por exercer a opção de compra, ainda corre o risco de haver uma oscilação, podendo até sair no prejuízo em relação ao preço exercido na compra.

Diante da imprevisibilidade do acréscimo de patrimônio pelo empregado, faz-se completamente injusto e causaria instabilidade jurídica conceder natureza salarial ao instituto.

3. O TST E STOCK OPTIONS

Matéria ainda controvertida na Justiça do Trabalho de 1º e 2º Grau, a natureza jurídica das stock options, muitas vezes, é matéria de recurso perante o TST, em busca de uma decisão final quanto à integração ou não de tal parcela à remuneração dos empregados. Nesse sentido, faz-se necessário analisar qual o entendimento atual do TST no que se refere à tal temática.

Para tanto, mediante termo de busca “Stock Options” no site do TST, com filtro de acórdãos proferidos nos últimos 5 anos, foi possível extrair 50 decisões colegiadas em que se discutiam as Stock Options, desde sua integração até alteração de cláusulas relativas a ela durante o contrato de trabalho.

Ao longo da pesquisa, foi possível observar que, em análise dos acórdãos proferidos, todos aqueles que discutiam a integração ou não das stock options à remuneração do empregado entenderam pela não integração desta, pois na verdade, se trataria de verba de natureza indenizatória, estando ausente qualquer espécie de violação a preceitos legais. Tal entendimento pode ser extraído dos seguintes inteiro teor:

Por fim, no que tange às opções por compras de ações (stock options), este Relator esclareceu que, conforme o entendimento sedimentado por esta Justiça Especializada, como regra geral, são parcelas econômicas vinculadas ao risco empresarial e aos lucros e resultados do empreendimento. Desta forma, embora a possibilidade da compra e venda de ações decorra do contrato de trabalho, o obreiro não possui garantia de obtenção de lucro, podendo este ocorrer ou não, por consequência das variações do mercado acionário, consubstanciando-se em vantagem eminentemente mercantil. Assim, indene de dúvidas que as stock options não se enquadram no conceito, ainda que amplo, de salário ou remuneração. A circunstância de serem suportadas pelo próprio empregado, mesmo que com preço diferenciado fornecido pela empresa, mais ainda afasta a novel figura da natureza remuneratória prevista na CLT e na Constituição Federal, não havendo de se falar em alterações lesivas do contrato de trabalho. (RR-114-38.2014.5.02.0075, 2a Turma, Ministro Jose Roberto Freire Pimenta, DEJT 12/8/22).

Por fim, com relação ao tema stock options – natureza jurídica, não se vislumbra violação do artigo 457, §1º, da CLT. É que, a par dos contornos nitidamente fático-probatórios que envolvem a questão da natureza jurídica das stock options, e que inviabilizam o seguimento do recurso de revista, a teor da Súmula nº 126 do TST , o Tribunal Regional, soberano na análise do conjunto fático probatório dos autos, consignou expressamente que " a importância percebida pelo empregado a título de rendimento, em razão do investimento feito no mercado de capitais, não se enquadra em nenhuma das parcelas de natureza remuneratória dispostas nos arts. 457 e 458 da CLT ", e que " O contrato de oferta de compra de ações é, portanto, um contrato mercantil, baseado na lei societária (art. 168, § 3, da lei no 6.406178), que não se confunde com o contrato de trabalho, já que retrata uma relação meramente mercantil, embora ensejada no curso da relação de emprego, não representando benesse concedida ao empregado pelo trabalho prestado ao empregador, sendo inviável que se reconheça a sua natureza salarial, restando correta a sentença guerreada ". Desse modo, as premissas fáticas constantes no v. acórdão recorrido, que não podem ser objeto de reexame nesta Corte, ante o óbice da súmula nº 126/TST, foram no sentido de que os valores recebidos a título de stock options (rendimentos recebidos a título de investimentos no mercado de ações) não possuem natureza salarial, eis que se trata de um contrato mercantil. Essa decisão está em consonância com a jurisprudência desta Corte, a qual refuta a natureza salarial da parcela " Stock Options " (opção por compra de ações da empresa na qual o reclamante trabalhou) [...] (AIRR-99100-87.2007.5.01.0014, 7a Turma, Ministro Renato de Lacerda Paiva, DEJT 4/3/22).

Além disso, o TST entende que, até mesmo quando o empregador determina contratualmente um ganho mínimo, não há a desnaturação do contrato de stock options, fato que também não altera sua natureza para sendo de remuneração:

[...] II - AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. RECLAMANTE. LEI No 13.467/2017. TRANSCENDÊNCIA ALTERAÇÃO CONTRATUAL LESIVA. CONTRATO DE "STOCK OPTIONS". GANHO MÍNIMO. DIREITO DE COMPRA DAS AÇÕES. [...] Ficou assentado também que " o fato de a ré ter estipulado a cláusula garantindo um ganho mínimo não desnatura o tipo de contrato ("stock options"), muito menos o transmuda para a natureza de remuneração. Com efeito, as ações ofertadas e adquiridas pelo autor continuaram sujeitas ao risco de variação, conforme o mercado, tanto que caíram a níveis inimagináveis no curto período de 5 anos. Na verdade, o ' ganho mínimo garantido' foi estipulado com o objetivo de compensar eventual perda decorrente da aquisição das ações concedidas no contrato ". Assim, concluiu-se que não havia que se falar em alteração contratual lesiva. A decisão do TRT não destoa da jurisprudência desta Corte, segundo a qual não tem natureza salarial a parcela "Stock Options" (opção por compra de ações da empresa na qual o reclamante trabalhou), e não viola os arts. 2o, 4o, 9o, 448, 468, caput , e 843, § 1o, da CLT. Julgados. Agravo de instrumento a que se nega provimento" (EDCiv-ED- AIRR-11499-65.2015.5.01.0013, 6a Turma, Ministra Katia Magalhaes Arruda, DEJT 24/4/23).

Ante o exposto, é possível concluir que o TST possui entendimento consolidado e pacificado acerca da natureza jurídica das stock options, no sentido de que as ações porventura concedidas aos empregados não possuem natureza salarial.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nota-se que a concessão de opção de compra de ações é um instituto importante, essencial para uma cultura corporativa dentro da companhia, utilizada no exterior com frequência em grandes empresas, mas se encaixando perfeitamente no cenário das startups que vem ocorrendo.

Além disso, explorando a complexidade da remuneração flexível, são delineadas distinções entre remuneração fixa e variável. A variável é detalhada em suas formas, como pagamento por resultados, desempenho e participação financeira, incluindo as stock options. A ausência de regulamentação específica para as stock options no contexto trabalhista levanta a questão sobre sua categorização como salário ou valor mercantil. Sob o prisma jurídico, as stock options, em regra, são classificadas como exclusivamente mercantis, influenciando a tributação aplicável.

Por conseguinte, a relação, segundo o CARF, é fundamentalmente mercantil e facultativa, não representando uma contraprestação pelo trabalho, o que evita injustiças e instabilidades jurídicas decorrentes da imprevisibilidade associada ao exercício da opção de compra.

Nesse sentido, ante a análise dos acórdãos do TST proferidos nos últimos cinco anos, foi possível concluir que resta consolidado o entendimento de que as stock options não devem integrar a remuneração do empregado, uma vez que se trata de verba de caráter indenizatório.

Caio Lignani de Miranda Bermudes
Graduando do curso de direito da Faculdade de Direito de Vitória - FDV.

Pedro Mourente
Estudante de Direito da Faculdade de Direito de Vitória (FDV).

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