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A expansão da inteligência artificial e temor internacional exposto declaração de Bletchley

A Declaração de Bletchley, assinada por 27 países, busca promover o desenvolvimento seguro da IA para impulsionar o crescimento econômico inclusivo e a inovação. O documento foi divulgado após o AI Safety Summit 2023, sediado em Bletchley Park, local com significado histórico e ao trabalho de Alan Turing na decodificação de códigos.

3/12/2023

No dia primeiro de novembro de 2023 foi publicada a Declaração de Bletchley, pretendendo mobilizar a comunidade internacional para a necessidade de se promover o desenvolvimento seguro da IA, a fim de que suas oportunidades transformadoras sejam utilizadas para o bem, na promoção do crescimento econômico inclusivo, do desenvolvimento sustentável e da inovação.

O documento foi assinado pelo Reino Unido, União Europeia e mais 27 países, dentre os quais estão Brasil, Estados Unidos, China, Índia, Israel, República da Coreia, Ucrânia. Seus representantes participaram, entre 1 e 2 de novembro de 2023, do AI Safety Summit 2023, sediado em Bletchley Park, na Inglaterra.

A escolha do local para sediar este primeiro AI Safety Summit não foi casual. Em Bletchley Park, localizada entre as cidades de Cambridge e Oxford, foi instalada uma base militar secreta do Reino Unido, durante a Segunda Guerra Mundial. Nela, o matemático Alan Turing desenvolveu a máquina decifradora de códigos alemães, contribuindo para o desfecho da guerra em favor dos aliados.

Desde Turing, atualmente considerado o pai da IA, cientistas trabalham continuamente para aperfeiçoá-la. Contudo, na última década a tecnologia atingiu um elevado nível de sofisticação, gerando apreensão, especialmente em relação às ameaças que representa à segurança, às liberdades e à vida dos cidadãos.

A intenção da Declaração de Bletchley vai além da manutenção das garantias e liberdades fundamentais no mundo globalizado, diante das inovações. Há um firme propósito em impedir ou mitigar os riscos potenciais e inerentes à IA. Os possíveis danos, decorrentes tanto do seu uso indevido como intencional, ainda não são mensuráveis.  

A linguagem do documento reflete uma genuína apreensão e um senso de urgência em unir a comunidade internacional – estados, empresas de tecnologia, a sociedade civil e cientistas - para agir efetiva e rapidamente com o objetivo de garantir a segurança da IA, que já vem sendo desenvolvida e empregada de forma acelerada globalmente.

A preocupação é direcionada especialmente aos sistemas de IA que são excepcionalmente poderosos e potencialmente prejudiciais, para os quais devem ser criadas regras exigindo testes de segurança e o fornecimento de transparência sobre seu funcionamento, a fim de que sejam possíveis avaliações externas capazes de medir, monitorar, mitigar e prevenir seus efeitos negativos.

A Declaração destaca dois eixos de atuação mais prioritários. Primeiramente, propõe-se a identificação dos riscos de segurança da IA e a compreensão do real impacto desta tecnologia em nossas sociedades. Neste intento, pretende-se engajamento dos envolvidos na construção de um entendimento científico e baseado em evidências sobre os referidos riscos. A segunda pauta da agenda é a construção de políticas nacionais, sejam por leis ou outras medidas, que possam garantir a proteção diante dos perigos observados.

Apesar de já existirem muitos projetos em andamento, a maior parte dos países ainda não logrou aprovar uma legislação abrangente e conclusiva neste sentido. Em junho de 2023, a UE apresentou o texto de sua norma reguladora da IA e, na última semana de outubro, o presidente dos Estados Unidos assinou uma “Executive Order”, medida que se assemelha a um decreto, para mobilizar o governo no enfrentamento dos riscos envolvidos na IA.

O Brasil tampouco conseguiu aprovar uma legislação própria. Atualmente, tramita no Senado Federal o PL 2338/23, que dispõe sobre o uso da IA. Porém, não há qualquer estimativa para sua conclusão, que ainda depende de aprovação nas duas casas legislativas, além da sanção presidencial.

É realmente muito importante que sejam tomadas medidas para conter o potencial prejudicial da Inteligência Artificial e que os estados se mobilizem neste sentido. Contudo, os desafios ultrapassam a mera elaboração de estudos e de leis. Investimentos financeiros são cruciais, assim como esforços direcionados ao aprimoramento da segurança digital e da Inteligência de Estado.

Considerando que a IA nasceu como ferramenta militar, é fato que não deixará de ser empregada com tal propósito, especialmente no presente momento em que tensões internacionais se amplificaram. Sistemas de IA foram observados na Guerra da Ucrânia e no conflito no Oriente Médio, em drones multifuncionais, capazes de identificar alvos, reconhecer inimigos e disparar de forma autônoma. E sabe-se que suas aplicações podem ir além, abrangendo a vigilância de moradores das regiões de conflitos e o desenvolvimento de novas armas químicas, ainda mais letais.

Confrontamos, assim, o paradoxo de uma tecnologia disruptiva que apresenta uma dualidade em seu uso – para o bem e para o mal. A Declaração de Bletchley é um chamado é para uma ação coletiva e reflexão sobre como podemos guiar o desenvolvimento da IA para um futuro que priorize a segurança, a prosperidade e o bem-estar coletivo.

Gisele Machado Figueiredo Boselli
Graduada em Direito da PUC Campinas. Especialista em Direito da Economia e da Empresa pela FGV. Especialista em Direto Médico e da Saúde pela PUC-PR.

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